Robin Gosens era um jovem alemão (com dupla nacionalidade holandesa) que queria ser polícia. Não fosse o futebol ter resultado, ainda que tarde, comparando com a maioria dos percursos dos jogadores profissionais, e o atual internacional alemão teria “provavelmente seguido esse caminho em primeiro lugar”. Não seguiu e, passados alguns anos, salta à vista a sua qualidade enquanto futebolista, principalmente depois da excelente exibição frente a Portugal, na segunda jornada da fase de grupos do Euro 2020, num jogo que não deu alegrias aos portugueses (derrota por 4-2) e que o colocou como uma das grandes revelações da prova.

“O futebol amador é uma grande parte do meu ADN e da maneira como estou em campo, mas também da minha personalidade”, disse uma vez o jogador numa entrevista ao site da Federação Alemã de Futebol. É uma frase que faz sentido, visto que Gosens apenas chega a um clube profissional aos 18 anos. E, mesmo aí, o caminho não foi fácil.

O lateral/médio esquerdo alemão até começou em clubes do seu país e fez “captações” nas camadas jovens do Borussia Dortmund, mas sem bons resultados, tendo enfrentado jogadores que há muitos anos tinham escola de academias de clubes de mais renome. Foi depois nos Países Baixos que as coisas começaram a correr bem.

“Os testes em Dortmund não correram bem, mas eles convidaram-me, portanto devem ter visto algo em mim. Quando tive a chance nos Países Baixos, trabalhei muito em mim. Foi um golpe de sorte que as coisas me tenham corrido bem lá, visto que o mais importante para ele são as questões básicas: técnica, primeiro toque, coordenação… Nunca tinha trabalhado especificamente nessas coisas. Definitivamente que há jogadores com mais talento que eu, mas que não tiveram uma carreira como a minha. Por isso, diria que no futebol, hoje em dia, não se pode desvalorizar a mentalidade”, explicou na mesma entrevista.

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E o primeiro clube onde as coisas correram “bem” foi o Vitesse, da Holanda, em que passa pelos juniores e chega à equipa B. Segue-se um empréstimo ao modesto Dordrecht, seguindo-se uma transferência para o Heracles, onde atua duas épocas – 2015/2016 e 2016/2017 –, conseguindo depois dar o salto para o calcio, chegando então à Atalanta, onde ainda se encontra a jogar, e bem.

As boas épocas em Itália

Logo na primeira época, sob o comando técnico de Gian Piero Gasperini, faz 26 jogos e ajudou a equipa a chegar a um honroso sétimo lugar, antes de o clube arrancar para três épocas fabulosas: três terceiros lugares consecutivos e uma ida aos quartos de final da Liga dos Campeões (perdeu com o PSG nos descontos).

Gosens, que dizem os rumores já despertou o interesse do Barcelona, pegou de estaca e tornou-se peça fundamental e constante da manobra do clube italiano, revelando inclusivamente um goleador, com 12 golos na época que recentemente terminou, e dez na temporada anterior. Um ala com golo, mas também forte nas assistências, como infelizmente Portugal comprovou…

Mas, talvez por ter chegado tarde ao futebol, Robin Gosens não esquece aquilo que está para lá do futebol, estando também focado nos estudos em Psicologia. “Estudar é importante para mim porque tira-me a cabeça do futebol. No geral, não é bom quando apenas se pensa no trabalho. Estudar mantém-me com os pés no chão e mostra-me que existem outras coisas para focar-me, o que vale ouro, para mim, mentalmente. O meu plano é tirar um mestrado em Psicologia do Desporto depois de completar a minha licenciatura”, contou.

Cristiano Ronaldo e a história da camisola

Bem se diz que quem ri por último, ri melhor. E o que dizer da história entre Gosens e Cristiano Ronaldo. Segundo revelou num livro, o alemão pediu a camisola ao português num encontro da temporada 2018/2019, quando a sua Atalanta eliminou a Juventus da Taça de Itália. Ronaldo, com um seco “não”, provavelmente pouco animado com a derrota, encerrou ali o assunto. Para Gosens, contudo, era importante: “Após o final do jogo fui logo ter com ele e nem fui festejar com o público. Temos de ter prioridades, amigos. Contudo, o Ronaldo não aceitou. Fiquei corado e envergonhado. Fui afastado e senti-me pequeno”, disse.

No sábado, o ala foi o melhor em campo contra Portugal, e desta vez não pediu a camisola a ninguém: “Desta vez não pedi a camisola, porque queria festejar a vitória e uma noite inesquecível”. E é bom que Gosens, que segundo o Transfermarkt vale já 35 milhões de euros (um montante que poderá afastar alguns dos interessados mas que nem por isso o tira da órbita de grandes clubes), não troque a sua camisola de sábado com ninguém: não é todos os dias que se consegue ser MVP num jogo do Europeu e logo à nona internacionalização.