Já partiu para a Estação Espacial Internacional a histórica missão da SpaceX com dois astronautas da NASA a bordo. Apesar longas horas de incerteza por causa das condições meteorológicos, o tempo acabou mesmo por ajudar e foi dada luz verde para a descolagem às 20h22 de Portugal Continental. Bob Behnken e Doug Hurley devem chegar ao destino final em 19 horas.
Liftoff! pic.twitter.com/DRBfdUM7JA
— SpaceX (@SpaceX) May 30, 2020
Os astronautas viajam no módulo Dragon, que chegou ao espaço incorporada no nariz do Falcon 9. Todas as condições técnicas necessárias para assegurar um lançamento foram cumpridas, mas as condições meteorológicas continuaram a ser incertas por longas horas. Um boletim publicado cerca de hora e meia antes da descolagem dizia que não havia condições para a missão, mas uma aberta permitiu o avanço cerca de meia hora antes do lançamento.
Neste momento, o Falcon 9 já ultrapassou a condição Max Q, o ponto de uma rota de ascensão pela atmosfera fora em que o foguetão fica exposto à máxima pressão mecânica. É uma fase muito crítica para verificar a fiabilidade do design do foguetão. E passou no teste.
Second stage engine burn complete; Dragon confirmed in good orbit
— SpaceX (@SpaceX) May 30, 2020
O primeiro estágio, que é reutilizável, também já aterrou de nariz para cima na plataforma “Of Course I Still Love You”, no Oceano Atlântico. Quando os astronautas sentiram a mais potente Força G do percurso, a nave viajava a quase 27 mil quilómetros por hora a caminho da Estação Espacial. Agora, o Dragon já está sozinho no espaço e já entrou em microgravidade.
Falcon 9 booster has landed on the Of Course I Still Love You droneship! pic.twitter.com/96Nd3vsrT2
— SpaceX (@SpaceX) May 30, 2020
O momento em que a nave Dragon se separou do segundo estágio do foguetão também foi captado em vídeo. Agora o módulo da SpaceX com dois astronautas a bordo está por conta própria a caminho da Estação Espacial Internacional. Por ser automática em praticamente todos os controlos, Bob e Doug poderão dormir e descansar até chegarem ao destino enquanto a nave os conduz até lá.
Crew Dragon has separated from Falcon 9’s second stage and is on its way to the International Space Station with @Astro_Behnken and @AstroDoug! Autonomous docking at the @Space_Station will occur at ~10:30 a.m. EDT tomorrow, May 31 pic.twitter.com/bSZ6yZP2bD
— SpaceX (@SpaceX) May 30, 2020
O momento em que os astronautas se despediram da família
Minutos antes da chegada ao foguetão, Bob Behnken e Doug Hurley, já equipados com os fatos espaciais preparados pela SpaceX para os astronautas da NASA, conversaram com Jim Bridenstine (o administrador da NASA) e despediram-se da família. Bob deixou um recado ao filho: “Porta-te bem, não dês problemas à mãe”.
Our crew is ready. Let's do this.#LaunchAmerica pic.twitter.com/PoV1rjFbpC
— NASA (@NASA) May 30, 2020
Na impossibilidade de tocarem nas mulheres e filhos, levantaram os braços e juntaram as mãos, simulando um abraço. “Adeus, malta”, disseram Bob e Doug às famílias. Já dentro dos Tesla, Doug esticou as luvas e permitiu ao filho que a tocasse pela última vez antes do voo.
"We always think about the technology and the rockets, but this is what it's all about. The families coming together." @Astro_Flow comments on this touching moment as the families of @AstroBehnken and @Astro_Doug say goodbye as they depart for the Launch Pad: pic.twitter.com/xdfPv3IXYj
— NASA (@NASA) May 30, 2020
O presidente norte-americano Donald Trump assistiu à descolagem no Centro Espacial Kennedy a bordo do Air Force One. Trump foi uma das poucas pessoas a assistir ao vivo à descolagem do foguetão, uma vez que os ajuntamentos habituais foram proibidos por causa da Covid-19. O último presidente a assistir a um lançamento tinha sido Bill Clinton em 1998 com o Space Shuttle Discovery.
President @realDonaldTrump is en route to Kennedy Space Center to view the planned @NASA and @SpaceX rocket launch. pic.twitter.com/g29eIUlSim
— The White House 45 Archived (@WhiteHouse45) May 30, 2020
O problema da meteorologia na missão da SpaceX
Até poucos minutos antes do lançamento, nada garantia que a missão fosse mesmo levantar voo este sábado. A avaliação do 45º Esquadrão de Meteorologia da Força Aérea norte-americana chegou a dizer que havia 60% de probabilidade de haver condições meteorológicos adversas à realização de um lançamento para o espaço. A autorização para o voo podia ter recuado a qualquer momento.
205p: Radar shows showers and storms from Interstate 95 to the Space Coast. If this can clear by 245p, maybe #SpaceX launch can go. Will be down to the wire. pic.twitter.com/YWnvDrHeUp
— Capital Weather Gang (@capitalweather) May 30, 2020
Não são circunstâncias estranhas e o próprio Doug Hurley lembrou-o na sexta-feira, num tweet sobre os tempos em que viajou no Space Shuttle para o espaço: “No meu primeiro voo, STS-127, no vaivém Endeavor, tentámos cinco vezes ao longo de um mês por causa de desafios técnicos e climáticos”. Bob Behnken teve uma experiência semelhante: “Durante minha última missão no Space Shuttle, o tempo também nos apanhou”.
