Keylor Navas está a realizar uma temporada acima da média. Sempre constante nas competições internas, o guarda-redes do PSG superou-se na segunda mão dos oitavos de final da Liga dos Campeões, na semana passada, quando assinou uma exibição gigante que incluiu a defesa de um penálti de Messi. Ainda assim, o jogador de 34 anos vive nesta altura um período delicado — que o obriga a recordar uma das fases mais negras da carreira.
Para contar a história é preciso recuar a 2014 e ao Mundial do Brasil. Na altura, a seleção da Costa Rica alcançou a melhor classificação de sempre na competição, ao cair apenas nos quartos de final, nos penáltis, com a Holanda. O grupo onde se incluía Navas mas também Bryan Ruiz e Joel Campbell, dois jogadores que anos mais tarde viriam a representar o Sporting, ficou na história do país da América Central. Assim como o selecionador, o colombiano Jorge Luis Pinto, que tinha chegado à equipa três anos antes depois de uma primeira passagem relâmpago em 2004 e que se tornou desde logo um dos treinadores mais bem sucedidos da história da seleção.
Tudo parecia, portanto, estar a correr às mil maravilhas. Mas depressa se percebeu que não era bem assim. Logo em julho, um mês depois do final do Mundial, Jorge Luis Pinto apresentou a demissão da seleção da Costa Rica — em dezembro já estava a treinar as Honduras, onde permaneceu até 2017, assumindo depois o comando do Millionarios e dos Emirados Árabes Unidos. E foi preciso esperar quatro anos, até 2018, para começar a entender que a saída do técnico colombiano da seleção costa-riquenha terá sido tudo menos pacífica. Nesse ano, em entrevista à Radio Monumental, um dirigente da Federação da Costa Rica acusou os três capitães da seleção — Keylor Navas, Bryan Ruiz e Celso Borges — de conspirarem para perderem de propósito os três jogos da fase de grupos do Mundial do Brasil, causando a eliminação automática da equipa.
Porquê? Segundo a versão de Adrián Gutiérrez, que era o diretor das seleções de futebol do país, os três jogadores tinham conhecimento de uma cláusula incluída no contrato de Jorge Luis Pinto que indicava que, se a Costa Rica perdesse todos os três jogos da fase de grupos do Mundial, o despedimento do treinador seria automático. Alegadamente descontentes com o trabalho de Pinto, o objetivo de Navas, Ruiz e Borges seria provocar a saída do treinador através da eliminação precoce da competição. Depois das declarações de Gutiérrez, os três jogadores avançaram com uma queixa-crime por difamação contra o dirigente e também contra Juan Carlos Román, outro elemento da Federação que corroborou as acusações do diretor das seleções.
O processo está nesta altura a decorrer e já teve vários capítulos adicionais. Se Bryan Ruiz e Celso Borges negaram todas as acusações mas reconheceram que existia um desgaste na relação entre jogadores e treinador, o antigo presidente da Federação da Costa Rica apontou todos os alvos a Keylor Navas. “Eles sabiam que havia uma cláusula de confidencialidade que tínhamos com o Pinto, que dizia que se a seleção nacional perdesse os três jogos, o contrato seria rescindido, e usaram-na como argumento. A Federação não tinha motivos para o despedimento e o Keylor Navas virou-se e disse: ‘Vamos perder os três jogos’. Eu perguntei ‘como?’ e ele respondeu ‘nós sabemos que há uma cláusula”, declarou Eduardo Li em tribunal, confirmando então que a reunião com os três jogadores existiu mas alegando que só o guarda-redes do PSG sugeriu as derrotas premeditadas.
Navas foi o último a prestar esclarecimentos e até foi precedido pela mulher, Andrea Salas, que revelou que o jogador costa-riquenho recebeu muito mal a notícia de que estava a ser acusado de querer perder propositadamente. “O Keylor passou por uma… Depressão. Sentia muita frustração e impotência. Estava com um estado de espírito completamente diferente, não conseguia dormir. Teve de tomar comprimidos, quase não falava. Não foi uma depressão diagnosticada. Ele andava triste, sem ânimo. E ainda se sente afetado por tudo o que aconteceu porque a sua dignidade foi colocada em causa”, disse Salas. Já o próprio Navas, que falou através de uma vídeochamada, revelou que teve de explicar a situação ao Real Madrid, o clube que representava na altura.
“Eu estava no Real Madrid e em Espanha já tinham surgido uns problemas desse género. É muito mau que a imagem de uma pessoa seja afetada por uma coisa destas. Perguntaram-me sobre o que estava a acontecer e tive de explicar a situação aos meus colegas e aos elementos do clube. Graças a Deus, eles conhecem-me, sabem o tipo de pessoa que sou e acreditaram no que lhes estava a dizer”, referiu o guarda-redes.