A ideia de Filipa, Henrique e Leonardo é simples: cada separador (ou tab, como também são conhecidas) com publicidade que abrimos nos navegadores de internet (vulgo, browsers) vale dinheiro. Assim, em teoria, quanto mais se abrem, mais dinheiro pode ser feito. Com recurso a uma extensão (uma espécie de app para os browsers), a Tabfund quer convencer as pessoas abrirem muitas “tabs“. O objetivo destes jovens não é ficarem ricos. Pelo contrário, querem juntar dinheiro para combater a pandemia de Covid-19. O arranque foi de tal forma bem sucedido que a startup foi escolhida na secção de “Impact Investing” como uma das finalistas do prémio “World Changing Ideas 2021, da revista Fast Company.

“O objetivo da Tabfund é simplificar e poder investir-se na investigação científica”, explica ao Observador Leonardo Machado. Quando não se dedica a este projeto nas horas livres, trabalha como engenheiro informático. Além disso, como tantas outras pessoas, em março de 2020, sentiu-se impotente com o impacto que a pandemia de Covid-19 estava a ter. Por isso, quis fazer alguma coisa. Com a ajuda de Henrique Lopes Cardoso — que também é engenheiro informático e é um “amigo desde sempre” –, decidiu usar os talentos de ambos para ajudar a encontrar uma solução.

“Se calhar temos de pensar um bocadinho que a investigação é das partes mais importantes para ajudar a pandemia”, discutiram.

Assim, surgiu a ideia de que era importante angariar dinheiro para projetos científicos. Como estava a trabalhar com Henrique numa extensão para browsers para outro projeto, usaram o conhecimento que tinham para criar esta startup de solidariedade social. Mesmo assim, ainda precisavam de alguém “que percebesse de design”. Entra em cena Filipa Pinto, amiga de Leonardo e Henrique que, apesar de não ser designer de profissão (é gestora de produto) “sabia bem mais do que nós”, conta.

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Com a equipa montada, a Tabfund começou a dar os primeiros passos, como diz o programador: “Começámos em abril e tivemos a primeira versão sem anúncios em agosto”. Foi “mais ou menos seis meses”, conta Leonardo. Com esta versão finalizada, a equipa foi falar com a i3S (Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto), atualmente o único instituto que ajudam a financiar.

Deste passo, até serem escolhidos pela Fast Company, ainda se junta outro ingrediente que os ajudou: o contacto da agência de publicidade Superunion, que trabalha com grupos com a WPP. “Contactaram-nos”, conta. Com este apoio logístico, conseguiram dar vida à ideia que veio a ser escolhida pela Fast Company.

Os três jovens são do norte do país, Filipa, que é de Matosinhos, e Henrique, que é do Porto, têm 27 anos. Já Leonardo, que também é do Porto, tem 26. Desde agosto e entre confinamentos e trabalhos continuaram a dedicar-se a este projeto nos tempos livres. Em fevereiro, lançam-no oficialmente.

Até agora não houve investimentos externos ou business angels. Por isso, e “para já”, os números são modestos — vão doar já 400 euros à i3S. Ao todo conseguiram “cerca de 430”, mas os cerca de trinta euros a mais tiveram de usar foi para pagarem custos que têm “com servidores”.

“Usámos 100% recursos nossos”, diz Leonardo. Mesmo assim, há números dos quais já se podem gabar: este montante vem dos separadores abertos por seis mil pessoas de “50 países” que já usam a plataforma enquanto navegam na internet.

Inicialmente, a equipa da Tabfund tinha pensado em “intervir em associações de caridade ou de ambiente”. Porém, “já há pessoas a fazer esse tipo de trabalho”, afirma. Por isso, a escolha dos projetos selecionados será sempre “financiamento científico”. Mesmo no futuro, quando a pandemia acabar, o objetivo é continuar a investir em projetos de investigação, diz a empresa. E tudo “salvaguardando os dados das pessoas”, promete o fundador.

Como é que Tabfund faz dinheiro se “as pessoas podem usar de forma anónima”?

