A Tesselo, uma startup que combina a utilização de imagens de satélite e Inteligência Artificial (IA) para fornecer informações em tempo real sobre seteores como a agricultura, a floresta e as infraestruturas — e, assim, combater desafios ambientais –, iniciou esta quinta-feira atividade em Portugal. A empresa, fundada em 2017, está sediada em Lisboa, onde terá a sua equipa técnica, incluindo engenheiros ambientais, agrónomos e especialistas da indústria.
“Somos três fundadores que decidiram criar um projeto para ajudar as organizações a gerir os recursos do solo e a tornar o planeta mais sustentável. Para isso, focamo-nos na inteligência espacial”, explicou ao Observador o presidente da Tesselo e ex-presidente de La French Tech Lisbon. Rémi Charpentier juntou-se a Daniel Wiesmann (o chefe de tecnologia) e a Michael Flaxman (responsável de ciência) quando percebeu que “era necessário fazer algo que ajudasse as organizações a serem mais sustentáveis”.
Mas, como funciona o trabalho desta empresa? O processo parece simples, mas exigiu dois anos de pesquisa intensa: a Tesselo utiliza as imagens satélite captadas no Programa Europeu Copernicus, através do Sentinel-2, e absorve, limpa, processa e aumenta essas fotografias através de Inteligência Artificial, criando imagens compostas e adaptadas ao que cada empresa ou negócio necessitam. Na área florestal, por exemplo, o serviço da Tesselo oferece um mapeamento em quase tempo real, onde é possível classificar espécies de árvores, medir e prever o crescimento das florestas, monitorizar plantações, detetar pragas e estimar o risco de incêndios florestais e outros desastres ambientais.
É precisamente nesta última problemática, a dos incêndios, que a Tesselo pode dedicar uma maior atenção em Portugal, um território que no verão sofre sempre com os incêndios florestais. A prova disso está nos números: em 2017, segundo o Sistema Europeu de Informações sobre Incêndios Florestais (EFFIS) da Comissão Europeia, citado em comunicado pela Tesselo, foram destruídos 563.000 hectares de floresta devido a 16.981 incêndios. Nesse mesmo ano ocorreu o incêndio de Pedrógão Grande, que provocou mais de 60 vítimas mortais.
[A imagem abaixo produzida pela Tesselo mostra o território português antes e o depois dos incêndios de Pedrógão Grande]
“A tecnologia da Tesselo pode estimar o risco e o impacto dos fogos florestais, monitorizando áreas de limpeza em torno de infraestruturas e postes de alta tensão, para mapear o risco e assegurar que os regulamentos ambientais são aplicados”, explica a empresa em comunicado. Rémi Charpentier acrescenta ao Observador que o objetivo passa muito pela prevenção, uma vez que, neste caso, há um maior controlo e monitorização sobre a vegetação que pode estar a crescer demasiado perto das linhas de alta tensão.
A distância mínima entre a infraestrutura elétrica e a vegetação é de 50 metros, o que muitas vezes não é respeitado. Queremos assegurar que isto é cumprido através de uma monitorização contínua e, assim, garantir que o risco de incêndio por falhas nas infraestruturas é reduzido”, explicou ainda Rémi Charpentier.
Mas não é só na área florestal e nas infraestruturas que a empresa pode atuar. No caso dos seguros e certificação, explica Rémi, a tecnologia da Tesselo também permite, por exemplo, estimar os efeitos no solo depois de um desastre para perceber qual a resposta mais adequada. Há também o trabalho de assegurar que os regulamentos ambientais de determinada área estão a ser cumpridos. Exemplo disso é um projeto que a empresa tem no Brasil com o objetivo de combater a desflorestação ilegal. Como? “Identificando os movimentos e alterações dos espaços e ajudando a detetar e rastrear quem está a ir contra as regras”, acrescenta o presidente da empresa.
Ao longo dos dois anos de pesquisa, a Tesselo contou com três bolsas da Agência Espacial Europeia e uma parceria de longo prazo com o Instituto Pedro Nunes, em Coimbra. Apesar de entrar em funcionamento agora, a empresa já conta com clientes em Portugal, como a Celpa – Associação da Indústria Papeleira, e também em mercados como a Alemanha, França, África, Sul da América e Índia.
“O grande desafio foi trabalhar com algo tão novo”
Rémi Charpentier é francês e chegou a Portugal em 2013. Procurava “um bom espaço para viver” e “com boa qualidade de vida”. Acabou por encontrar mais do que isso: um ambiente empreendedor e um país que “tem todas as condições para se construir uma startup, imensos recursos disponíveis e vários talentos”. Mais tarde, num outro trabalho, conheceu Daniel Wiesmann, que por sua vez já conhecia o outro fundador da Tesselo, Michael. Agora vivem em Portugal e têm “uma empresa que é portuguesa”.
O grande desafio ao longo de dois anos de pesquisa, conta Rémi, foi o facto de a startup estar a “trabalhar com algo tão novo” como a Inteligência Artificial. “Demoramos dois anos para chegarmos ao ponto onde queremos estar. Antes conseguíamos fazer um mapeamento simples de uma área pequena. Agora conseguimos fazer um mapeamento mais complexo de uma área muito vasta”, sublinhou o presidente da startup.
A nossa tecnologia permite monitorizar as mudanças de uma forma muito pormenorizada, permitindo integrar temporadas e ciclos de vida das plantas nos nossos modelos de vegetação. É estratégico para a Tesselo estar sediada em Portugal, um dos centros tecnológicos que mais rápido cresce na Europa e um país onde a nossa tecnologia tem um impacto imediato”, referiu ainda Rémi Charpentier, citado em comunicado.
Além da sede tecnológica da empresa em Lisboa, a Tesselo vai ter a sua força comercial nos Estados Unidos e também em França, estando a planear contratar mais duas pessoas até ao final deste ano e mais cinco no próximo ano. “Acreditamos que Portugal tem uma boa escala para experimentarmos esta área e é um ótimo contributo para desenvolver a nossa tecnologia, uma vez que tem um ecossistema muito rico”, terminou o presidente da Tesselo.