Os venezuelanos já não estranham: um mês antes do início do Advento, já é Natal. Desde 2013, ano em que Nicolás Maduro substituiu Hugo Chávez na presidência do país, que as festas se prolongam durante mais de dois meses, entre 1 de novembro e 6 de janeiro. Na primeira vez que aconteceu, oito meses depois da morte do ex-presidente, a antecipação do Natal foi acompanhada da criação do Vice Ministério da Suprema Felicidade e do pagamento adiantado dos subsídios de Natal.

Na altura, a imprensa relacionou o anúncio do Natal precoce com as eleições municipais agendadas para a primeira semana de dezembro desse ano, com o site argentino Infobae a ir até um pouco mais longe: “Com estas medidas, o Governo quer impedir que o crescente descontentamento popular gerado pela profunda crise económica que atravessa o país e a indignação que os constantes tropeções do presidente apareçam nas urnas”.

Maduro, que em 2013 deu início às festividades num parque temático de Caracas, rodeado de crianças, garantiu que a antecipação não era mais que um desejo de felicidade nacional — “Hoje sexta-feira, 1 de novembro, quisemos decretar a chegada do Natal porque queremos a felicidade para todo o povo, a paz, a paz e a felicidade para todas, o Natal mais cedo é a melhor vacina para quem queira inventar”. O que é facto é que o partido no poder ganhou em 196 municípios, contra a oposição, que só conseguiu o feito em 53. Desde então, passou a ser “normal” no país dar início às festas logo no Dia de Todos os Santos.

Este ano, para não quebrar a tradição, na quinta-feira à noite Nicolás Maduro e a mulher, Cilia Flores, lá se juntaram no luxuoso Hotel Humboldt, com vista para a colina do Parque Nacional El Ávila, onde desde 1982 se alumia no início da época natalícia a enorme Cruz de Ávila, de 35 por 18 metros, para abrir as festividades.

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Mais uma vez — e não obstante a hiper-inflação que o país regista desde há 24 meses; a fome comum a pelo menos 87% das famílias, que vivem abaixo do limiar da pobreza; e do êxodo que poderá brevemente chegar aos 5 milhões de deslocados — a felicidade veio à baila. “Nada nem ninguém nos vai tirar a felicidade e a paz do povo (…) Serão dois meses de alegria para as crianças. Em 2020 vamos florescer, e não é por eu me chamar Cilia Flores, é porque temos um povo e um Presidente fortes”, disse Cila Flores. “Serão dois meses de festa, de bailes, de canções de Natal e de uma profunda espiritualidade. Viva a Alegria e a União da Venezuela!”, acrescentou Maduro no Twitter.

https://twitter.com/NicolasMaduro/status/1190652891788390400

Este ano, para além do pagamento antecipado dos subsídios de Natal, o presidente anunciou ainda a compra de 13 mil toneladas e meia de pernil de porco, no valor de quase 12 milhões de euros, que deverá ser vendido a preços solidários. Em 2017, a Venezuela acusou Portugal de lhe ter “sabotado” o Natal, exatamente por não ter entregue a iguaria a tempo — veio a saber-se depois, parte das encomendas não seguiram para o outro lado do Atlântico por falta de pagamento.