A ideia por detrás da Tabfund é um pouco como o negócio que está por detrás de redes sociais como o Facebook. Pôr pessoas a ver publicidade online e recolher parte do dinheiro que as empresas pagaram para pôr aí os anúncios. No entanto, a finalidade da startup é um pouco mais altruísta. Além disso, quem usa a extensão pode dizer alguma coisa quanto a que projetos se vai alocar o dinheiro. E pode ser tudo feito “de forma anónima”; garante Leonardo.

A quantidade de dinheiro que cada pessoa gera com os anúncios que gera recebe é muito pequenino. Quando é muita gente já é algo”, diz o presidente executivo da Tabfund.

Mesmo com anonimato, o processo não é muito complicado. Com a Tabfund instalada, o software vai contabilizando os separadores de anúncios que um utilizador vai abrindo enquanto navega na internet. Se o anúncio for de uma plataforma com a qual a Tabfund trabalha, como é o caso do Google AdSense — um “middle man” (intermediário), como chama Leonardo” — a extensão contabiliza o separador. Se não for, não conta.

Quanto a esta parte da contabilização, que pode gerar dúvidas quanto à proteção de dados, Leonardo afirma: “Não existe necessidade de transmitir dados, isso é importante para nós”. A empresa leva a afirmação de tal forma a sério que permite que se use a extensão anonimamente. Por outras palavras, sem ter de fazer login. No máximo, “o único dado pessoal que pode existir é o nome próprio e o email”, mas as pessoas só “providenciam se quiserem”.

Esta última parte quanto “alguns dados que podem ser recolhidos”, é importante porque a equipa está a trabalhar numa ferramenta que ajudará quem não se importe de se registar na plataforma. Isso pode ser feito com uma conta Google ou com um registo no site. Desta forma, e só com utilizadores registados, a Tabfund poderá mostrar quantos separadores uma pessoa abriu e quanto dinheiro ajudou a empresa a juntar para doar. Mesmo assim, Leonardo promete que não há “o objetivo de se partilhar [dados] com empresas terceiras”, sejam quais forem.

Anonimamente ou com login feito, pode ainda usar-se os votos, ou tabs angariados. Para isso basta aceder à página online da extensão. Para facilitar, esta passa a ser a página inicial do browser depois de ser instalada, mas isso pode ser mudado e não é obrigatório. É nesse site que se pode utilizar os pontos, ou tabs, angariadas. Estes funcionarão como votos que pode usar para escolher qual o projeto que quer que receba dinheiro. Se não votar não há problema, um dos projetos acaba sempre por ser escolhido.

“Mil separadores podem valer 40 cêntimos”

“Mil separadores podem valer 40 cêntimos”, mas isto é uma “estimativa a puxar para cima” explica Leonardo Machado. O número exato de dinheiro é “difícil de explicar”, porque muda de país para país e quantas aberturas é que o separador teve, adianta o engenheiro informático. Mesmo assim, a empresa vai juntado dinheiro que, de três em três meses, é cedido ao projeto de investigação que a empresa deu a escolher e que teve mais votos  Atualmente, há apenas um projeto devido às parcerias que estão a em curso. Contudo, Leonardo assume que o objetivo é terem até dois projetos por instituição de investigação científica parceira.

A extensão neste momento está disponível para os browsers Google Chrome e Firefox e pode ser instalada através da página oficial do projeto. No futuro, a Tabfund quer poder “cortar com o middle man” e não ter de pagar taxas às empresas que gerem os anúncios. “Queremos que as empresas venham ter connosco“, diz.

Depois de a pandemia já não ser tão urgente, os três fundadores e membros da Tabfund querem doar o dinheiro que conseguirem a outros projetos de investigação científica. Em “saúde, ambiente ou novas tecnologias”, refere Leonardo. E há uma promessa: “Não é de todo objetivo as pessoas poderem lucrar [com a extensão]”. Por outras palavras, mesmo que surjam novos projetos, o dinheiro que se junta a abrir separadores será sempre para investigação científica.

Num futuro mais longínquo, o objetivo dos três membros pode passar por dedicarem-se “a 100% ao projeto”. Mesmo assim, e como mantém os compromissos profissionais, “é apenas um projeto à parte com o propósito de ajudar a combater a pandemia”.