As desistências até foram tema na conversa dos dois astronautas com o administrador da NASA, disse Jim Bridenstine mais tarde numa entrevista: “O Bob acha que o problema é o Doug”, comentou entre risos. Mas o real problema é simplesmente o tempo, prosseguiu Jim: “Estamos na Flórida no meio de maio, vamos ter de tentar”.
Missão da SpaceX abortada por causa das condições meteorológicas. Nova tentativa no sábado
De acordo com o administrador da agência, o tempo estava melhor do que na quarta-feira, quando ocorreu a primeira tentativa, mas com algumas formações atmosféricas que se podiam ter traduzido em trovoada. É que não basta que a meteorologia por cima do Falcon 9 esteja nas condições perfeitas: é necessário que, nos lugares onde a nave cairá em caso de acidente, o tempo também seja seguro.
Human Space Flight network director Neil Mallik & mission manager Rosa Avalos-Warren support the @SpaceX Dragon launch from @NASAGoddard’s Network Integration Center. They are progressing with the count & just polled network elements for launch. Network is go! #LaunchAmerica ???????? pic.twitter.com/Gdj2jl1AFr
— NASA's Near Space Network (@NearSpaceNet) May 30, 2020
É assim por dois motivos: por um lado, para permitir às equipas de resgate chegarem facilmente ao local da aterragem; e, por outro, por causa na forma como os astronautas chegarão a terra em caso de acidente: “Eles usam páraquedas, por isso é preciso olhar para o vento e para a chuva”, descreveu Jim Bridenstine.
Numa comunicação para o interior do Dragon, cerca de duas horas antes do lançamento, um dos responsáveis pela missão explicou que a meteorologia ainda está incerta. Segundos depois, começou a chover no Complexo de Lançamentos 39A. Entretanto, o tempo melhorou, mas ainda falta uma decisão final.
Uma missão histórica que recupera prestígio aos EUA
Esta missão é preponderante para o futuro da exploração espacial. Será a primeira vez desde 2011, há nove anos, que os Estados Unidos regressam aos voos tripulados a partir de solo americano e com tecnologia da casa. Desde a reforma do programa Space Shuttle que os astronautas com o selo da NASA apanham boleia dos russos até ao espaço em troca de 85 milhões de euros por lugar.
Além disso, se a missão for bem sucedida e acoplar corretamente na Estação Espacial Internacional, a SpaceX tornar-se-á na primeira empresa privada a viajar até ao laboratório espacial a 408 quilómetros de altitude em relação à Terra. Será um sinal importante que poderá solidificar o papel do investimento privado em planos de outra magnitude, como o regresso à Lua. E abrirá a possibilidade cada vez mais realista do turismo espacial.
Depois do lançamento a partir da Flórida, será preciso esperar entre 19 e 20 horas para que o Dragon chegue à Estação Espacial Internacional, onde Chris Cassidy (EUA), Anatoly Ivanishin e Ivan Vagner (Rússia) esperam por Bob e Doug. A nave da SpaceX deverá acoplar com o laboratório domingo às 15h29 de Portugal Continental. Se quiser uma experiência semelhante à que os astronautas experimentam ao estacionar o Dragon na Estação, tente esta simulação preparada pela empresa de Elon Musk. Um aviso: não é nada fácil.
Mas meros minutos depois da descolagem, há um momento especial para assistir: o regresso do primeiro estágio do foguetão Falcon 9, que é reutilizável, até uma plataforma montada no Oceano Atlântico.
Da bandeira aos peluches, uma missão de simbolismos
A missão está repleta de simbolismos. O Falcon 9 será lançado precisamente da mesma plataforma de lançamentos de onde partiu a missão Apollo 11 — a 39A. E o piloto do Dragon é o mesmo astronauta que comandou a última viagem totalmente americana ao espaço, o Atlantis. Pode recordar aqui em baixo o lançamento.
Dezanove horas depois do lançamento, outra surpresa na Estação Espacial. Em 2011, quando os Estados Unidos foram pela última vez ao espaço exclusivamente com tecnologia própria, a tripulação do Space Shuttle Atlantis levou uma bandeira norte-americana para a Estação Espacial — a mesma que havia no primeiro Space Shuttle, o Columbia.
Em 2011, Barack Obama usou-a para lançar uma verdadeira caça aos ovos no espaço: “Esta bandeira vai viver na Estação Espacial Internacional até que uma empresa espacial comercial lançe astronautas para a estação”. Nove anos depois, a SpaceX está à frente da corrida pela recuperação da bandeira.
As surpresas a bordo do módulo Dragon
Bob Behnken e Doug Hurley não são os únicos passageiros a bordo do módulo Dragon que, 19 horas após o lançamento, deverá acoplar com a Estação Espacial Internacional. Há também um dragão de peluche que servirá como um “medidor de gravidade zero”: quando começar a flutuar pela câmara do Dragon, significa que se chegou a um momento em que só a microgravidade ainda atua.
Esta não é a primeira vez que a SpaceX junta um peluche à carga a bordo de um Dragon a caminho da Estação Espacial — embora seja, claro, o primeiro com companhia humana ao longo da viagem. Em março de 2019, Elon Musk colocou um peluche sorridente da Celestial Buddies com o formato do planeta Terra numa missão de envio de carga para os astronautas em órbita. O peluche está na Estação desde então e deverá voltar cá para baixo quando Bob e Doug regressarem — algo que pode acontecer só em finais de setembro.
Além disso, o Dragon transporta também uma ilustração inspirada no progresso da humanidade para lá da Terra desenvolvido por Tristan Eaton, um artista americano conhecido pelos trabalhos urbanos, assim como um painel de fotografias de finalistas do ensino secundário americano. Cada fotografia pode ser explorada na página da SpaceX.