O pingue-pongue continua. Primeiro foram as declarações de Manuel Heitor — sobre a formação de médicos de família, que considerou não ser tão exigente como a de outras especialidades — que enfureceram a classe. Seguiu-se a reação dos médicos e a exigência de um pedido de desculpas público. A resposta do ministro do Ensino Superior foi rápida: apresentar desculpas está fora de questão e, segundo Heitor, as suas declarações foram descontextualizadas. O Fórum Médico — que reúne todas as organizações representativas da classe —  voltou à carga e acusa o ministro de mentir por opção. 

Reunido, de novo, com caráter extraordinário, o Fórum Médico afirma que Manuel Heitor “faltou despudoradamente à verdade, revelando mais uma vez falta de respeito pelos médicos”, referindo-se à recusa do ministro em voltar atrás com o que disse. “Não retiro nada do que disse. É preciso formar mais e preciso valorizar todas as especialidades”, argumentou Manuel Heitor na passada semana. “Se há poucos médicos de família é preciso ter mais e valorizá-los.”

Fórum Médico exige “pedido de desculpas público” ao ministro do Ensino Superior

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Perante o argumentário de Heitor, o Fórum Médico reafirma que as declarações do ministro “não foram desvirtuadas nem pelo Fórum Médico nem pelas várias estruturas nacionais e internacionais que reagiram publicamente a afirmações que nos devem envergonhar como país”.

Para além desta organização portuguesa, também a Associação Médica do Reino Unido (BMA) acusou o ministro de fazer afirmações “incorretas”, passando uma ideia que “prejudica gravemente” os médicos de família britânicos “altamente qualificados”. Depois, foi a União Europeia de Clínicos Gerais/Médicos de Família (UEMO) a rejeitar a ideia de se poder baixar os padrões de formação de clínicos gerais, como o ministro sugere na entrevista.

Ministro não retira nada do que disse sobre formação de médicos de família

No novo documento de repúdio às declarações de Manuel Heitor, o Fórum Médico frisa que “não foi publicada qualquer correção à mencionada entrevista, o que seria o caminho natural caso o senhor ministro tivesse reportado junto do jornal o desconforto com a alteração das suas palavras”. Assim, fica “claro que está a mentir quando nega que tenha defendido que a formação dos especialistas em Medicina Geral e Familiar pode ser menos qualificada”.

É totalmente inaceitável e desrespeitosa a forma como o senhor ministro desvalorizou a formação e a qualidade dos médicos especialistas em Medicina Geral e Familiar. A situação torna-se mais gravosa quando, perante o sentimento de indignação e injustiça que provocou junto dos médicos e dos cidadãos, o senhor ministro opta por mentir e persistir no erro, de forma insultuosa, quando podia ter pedido desculpa e demonstrado a elevação que se espera de um governante”, defende a organização.”

O Fórum Médico reúne Federação Nacional dos Médicos, Sindicato Independente dos Médicos, Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública, Federação Portuguesa das Sociedades Científicas Médicas, Associação Portuguesa dos Médicos de Carreira Hospitalar, Associação Nacional de Estudantes de Medicina e Ordem dos Médicos.

O que disse Manuel Heitor?

“Se for ao Reino Unido o sistema está diversificado, sobretudo aquilo que é a medicina familiar, que tem um nível de formação menos exigente do que a formação de médicos especialistas”, disse Manuel Heitor ao DN no início do mês. “A questão é que para formar um médico de família experiente não é preciso, se calhar, ter o mesmo nível, a mesma duração de formação, que um especialista em oncologia ou um especialista em doenças mentais.”

Na mesma entrevista, o ministro deixou clara a sua vontade de ver abrir em Portugal mais três cursos de Medicina, outra discussão que tem sido um braço de ferro entre a classe médica e o Governo. Esta terça-feira, na abertura da primeira escola privada de Medicina do país, António Costa reforçou a ideia de Heitor e previu o aumento da formação de médicos em Portugal através de uma oferta que não tem de ser necessariamente estatal. Pelo caminho, apontou o dedo ao corporativismo e aos bloqueios que atrasaram a abertura do curso da Universidade Católica.