Na moção estratégica, Rui Rio privilegiou a política em vez dos conteúdos programáticos, pois esses já estavam no programa eleitoral. A maior parte das 32 páginas da moção de estratégia global do atual líder são a criticar o Governo socialista, que diz estar preparado para substituir “a partir de 2021” (a legislatura termina, em condições normais, em 2023). Embora não entre em “adivinhação”, o atual líder sugere que se o Governo cair antes do fim da legislatura, o PSD “terá condições reforçadas para governar” já no próximo ano. Quanto às autárquicas — depois dos seus apoiantes criticarem a ambição de Montenegro e Pinto Luz — Rui Rio assume que quer um “resultado vitorioso” no poder local. Sobre as eleições presidenciais, nem uma palavra. “É de propósito”, disse aos jornalistas em Macedo de Cavaleiros.

Enquanto Luís Montenegro garantiu um apoio “incondicional” a Marcelo Rebelo de Sousa e Miguel Pinto Luz considerou esse apoio “natural”, mas dependente de um “pressuposto”, Rui Rio opta por não se referir ao assunto, embora o mandato a que se propõe vá até fevereiro de 2022, com as presidenciais de 2021 pelo meio.

Autárquicas são para ganhar

Outra das eleições que se atravessam pelo caminho do próximo mandato de dois anos do próximo líder do PSD são as autárquicas. Para atingir o tal “resultado vitorioso” a que porpõe na moção, Rui Rio anuncia o apoio à recandidatura de todos os atuais presidentes de câmara e a criação de uma “Comissão Autárquica“. E se Luís Montenegro se propõe a ser o coordenador autárquico, Rio deixa claro que — se for ele o presidente — esse papel será assumido pelo secretário-geral (que à partida continuará a ser José Silvano).

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Além das recandidaturas, Rio quer “concentrar recursos” nos “concelhos e freguesias onde o PSD já liderou ou naqueles cujos resultados ficaram muito próximos dos partidos vencedores“. Para o conseguir, o candidato defende que o “PSD deverá estabelecer compromissos eleitorais com outras forças políticas, movimentos e grupos de cidadãos independentes, que se mostrem disponíveis e convergentes sobre as linhas programáticas e as propostas a apresentar ao eleitorado”. Nesse caso, o partido deve “liderar” quando for “maioritário” e “colaborar onde tal não acontece.”

Rio diz ter “condições reforçadas” para governar já no próximo ano

Rui Rio fecha a moção com um último ponto que é “preparar a alternativa para governar Portugal”. Rui Rio diz que se o PSD conseguir cumprir as “linhas estratégicas” que define ao longo do documento (provar que é uma verdadeira alternativa ao PS, assumir-se como partido reformista e recuperar eleitores onde os perdeu) pode “assumir que a partir de 2021 o PSD estará em condições reforçadas para Governar Portugal“.

Para depois não ser acusado de estar a prever uma queda do Governo dois anos antes da legislatura terminar, pode ler-se na moção: “Não valerá a pena entrarmos em exercícios de adivinhação ou em delírios prospetivos quanto ao cumprimento da legislatura do atual Governo”. Para Rio “é mais importante melhorarmos as nossas propostas e afirmarmo-nos como verdadeira alternativa aos olhos dos portugueses.”

As explicações para a ausência de Marcelo

Em declarações aos jornalistas em Macedo de Cavaleiro, Rui Rio fez questão de dizer que a ausência temática das presidenciais no texto da sua moção foi “de propósito.” Porquê? “Porque nas eleições presidenciais não são os partidos que indicam candidatos, são os candidatos que se propõem e depois os partidos apoiam ou não apoiam”, afirmou em declarações citadas pela Agência Lusa.

Sobre Marcelo Rebelo de Sousa, o líder do PSD disse que “aquilo que está mais em cima da mesa, naturalmente, é a recandidatura ou não do professor Marcelo Rebelo de Sousa”. Mas como o próprio Presidente só clarificará mais tarde a sua posição sobre uma possível recandidatura, Rio diz que vai respeitar essa posição.

