Quando o tema é regionalização é preciso ter memória. É mais ou menos esta a conclusão de Luís Marques Mendes, no seu habitual comentário de domingo comentador da SIC, sobre o assunto. É que, lembra, o que o agora primeiro-ministro anunciou no Congresso dos Municípios já existiu nos tempos do Governo social democrata de Durão Barroso, e foi precisamente António Costa, que, com a pasta da Administração Interna do Governo de Sócrates, acabou com o regime.

Depois deste sábado o primeiro-ministro ter revelado que a eleição das Comissões de Coordenação Desenvolvimento Regional (CCDR) avança no início de 2020, “para criar no país a confiança necessária para os passos seguintes”, nomeadamente a eleição direta das Áreas Metropolitanas e a Regionalização, Marques Mendes lembra que esta possibilidade já existia num regime criado em 2003 por Durão Barroso — e que veio a ser revogado dois anos depois por Costa.

Na altura Costa argumentava que um serviço desconcentrado do Estado não fosse a designação dos seus presidentes do Governo central.

“O mesmo António Costa primeiro-ministro que agora quer dar poder às autarquias para escolherem os presidentes destas comissões, foi o mesmo ministro da Administração Interna que em 2005 ajudou a tirar este poder às autarquias (…). Ou seja António Costa primeiro-ministro hoje tem uma versão, António Costa, ministro da Administração Interna tem outra”, disse.

Depois, lembrou Marques Mendes, veio Marcelo Rebelo de Sousa tentar travar o avanço, até porque a regionalização foi referendada e chumbada em 1998. “E tem razão”, defende. Apesar de o próprio Marques Mendes ter também sido ministro dos Assuntos Parlamentares do governo de Barroso, do seu ponto de vista ressuscitar agora a regionalização iria dividir ainda mais o país — numa altura em que precisa de coesão “e não de mais e divisões”. Mais, regionalizar agora “seria um exercício de hipocrisia política”. “Então ainda não completaram a descentralização e já querem fazer a regionalização?”. Isso seria uma oportunidade de ouro para “os populistas” ganharem terreno com duas acusações que até surgiram logo no imediato: mais despesa para o Estado, e o Estado a criar mais cargos políticos. “Isto é politicamente fatal!”, avisa.

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Por outro lado, conclui, o facto de esta discussão ter surgido no seio dos próprios autarcas também não é positivo. “Têm que ter cuidado!”, diz em jeito de conselho. Porque passa a ideia que eles querem regionalizar porque como têm limitação de mandatos nas autarquias “querem ter outros lugares”.

Orçamento discutido na praça pública

Quanto ao Orçamento do Estado, o comentador político refere uma novidade: “está a ser feito na praça pública”, lembrando que dois dirigentes do PS, Carlos César e Ana Catarina Mendes, “pressionaram” em público Mário Centeno para o Ministro das Finanças dar mais dinheiro à saúde, através do Público, o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, “pressionava” o ministro das Finanças para este dar mais dinheiro às Forças de Segurança. A resposta de Centeno viria este sábado via Expresso: não ia ceder no excedente orçamental.

“Nunca se tinha visto disto no passado. Mas é má novidade: isto demonstra que há mal-estar dentro do Governo, perda de coesão entre os ministros, primeiro-ministro e ministro das Finanças em rota de colisão”, considera. Um cenário que acha ser negativo para ambas as partes: Centeno, que está de saída, é um “ministro a prazo”, logo é sempre um ministro respeitado”; e a atitude de António Costa representa “perda do poder e autoridade”. Isto porque se ministros recorrem à imprensa para mandarem recados uns aos outros, significa que já não acreditam no seu poder arbitral, defende.

Joacine e Livre: “deplorável”

Ainda mais crítico foi em relação à deputada eleita pelo Livre, Joacine Katar Moreira, a ser referida, ou comentada, pela terceira semana consecutiva. Marques Mendes diz que tem sido só “vedetismo, show off e, até, falta de cultura democráticas”. E vai mais longe: “é o novo riquismo  aplicado à política”, explicando de seguida o conceito. Um novo rico “é uma pessoa deslumbrada, convencida, exibicionista,  sempre a dar nas vistas, com um ego do tamanho do mundo”. “É isso que tem sido esta deputada Joacine”.

Não menos “deplorável”, nas suas palavras, em sido o próprio partido pelo qual foi eleita, o Livre. O partido, acusa, “escolheu o mediatismo”. Mas se fez esta opção “não pode agora queixar-se” e exigir  uma deputada “discreta, sóbria, alinhada”. “Não é possível ter sol na eira e chuva no nabal ao mesmo tempo”, conclui.

Já quanto ao processo disciplinar que o partido ameaçou interpor contra a deputada, Marques Mendes lembra também que a falha da deputada foi política. E essas falhas não se resolvem com processos disciplinares.

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Médicos vão embora e saúde é das mais caras

Marques Mendes aproveitou também para falar na questão da emigração dos médicos, que este ano de 2019 pode “bater um record“, com os números a fecharem com 400 profissionais fora, como concluiu o Expresso. Sobre a crise na saúde lembrou o estudo da OCDE com um Observatório Europeu que esta semana foi publicado e que revela que o Estado português é o que menos investe na saúde em relação aos outros países da Europa.

O comentador político até enaltece as medidas anunciadas pelo Governo de combater a suborçamentação na Saúde, “mas atirar dinheiro para cima dos problemas não é solução”, diz. Porque a crise no Sistema Nacional de Saúde não se esgota assim, há problemas mais estruturais de gestão de motivação, por exemplo, que têm de ser resolvidos, alerta.

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