É fácil, é barato, dá milhões e é por ser mesmo assim que a Raspadinha está a aumentar o número de pessoas que chega aos consultórios médicos com o vício de jogar. O alerta vem de um estudo do Hospital de Braga publicado esta sexta-feira na revista científica The Lancet Psychiatry, que fala de uma “epidemia de raspadinhas” no país.
Segundo Daniela Vilaverde e Pedro Morgado, ambos psiquiatras, as raspadinhas “têm o potencial de encorajar o jogo excessivo porque estão associadas com experiências recompensadoras, têm uma frequência rápida e intervalos de pagamento curtos”. Além disso, “não exigem conhecimento especializado, não são caras e são altamente acessíveis”.
Desde 2010 para cá que o valor gasto em raspadinhas tem aumentado. Se há 10 anos os portugueses gastaram pouco mais de 100 milhões de euros nesse jogo, em 2018 o investimento já tinha chegado aos 1.594 milhões. É uma média de 160 euros por cada português, um valor muito acima dos 14 euros que cada espanhol gastou em raspadinhas no mesmo ano.
Segundo os autores do estudo, com o aumento das apostas em raspadinhas tem aumentado também o número de pessoas com doenças associadas ao jogo patológico. Um estudo de 2015 da Universidade do Minho, também ele assinado por Pedro Morgado, relata, por exemplo, o caso de uma mulher de 38 anos que perdeu o emprego e teve problemas no casamento porque, apesar de ganhar 485 euros mensais, gastava entre 2.000 e 3.000 euros em raspadinhas.
Outro caso apresentado nesse relatório é o de um homem de 52 anos que tinha perdas mensais na ordem dos 200 a 300 euros nas raspadinhas, mas ganhava 485 euros. Além do vício do jogo, o homem já tinha tido problemas de álcool, bebia seis a oito cafés por dia e consumia entre dois e três maços de tabaco diários.
É por causa de casos como este que Daniela Vilaverde e Pedro Morgado apontam o dedo à falta de regulação neste tipo de jogos, algo que tem um “efeito negativo na sociedade”: “A economia da indústria de jogos de azar pode resultar na falta de políticas eficazes para regular tipos específicos de jogos”, pode ler-se no sumário do estudo.