“Do ponto de vista tático, se um partido começa a apoiar um candidato por antecipação, se depois por acaso esse candidato não se candidata, depois a nossa escolha é sempre uma segunda escolha”, assinalou o líder do PSD.

Oposição a partir do Parlamento. Rio pede “lealdade” aos deputados

Acusado muitas vezes de desprezar o grupo parlamentar anterior — que lhe era maioritariamente hostil ou, pelo menos, crítico — Rui Rio quer agora “valorizar o grupo parlamentar como principal frente de oposição ao Governo“. A moção diz que “o PSD terá de falar a uma só voz, ser coerente com as opções que defende, inovador nas soluções que apresenta e responsável na forma como faz oposição”.

Antes de ser acusado de defender o unanimismo, Rio acrescenta na moção que não quer “um grupo monolítico”, mas logo acrescenta — numa altura em que vários dos que escolheu para as listas estão com os adversários — espera “de cada deputado a lealdade e empenho para um esforço de convergência em torno das opções políticas e estratégicas que vierem a ser aprovadas no próximo Congresso do PSD”.

Críticas duras ao PS: governou para eleições

A maior parte da moção é um ataque ao governo socialista, que acusa de conduzir “ao lento definhar das instituições, à perda de qualidade de vida e do bem-estar dos portugueses, à estagnação da economia e à perda da nossa competitividade externa, ao descalabro dos serviços públicos e à falência do Serviço Nacional de Saúde”, entre várias outras acusações. Isto para provar que “não há alternativa ao atual Governo de maioria de esquerda que não passe pelo PSD“.

O Governo de António Costa, recorda a moção de Rui Rio impôs “a maior carga fiscal jamais registada na história das finanças públicas portuguesas”, o “mais reduzido nível de investimento público, inferior mesmo ao registado no período de maior austeridade” e permitiu a “degradação dos serviços públicos” (com particular ênfase no Serviço Nacional de Saúde) e a “depreciação das funções de soberania” (aqui numa alusão a Tancos).

O Governo, continuou Rui Rio, prefere sempre “inventar mais um paliativo que remedeia, mas não resolve” os problemas. Para o líder do PSD e recandidato à liderança, o Governo só conseguiu terminar a legislatura “sem percalços de maior” pelo “apoio efetivo dos partidos de esquerda” e pela “inegável conjuntura favorável em termos europeus e internacionais”. Ainda assim, segundo denuncia a moção de Rio, com resultados escassos: “O investimento em percentagem do PIB aumentou não mais de 2 pontos percentuais e mantém-se aquém dos níveis anteriores à recessão”.

Acusou ainda António Costa de governar para os votos. “Perante o quadro criado, o Governo adotou uma política de eleitoralismo distributivo, privilegiando estratos e grupos que lhe pudessem ser mais favoráveis à sua manutenção no poder, ao confronto eleitoral e que pudessem alavancar uma ambicionada maioria absoluta”, denunciou Rui Rio.

Mais críticas. Governo criou “poderosa central de informação” para marcar agenda 

Fazendo lembrar as críticas do PSD ao então governo de José Sócrates, a moção de Rui Rio diz que “durante os quatro anos da legislatura o Governo do Partido Socialista construiu uma poderosa central de informação que lhe permite marcar as agendas dos órgãos de comunicação social”.

Rui Rio diz que o governo de Costa conseguiu com que essa central controlar “com intervenções planeadas ao pormenor todos os canais de informação, condicionar e estancar a informação que não lhe é favorável e montar autênticas operações de dramatização mediática cujo aparato ultrapassa tudo o que alguma vez foi observado na história da democracia portuguesa”. Para Rio, “oo que se passou com a chamada crise dos professores e com a greve dos camionistas em maio e agosto de 2019, em plena fase pré-eleitoral, é bem revelador desse poder de ocupação e controlo da agenda mediática, bem como de condicionamento da opinião pública”.

Rio ataca o governo das “parentelas”

Rui Rio não esquece o “familygate” e diz na moção que “Governo e o Partido Socialista comportam-se como se fossem donos do Estado, distribuindo cargos e empregos por clientelas e parentelas, protegendo poderes corporativos e tendo sempre à sua volta os que direta ou indiretamente vivem dos favores e facilidades desse mesmo Estado”.

