A noite de sábado tinha tudo para ser uma verdadeira festa do atletismo nacional, a única modalidade com medalhas olímpicas de ouro por Portugal (cinco) e que celebrava no Casino os 100 anos da Federação numa gala intitulada de Centenário. Só mesmo a ausência de Carlos Lopes, a recuperar de doença, surgia como a única nota menos positiva, sendo que houve até um momento alto não preparado quando Nelson Évora e Pedro Pablo Pichardo, juntos no palco, se cumprimentaram de forma cordial depois de tudo o que se disse e se passou nos Jogos de Tóquio – e que mais não foi do que um prolongamento dos anos anteriores.
Os dois saltadores, campeões olímpicos em 2008 e 2021, respetivamente, não fizeram propriamente as pazes mas, num momento solene, colocaram de lado a rivalidade. No entanto, a Gala do Centenário seria marcada por um outro caso, que levou mesmo a uma demissão nos próprios quadros da Federação.
Durante a cerimónia, foram entregues vários prémios que distinguiram os melhores atletas nacionais ao longo do século, fosse na forma de galardão, fosse na forma de nomeação. Carlos Lopes e Rosa Mota, os dois primeiros campeões olímpicos, foram os Atletas do Centenário; o eterno Mário Moniz Pereira foi o Treinador do Centenário; Fernando Mota, que dirigiu a Federação Portuguesa de Atletismo ao longo de quase 20 anos entre 1993 e 2012, foi o Dirigente do Centenário; Jorge Salcedo foi o Juiz do Centenário; Aarons de Carvalho foi o Jornalista do Centenário. Tudo como resultado da votação tripartida entre direção da Federação (50%), estrutura da Federação (25%) e público (25%, através das redes sociais).
No meio de todos esses momentos, João Campos, antigo técnico de Fernanda Ribeiro, Rui Silva ou Jéssica Augusto, entre outros, acabou por abandonar a sala ao ver que não tinha sequer entrada entre os quatro nomeados na categoria de Treinador do Centenário, onde estavam, além de Mário Moniz Pereira, João Ganço, José Uva e Sameiro Araújo. Em solidariedade, João Ganço também terá saído. E Fernanda Ribeiro, que tinha sido mandatária da candidatura de Jorge Vieira nas últimas eleições, não só saiu também da cerimónia como apresentou esta segunda-feira a demissão de vogal da direção da Federação.
“Mesmo não havendo no atletismo quem tenha ganho mais medalhas internacionais do que eu, tendo, ainda, sido recordista do Mundo, mesmo sabendo que eleita seria a Rosa Mota, fiz questão de estar na Gala. O problema foi o que fizeram ao prof. João Campos, o treinador que fez de mim o que eu fui e que, para além disso, também ganhou medalhas internacionais com a Jéssica Augusto, com o Rui Silva, para já não falar nas que ganhou com outros seus atletas por equipas. Faltaram-lhe ao respeito e, perante isso, eu não poderia continuar na Direção de uma federação que o fez…”, contou a ex-atleta ao jornal A Bola.
“Não sei se esse abandono aconteceu por o prof. João Campos ter, entretanto, sabido que não estava entre os nomeados – o que lhe posso dizer é que quando anunciaram os quatro nomes para Treinador do Centenário, não estando lá o dele, eu, chocada, levantei-me e fui-me embora. Não poderia, na minha consciência, admitir que o prof. João Campos fosse humilhado daquela maneira – porque era mesmo isso: uma humilhação ao treinador mais medalhado do Centenário. Claro, que ganhasse o prof. Moniz Pereira era admissível, que o prof. João Campos não estivesse nos quatro, é indesculpável”, salientou a ex-campeã europeia, mundial e olímpica, nos Jogos de Atlanta em 1996, acrescentando: “Foi o que eu senti: que João Campos foi humilhado. E foi o que me levou à decisão de não continuar mais na Federação”.