O tribunal decidiu esta segunda-feira adiar pela segunda vez o julgamento do ex-líder do BES, Ricardo Salgado. Há uma semana o julgamento saído da Operação Marquês, em que Salgado responde por três crimes de abuso de confiança, foi adiado porque a defesa ainda não tinha entregado a contestação e só iria fazê-lo no último dia do prazo. Agora é o Ministério Público que pede tempo para analisar as mais de 300 páginas apresentadas pela defesa do o ex-presidente do BES. O coletivo de juízes remarcou o início para 6 de julho, às 14h00.

Aquela que seria a primeira sessão de julgamento, no quinto andar do Campus da Justiça, em Lisboa, arrancou logo com o pedido do procurador Vítor Pinto, o mesmo que acompanhou a instrução do processo saído da Operação Marquês. O magistrado explicou que só esta manhã foi notificado da contestação de 191 páginas, às quais acrescem 160 de prova documental. E que precisava de tempo para analisar todos os fundamentos da defesa e da prova e contraditá-la com o processo.

O juiz presidente Francisco Henriques acomodou-se na cadeira, trocou umas palavras com os dois outros juízes e acabou por proferir a decisão: suspender as sessões marcadas para esta segunda e terça-feira e dar início ao julgamento apenas a 6 de julho.

No primeiro dia, que começará às 14h00, serão ouvidos o contabilista da ESI (Espírito Santo International),  Machado da Cruz — que o Tribunal não tem conseguido notificado — e o gestor de fortunas Michel Canals. Já o dia 8 será reservado a Paulo Silva, o inspetor tributário que investigou o processo. A 13 de julho, de manhã será ouvido Henrique Granadeiro. O tribunal marcou também para essa manhã de 13 Amilcar Morais Pires e à tarde José Maria Ricciardi, Hélder o empresário Hélder Bataglia, — o também arguido no processo da Operação Marquês, que admitiu receber dinheiro do Salgado para transferir para o empresário amigo de José Sócrates, Carlos Silva a ser ouvido — e Francisco Fino.

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O coletivo de juízes pediu já à defesa para guardar os dias 6, 8, 13,14, 16, 20, 21 e 23 de setembro, para prosseguir o julgamento.

Defesa também tentou adiar julgamento, mas por causa da pandemia

Já na sexta-feira, a defesa de Ricardo Salgado tinha também pedido o adiamento do julgamento, mas com outra justificação: Salgado tem mais de 70 anos e, segundo a legislação em vigor, não é obrigado a deslocar-se ao tribunal por causa da pandemia de Covid-19. Segundo os advogados, no entanto, o arguido tem o direito a assistir presencialmente à produção de prova, por isso pedem que o julgamento seja adiado,

O requerimento assinado pelos advogados Francisco Proença Carvalho e Adriano Squillace foi entregue sexta-feira, segundo apurou o Observador. Nesse pedido a defesa alegou que o coletivo de juízes invocou legislação da Covid-19 já revogada para avançar com o julgamento. A resposta do tribunal foi dada de forma esquiva pelo juiz, já depois de decidir adiar o julgamento. “Não vamos bater outra vez no ceguinho”, justificando que tribunal e defesa têm “entendimentos diferentes” quanto à interpretação da lei.

Há uma semana, o juiz avisou que queria ouvir presencialmente Salgado depois de a defesa ter pedido que ele não estivesse presente no julgamento. Ao Observador, a defesa de Salgado recusou responder se ele já foi ou não vacinado contra a Covid-19.

Operação Marquês. Juiz adia julgamento de Ricardo Salgado uma semana para “evitar pingue pongue”

Esta foi a quarta tentativa dos advogados de travar o início do julgamento. Primeiro, a defesa do ex-presidente do BES tentou que Ricardo Salgado não fosse julgado num processo à parte daquele que originou a Operação Marquês, mas o juiz que ficou com o caso alegou que esse pedido não podia ser feito neste novo processo. Depois os advogados tentaram que Salgado fosse julgado na sua área de residência em Cascais. Num terceiro pedido, ainda antes de arrancar aquela que seria a primeira sessão do primeiro julgamento do caso que envolve José Sócrates, a defesa lembrou ao coletivo que não podia arrancar sem que eles apresentassem a sua contestação (com o aviso que seria apresentada no limite do prazo com pagamento de multa). E foi esta contestação que agora lhes valeu para o Ministério Público ver o julgamento adiado.

Com este adiamento, o primeiro julgamento da Operação Marquês passou a ser o de Armando Vara  — o outro arguido que o juiz Ivo Rosa determinou que fosse julgado à parte do processo principal — e que começou a ser julgado dois dias depois (na última quarta-feira).

Como vai ser o primeiro julgamento (a sério) de Ricardo Salgado?

Ricardo Salgado chegou à fase de instrução do caso Marquês acusado de 21 crimes, entre os quais corrupção ativa, branqueamento de capitais, falsificação de documento e fraude fiscal qualificada. Mas o juiz Ivo Rosa, decidiu levá-lo a julgamento por apenas por três crimes de abuso de confiança e num processo autónomo do de José Sócrates e do empresário Santos Silva.

O juiz de instrução considerou haver provas suficientes que indicam que a sociedade offshore Espírito Santo (ES) Enterprises, o chamado “saco azul do BES”, com várias contas bancárias no Banque Privée Espírito Santo, na Suíça, era “controlada pelo arguido Ricardo Salgado e utilizada pelo mesmo para movimentar fundos e realizar pagamentos sem que a sua origem, destino e justificação fosse revelada”.

Em tribunal Salgado terá que justificar porque foram transferidos 4 milhões de euros para a Savoices, uma outra empresa offshore da qual o ex-líder do BES era o beneficiário, os motivos das várias transferências para o ex-líder da PT Henrique Granadeiro (que terá transferido depois  4 milhões de euros para uma conta no banco Lombard Odier aberta em nome de uma sociedade offshore chamada Begolino, que pertence a Ricardo Salgado e à sua mulher) e as razões pelas quais dois milhões e 750 mil euros saíram do BES Angola, passaram por uma conta do empresário Hélder Bataglia, e acabaram na Savoices do próprio Ricardo Salgado.

*artigo corrigido na parte referente ao agendamento das próximas sessões de julgamento