A Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC) diz que não se opõe à compra da Media Capital, detentora da TVI, pela Cofina. Num comunicado publicado esta sexta-feira na página do organismo, pode ler-se que “o Conselho Regulador da ERC deliberou não se opor à operação de concentração da Cofina e Media Capital, sem prejuízo das ressalvas enunciadas na respetiva deliberação”.

Segundo o comunicado, a ERC afirma não ter encontrado sinais de que este negócio “coloque em causa os valores do pluralismo e da diversidade de opiniões” — algo que, como recorda a própria organização, cabe à entidade reguladora acautelar. Isso mesmo já foi transmitido à Autoridade da Concorrência, confirma a ERC na publicação feita esta sexta-feira.

Mas há contrapartidas, pode ler-se na deliberação publicada na página da ERC. A CMTV e a TVI têm de se manter independentes: “Notando também os compromissos assumidos pela adquirente no presente procedimento em termos de preservação da autonomia e identidade editorial dos diversos órgãos de comunicação social que passam a integrar o universo do grupo, que terão de ser escrupulosamente mantidas no âmbito das respetivas atividades”, diz o documento, sugerindo que essa promessa foi preponderante no parecer do regulador. Não pode haver “junção de linhas editoriais”

A avaliação da Autoridade da Concorrência é importante para delinear o futuro do negócio. É ela quem terá de analisar os vários problemas que podem surgir na sequência da compra, uma vez que implica a junção de grupos detentores de canais de televisão concorrentes — um é dono da TVI, outro da CMTV.

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Pedro Marques Bom, ex-diretor-geral de investigação da Autoridade da Concorrência e atualmente sócio coordenador da área de Direito Europeu e da Concorrência na firma de advogados Cuatrecasas, explicou que a autoridade tem de “antecipar o efeito no mercado da compra de B por A”: “No caso de haver dúvidas sobre se a operação é má para os consumidores, as Autoridades da Concorrência não podem assumir o risco. A lei diz que se a operação for suscetível de levar a entraves, como o aumento do custo para o consumidor ou a redução da quantidade e qualidade dos serviços em causa, a AdC deve opôr-se ao negócio. Porque, depois de estar concluída a operação, não há nada a fazer caso se verifiquem os problemas”, afirmou.

O parecer da ERC surge dois dias depois de a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) ter avançado com um pedido de nomeação de auditor independente para fixar a contrapartida mínima na Oferta Pública de Aquisição (OPA) da Cofina sobre a Media Capital. A decisão do regulador dos mercados resulta do facto de a Cofina ter apresentado à CMVM um requerimento sobre a declaração de derrogação do dever de lançamento de uma OPA subsequente.

Em agosto, a Cofina confirmou em comunicado oficial que estava a negociar com a empresa espanhola Prisa uma “possível oferta formal pela Media Capital”. Entretanto, a CMVM suspendeu a negociação das ações de ambas as empresas. “O Conselho de Administração da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, deliberou […] a suspensão da negociação das ações da Cofina — SGPS, SA e das ações do Grupo Media Capital, SGPS, SA, aguardando a divulgação de informação relevante ao mercado”, lê-se num comunicado publicado na página da internet da CMVM.

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Negócio levanta “sério risco de diminuir o pluralismo”, vota conselheiro da ERC

O membro do Conselho Regulador da ERC Mário Mesquita votou contra a não oposição do órgão à compra da Media Capital pela Cofina, por considerar que a operação “comporta um sério risco de diminuir o pluralismo”.

“Votei contra a deliberação do Conselho Regulador da ERC de não se opor à operação de concentração que se traduz na aquisição pela Cofina do grupo Media Capital SGPS”, refere Mário Mesquita na sua declaração de voto, disponibilizada no ‘site’ do regulador.

“Em meu entender, a operação da Cofina comporta um sério risco de diminuir o pluralismo jornalístico e a diversidade de opiniões nos media em Portugal”, explica Mário Mesquita, que salienta que “a análise da programação da TVI e, especialmente, da CMTV nos relatórios de avaliação da ERC (citem-se, por todos, os de 2018) mostram à evidência o risco de aumentar a uniformidade na programação e na informação, com prejuízo para o pluralismo e diversidade na paisagem mediática portuguesa”.

“Estas são as principais motivações do meu voto, embora sem negligenciar as possíveis, embora não necessárias, consequências negativas no que se refere à estabilidade e à autonomia da profissão de jornalista, condições essenciais para assegurar o pluralismo, a diversidade e o rigor informativo no conteúdo dos media”, prossegue o membro do Conselho Regulador.

A concentração “numa única empresa de um dos mais seguidos serviços de programas de televisão generalistas existentes em Portugal, de um poderoso grupo de rádio (o segundo mais ouvido no nosso país), do jornal diário com maior difusão nacional e alguns dos ‘sites’ de media mais participados e os riscos inerentes ao desenvolvimento deste grupo de comunicação mediática são motivos mais do que suficientes para que a ERC se recuse a dar o seu aval a esta operação”, concluiu Mário Mesquita na sua declaração de voto.