Só Rui Patrício e Raphael Guerreiro, fixo no corredor esquerdo do ataque português, não tocam na bola. À exceção do guarda-redes e do lateral, no carrossel do terceiro golo português entraram todos: centrais, lateral-direito, médios, avançados, tudo.
A jogada que termina com Ronaldo a fechar o marcador em Budapeste em 0-3, aos 92 minutos, teve 33 passes. O número foi contado por Henry Bushnell, jornalista da Yahoo Sports, que usa uma só palavra para descrever o lance: “poesia”.
The 33-pass Portugal goal, in full, from above.
Poetry. pic.twitter.com/qE9EAgzBPY
— Henry Bushnell (@HenryBushnell) June 15, 2021
Neste tiki-taka à portuguesa, a bola vai circulando de jogador para jogador, pacientemente. Para a troca de bola com passes mais curtos contribuiu também o resultado, que estando em 0-2 permitia à Seleção Portuguesa gerir mais a posse do esférico com cuidado, com os jogadores a preferirem não arriscar perder a bola do que acelerar rapidamente à procura do golo.
Ainda assim, como se vê no vídeo, a posse de bola não é exclusivamente passiva: com a troca de passes os jogadores portugueses vão movimentando os jogadores húngaros, fazendo-os correr e sair de posição, abrindo espaços.
No final do lance, depois de atrair jogadores da Húngria para o corredor lateral (o direito do ataque do português), o lateral Nélson Semedo faz um passe para zonas mais interiores, Ronaldo recebe de costas para a baliza, vira-se, toca para Rafa e a partir daí segue-se uma sucessão de tabelas entre os dois jogadores.
O truque para se livrarem dos húngaros, visto lentamente, é simples: cada vez que entre os dois o portador da bola via os jogadores húngaros aproximarem-se de si, libertava a bola tocando-a para o colega, mais solto de marcação, e assim sucessivamente até Rafa, vendo Ronaldo fugir pela sua direita (apenas com um adversário na mesma linha, que o colocava em jogo, mas que estava distante, na zona de penalty), colocar-lhe a bola. O resto é a classe de um dos melhores finalizadores da história do futebol: receber, ir em direção ao guarda-redes, puxar a bola para a sua esquerda — contornando-o — e empurrá-la para dentro da baliza.