Portugal ainda tem “algum atraso” na forma como trata a igualdade de género, defendeu esta segunda-feira o ministro do Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, em comparação com outras sociedades, que já introduziram um conceito de género mais alargado.
É um tema a que temos que estar muito atentos e temos que garantir uma discussão muito profunda. […] também na questão crítica de que géneros é que estamos a falar. É um tema que está muito atrasado no debate em Portugal e por isso o apelo que fiz aqui, para que o trabalho próprio de investigação se faça nos termos em que outras sociedades já estão a falar”, disse o ministro Manuel Heitor à Lusa.
Manuel Heitor falava na sessão de abertura do ‘SAGE Day – Igualdade de Género no Ensino Superior’, que decorreu no ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa onde foi apresentado um estudo que dá conta da baixa presença das mulheres em lugares de liderança nas universidades e politécnicos portugueses.
Numa intervenção na sessão de abertura, Manuel Heitor também mencionou que em alguns países a questão do género já tem uma abordagem bastante alargada, o que deixa Portugal atrasado face a outros exemplos onde já se “abriram outras fronteiras”.
Na passagem dos resultados da investigação à sua concretização em ação, o ministro referiu a “questão crítica”, sobretudo no ensino superior, da dualidade entre mérito e igualdade de género, argumentando que a defesa do mérito não pode levar a esquecer a paridade.
Pedro Dominguinhos, presidente do politécnico de Setúbal e do conselho coordenador destes institutos, também presente na sessão de abertura, referiu que entre os politécnicos apenas um tem um corpo diretivo exclusivamente masculino, mas defendeu que é preciso promover a igualdade e considerar para discussão medidas como quotas, até porque a desigualdade tem reflexos nas carreiras e nos salários.
Para Manuel Heitor a questão da igualdade no ensino superior “é mais complexa, porque é, sobretudo, confundida com uma diversificação disciplinar”.
Temos áreas disciplinares, não só em Portugal, particularmente dominadas por mulheres – a área da farmácia é uma – e depois temos outras áreas disciplinares onde só temos homens, nomeadamente na área do digital. Por isso o assunto é bastante mais complexo, porque parte de estigmas criados desde a infância, sobre para onde é que as mulheres e homens vão. Por isso é que é importante haver trabalho de investigação, mas que tenha impacto na ação”, disse Heitor.
Apenas 13% das instituições de ensino superior em Portugal são lideradas por mulheres, que continuam a enfrentar barreiras no acesso aos cargos de maior prestígio das universidades e politécnicos, revela um estudo divulgado na semana passada.
Há já alguns anos que as mulheres representam a maioria dos doutorados, mas depois continuam a ter grandes dificuldades em aceder aos cargos de maior prestígio, segundo o estudo que analisou o universo de professores que trabalha nas universidades e institutos politécnicos. A identificação das disparidades foi feita pelo projeto europeu SAGE – Systemic Action for Gender, financiado pelo programa Horizonte 2020, que contou com a participação do ISCTE.
O estudo põe a descoberto os obstáculos à ascensão na carreira académica e a dificuldade em serem nomeadas ou eleitas para cargos de liderança na academia. Em Portugal apenas 13% das mulheres foram escolhidas para reitoras ou presidentes de um instituto politécnico.
Nas 15 universidades que integram o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) e nas 15 instituições do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP), são quase sempre os homens quem decide. As exceções são o ISCTE-IUL, a Universidade de Évora, a Universidade Católica e o Instituto Politécnico do Cávado e Ave.
Estas diferenças não encontram reflexo no número de docentes do ensino superior, que é quase paritário entre ambos os sexos: 45% são mulheres e 55% são homens, segundo dados de 2017. Apesar de o número de docentes no ensino superior português ser quase igual entre ambos os sexos, apenas um em cada quatro professores catedráticos é do sexo feminino. A prevalência dos homens também é marcante na categoria de professores associados, já que apenas um em cada três é mulher.
As desigualdades não são um problema exclusivo de Portugal. Em toda a Europa há mais mulheres doutoradas do que homens e eles continuam a ocupar a maioria dos lugares de maior estatuto académico.
Depois de identificadas as desigualdades de género nas instituições de ensino superior, o ISCTE elaborou uma Carta de Princípios para a Igualdade no Ensino Superior, que cobre aspetos que estão ligados às políticas de igualdade no acesso a lugares de decisão.
As oportunidades de progressão e os valores salariais, assim como o défice de conhecimento das desigualdades de género que o ensino superior tende a reproduzir são outros dos pontos focados na Carta de Princípios.