Dois investigadores holandeses conseguiram identificar, através da análise a uma compilação de vídeos do período do Holocausto, três crianças que foram enviadas em 1944 para o campo de concentração de Bergen-Belsen, na Alemanha. As três crianças sobreviveram à Segunda Guerra Mundial e duas delas ainda estão vivas.

“Agora sinto que posso gritar do telhado. Ainda estou aqui, os nazis não me apanharam”, afirmou ao The New York Times Marc Degen, uma das crianças identificadas no vídeo, hoje com 80 anos, a viver em Amstelveen, nos subúrbios de Amsterdão.

Nas imagens em causa, que constam de uma compilação de gravações que resultou no documentário Westerbork (o nome de um campo de refugiados transformado em campo de concentração após a invasão Nazi dos Países Baixos em 1939) — filmado por Werner Rudolf Breslauer, um prisioneiro judeu alemão incumbido dessa tarefa por um oficial nazi —, vê-se uma cena de cerca de três segundos em que surgem três crianças a partir num comboio que tinha como destino campos de concentração.

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Além de Marc Degen, as outras duas crianças são a sua irmã Stella Fertig, que vive hoje em Nova Iorque, e o primo de ambos, Marcus Simon, que sobreviveu à Segunda Guerra Mundial mas morreu em 2006. Quando foram enviados para o campo de concentração, Marc, Stella e Marcus tinham, respetivamente, três, um e quatro anos de idade.

Durante décadas, a identidade das crianças que apareciam no filme nunca foi conhecida. No entanto, os investigadores holandeses Koert Broersma e Gerard Rossing, que se têm dedicado a estudar o documentário Westerbork, entretanto restaurado, conseguiram identificar as crianças durante a investigação que fizeram para a escrita de um livro sobre o filme. Para tal, tiveram acesso a bobinas originais do documentário filmado em 1944, e, graças a imagens mais nítidas conseguiram ler nomes nas bagagens dos passageiros do comboio. Por exclusão de partes, umm vez que a família Degen era a única com três crianças abaixo dos seis anos de idade, conseguiram chegar a Marc, Stella e Marcus.

Além disso, Broersma e Rossing descobriram que metade dos prisioneiros do comboio foram enviados para o campo de concentração de Bergen-Belsen, na Alemanha, e os restantes para Auschwitz-Birkenau. A família Degen foi levada para Bergen-Belsen, tendo as três crianças sido separadas dos pais — as mulheres foram enviadas para a Suécia numa troca de prisioneiros, enquanto os homens foram deportados para o campo de concentração de Sachsenhausen, na Alemanha, onde viriam a morrer em 1945.

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Quanto às crianças, permaneceram no campo de concentração de Bergen-Belsen, tendo ficado ao cuidado de Luba Tryszynska, uma enfermeira judia que impediu que morressem à fome. Bergen-Belsen seria libertado em abril de 1945, pelas forças britânicas, e as três crianças acabariam por reencontrar-se com as mães.

Stella Fertig, que na altura tinha um ano de idade, não se recorda de nada desse período. “As pessoas dizem que é melhor que eu não me recorde, mas eu gostaria de saber um pouco mais”, lamentou Fertig ao New York Times

Já o seu irmão, Marc Degen, garante que se reconheceu a si e à sua mãe no vídeo assim que viu as imagens. “Fiquei emocionado ao ver-me como um pequeno rapaz a ser transportado com a família. Sinto-me privilegiado por, aos 80 anos, sentir-me saudável, na minha cabeça e no meu corpo, e poder falar sobre isto”, disse em entrevista ao mesmo jornal norte-americano.