A ideia de ver objetos mais ou menos estranhos, mais ou menos comuns, mais ou menos fora da caixa a valerem milhares ou milhões em leilões não é uma coisa propriamente nova. Há poucas semanas, o casaco de malha que Kurt Cobain utilizou no programa “MTV Unplugged”, um dos concertos mais populares dos Nirvana, foi vendido por mais de 300 mil euros: um casaco usado, com mais de 25 anos, que não é de marca nem de nenhum designer específico. Vale milhares pelo que significa. E, mais do que isso, pela personalidade que representa.
Tal como acontece com todos os tipos de arte — pintura, música, cinema, escultura, por aí além –, também o desporto é um campo onde a valorização de artigos aparentemente inúteis ou ultrapassados prolifera. Desde camisolas, bolas, cachecóis: tudo serve para engrossar e abrilhantar as coleções dos mais aficionados. Esta semana, um novo item mais ou menos estranho, mais ou menos comum, mais ou menos fora da caixa entrou para esta lista.
No início de setembro do ano passado, Naomi Osaka venceu Serena Williams na final do US Open, tornando-se a primeira tenista japonesa da história a ganhar um Grand Slam. Esta manchete, porém, foi a menos utilizada. A importante vitória de Osaka acabou por ser ofuscada pela autêntica novela que se desenrolou ao longo da final: Serena Williams, ídolo de infância da japonesa, envolveu-se em consecutivas discussões com o árbitro português Carlos Ramos, que a acusou de receber instruções do treinador (algo que não é permitido pelos regulamentos). A tenista norte-americana foi penalizada, disse que o árbitro era “um mentiroso e um ladrão”, perdeu o controlo no court e além dos gritos e das lágrimas acabou por partir uma raquete que atirou furiosamente para o chão. O caso abriu espaço a uma larga e prolongada discussão sobre sexismo, racismo e feminismo — e o mundo do desporto dividiu-se entre os que estavam do lado do Serena e os que não estavam do lado de Serena.
Mais de um ano depois e já com um nova campeã do US Open — a canadiana Bianca Andreescu sucedeu a Naomi Osaka, também vencendo Serena –, a raquete que a norte-americana partiu depois de discutir com Carlos Ramos vai a leilão e pode, segundo os mais entendidos, chegar aos 50 mil dólares (algo como 45 mil euros). De acordo com o The New York Times, o lance inicial está ligeiramente abaixo dos 2 mil euros mas é expectável que o valor suba “até aos 25 ou 50 mil euros”. Leiloada pela Goldin Auctions, a raquete da marca Wilson Blade chegou à posse do vendedor através de um dos apanha-bolas presente no jogo da final do US Open do ano passado.
Justin Arrington-Holmes, o rapaz em questão, ficou com a raquete partida com o aval de Serena Williams, que no fim da partida lhe disse que poderia levar o objeto para casa. O jovem de 21 anos revelou ao The New York Times que guardou a raquete no roupeiro, depois de a exibir à família e aos amigos, mas que alguns meses após o jogo precisou de algum dinheiro e decidiu vendê-la. Fê-lo à Brigandi Coins and Collectibles, uma loja em Manhattan, por “apenas” 630 euros, assinando também um certificado de autenticidade. Só há poucas semanas, quando contactado pelo jornal norte-americano a propósito do leilão, é que percebeu que perdeu milhares ao vender a raquete por impulso. “Ao olhar para trás, tenho pena de que ninguém me tenha ajudado no processo. Não estava familiarizado com nada disto. Só queria livrar-me daquilo”, explicou Arrington-Holmes.
Mais de um ano depois da histórica final do US Open que coroou Naomi Osaka, viu Serena Williams gritar com Carlos Ramos e o mundo entrar numa discussão sobre sexismo e racismo, uma raquete totalmente destruída vai valer milhares de euros. E o único que parece estar chateado com isso é mesmo um apanha-bolas de 21 anos.
Quem defendeu e quem criticou Serena Williams após a polémica no US Open