Lembrou, a esse propósito, “o episódio de chantagem desencadeado com a chamada ‘crise dos professores’, em que o primeiro-ministro, em período pré-eleitoral, coloca o cenário da demissão sem que nada o previsse e justificasse, o PS apenas retirou o benefício de travar a contestação que o “familygate” estava a provocar“.

O presidente do PSD congratula-se com o facto do PS do PS ficar distante da maioria absoluta que, mesmo sem o assumir publicamente, desejava: “Os resultados apurados colocaram o PS muito longe da votação necessária a essa maioria absoluta (diferença de oito deputados)”.

Rio relativiza derrotas

Rui Rio destaca que as eleições de maio de 2019 (em que o PSD teve o pior resultado de sempre) denunciaram a “dificuldade do Partido Socialista em crescer de forma significativa: não mais do que 73 mil votos dos apurados em 2014, menos de 2% de acréscimo face ao total e ganho de um deputado”. Insiste, por outro lado que PSD e CDS tiveram “um ligeiro aumento de 22 mil votos em 2019 em relação a 2014”. E destaca ainda que “não valerá a pena estimar e avaliar com algum rigor como esta perda atingiu cada um dos partidos”, mas que “uma coisa é certa, a perda afetou de forma mais acentuada o CDS-PP“.

Rio assume que nas legislativas de 2019 não conseguiu “recuperar o eleitorado sénior (principalmente pensionistas e reformados que constituíam um dos pilares mais sólidos do eleitorado PSD) perdido em 2015, nem o eleitorado urbano, especialmente na Área Metropolitana de Lisboa e nas cidades médias”. Mas destaca que “em compensação”, o PSD  ganhou “eleitorado mais jovem e ativos mais qualificados”. E acrescenta, numa crítica às candidaturas de Montenego e Pinto Luz: “Face aos três últimos processos eleitorais, as legislativas de 2019 poderão ter representado a inversão da tendência de queda verificada depois de 2011. O resultado não correspondeu aos objetivos que dirigentes e militantes haviam fixado, mas não foi, por outro lado, a derrota catastrófica que muitos anunciaram.”

Reforma urgente na Justiça onde há “traços marcantes de corporativismo”

A nível de temas Rui Rio mostra-se na moção preocupado com o “sistema político”, que deve ser alterado para travar populismos, com a estagnação do crescimento na economia e com a demografia. Relativamente às alterações climáticas, Rui Rio quer avançar para a neutralidade carbónica, mas pede moderação contra o radicalismo. “Atualmente os movimentos sociais em defesa da descarbonização e do ambiente estão a ser capturados por forças radicais, identificando-se como anticapitalistas, mais não fazendo que difundir novas ortodoxias e novos radicalismos”, lê-se na moção.

Rui Rio enaltece a degradação dos serviços públicos, com particular destaque para a degradação do Serviço Nacional de Saúde. Fala mais uma vez na necessidade de uma “uma reforma urgente é a Justiça”, onde vê “traços marcantes de corporativismo e não sujeita ao escrutínio público”. Para Rio  a”morosidade dos processos que ilude o respeito e defesa dos diretos fundamentais, e os entraves ao acesso a este bem público fundamental por parte de todos os cidadãos, são os sintomas de uma tendência que urge inverter”.

O candidato destaca que “o PSD elege o combate à corrupção como uma das suas bandeiras”, em que a prioridade “tem de centrar-se na eliminação dos contextos que favorecem essa corrupção”. Rui Rio pede “independência face às oligarquias, eliminar a lógica clientelar no acesso aos cargos públicos e contrariar a ação das parentelas na ocupação do aparelho do Estado, das autarquias e empresas públicas, especialmente nos órgãos executivos de nomeação”. Mais uma vez com a mira apontada aos casos de nomeações partidárias e de familiares por parte do governo PS.

Acrescentadas declarações de Rui Rio sobre o tema das presidenciais proferidas à Agência Lusa