A Associação Nacional do Ramo Automóvel (ARAN) alertou esta quarta-feira para a ilicitude de modelos de venda propostos aos concessionários por alguns fabricantes automóveis, transferindo riscos do negócio para os revendedores, mas mantendo o controlo do preço final dos veículos.
As propostas contratuais formuladas pelos fabricantes aos concessionários são cada vez mais criativas, havendo propostas no sentido de os revendedores continuarem a suportar investimentos e riscos significativos, sem que o preço final de venda esteja completamente definido”, denuncia a associação em comunicado.
Segundo salienta a ARAN, “esta prática não é permitida”, pois traduz-se, na realidade, “num controlo do preço de venda final do veículo pelo fabricante, continuando os riscos inerentes ao negócio por conta do concessionário”. Contudo, os concessionários “muitas vezes aceitam as propostas, por receio de cessação da relação comercial com as marcas/fabricantes”.
O comunicado da ARAN surge na sequência de um alerta feito em abril pelo Conselho Europeu do Comércio e Reparação Automóvel (CECRA), segundo o qual “muitos fabricantes automóveis estão a alterar os modelos de venda e os contratos celebrados com os concessionários para além do que é legalmente admissível”. Em causa estão propostas feitas por parte de alguns fabricantes automóveis a distribuidores para que celebrem o que denomina de “‘falsos’ contratos de agência”.
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Atualmente muito usados pelos construtores automóveis, os contratos de agência são um modelo em que os concessionários atuam como agentes de vendas, sendo meros intermediários do fabricante nas encomendas de veículos e cobrando as respetivas comissões. O preço final de venda dos veículos é fixado pelo fabricante, que assume todos os riscos financeiros e investimento, pelo que este modelo não se enquadra no âmbito das leis da concorrência.
Este modelo comercial difere do clássico modelo de distribuição, em que os riscos financeiros e os investimentos são, em grande medida, suportados pelo concessionário distribuidor, tendo este quase total liberdade para fixar o preço final de venda do veículo ao cliente.
Num comunicado divulgado no passado dia 4 de abril, o CECRA diz ter tido conhecimento de que “alguns fabricantes estão a ‘propor’ aos distribuidores contratos de agência ‘não genuínos’”, nos quais os concessionários “continuam a suportar riscos e investimentos significativos” e o preço final de venda dos veículos não é totalmente definido pelo fabricante.
Contudo, explica o CECRA, na verdade os fabricantes apenas permitem aos distribuidores uma ligeira flutuação, de muito poucos euros, no preço final ao consumidor: “Este valor é irrisório e não permite, certamente, considerar que o fabricante deixa de controlar o preço final de venda, ficando por isso dispensado de assumir os custos e riscos comerciais e financeiros”, sustenta.
“Na ausência de uma efetiva possibilidade de os ‘agentes’ abdicarem de uma parte significativa da sua comissão, há o risco de as autoridades da concorrência considerarem que existe, de facto, uma imposição do preço de revenda, uma prática proibida no âmbito da atual ‘Block Exemption Regulation’ e que continuará a sê-lo no futuro, aquando da revisão deste regulamento”, sustenta.
Quanto aos contratos de agência, o CECRA clarifica que, “se as responsabilidades do agente ultrapassarem um risco financeiro e de investimento ‘insignificante’, perde-se a isenção face ao direito da concorrência” e passa a estar-se perante um contrato de agência “não genuíno”, em que “o produtor não está autorizado a definir o preço para o cliente final”. Neste contexto, o organismo europeu alerta para a obrigação de cumprimento das regras da concorrência aquando da celebração destes contratos.
No comunicado que emitiu, a ARAN reitera que, “no âmbito do contrato de agência, quando há transferência de riscos financeiros e de investimento para os concessionários, mesmo que insignificantes, os fabricantes não podem fixar preços, por tal prática ser suscetível de violar as regras da concorrência”. Conforme salienta, “este sistema de ‘falsos’ contratos de agência não é aceitável, nem viável, e apresenta sérios riscos tanto para os fabricantes, como para os distribuidores, designadamente no âmbito contraordenacional”.
“Considera o CECRA, e também a ARAN, que os modelos de negócio devem pugnar pela legalidade pela viabilidade económica e não colocar em causa o futuro da distribuição, reparação e manutenção de automóveis”, enfatiza a associação portuguesa. Na mesma linha, o Conselho Europeu do Comércio e Reparação Automóvel diz que, “economicamente, os fabricantes não devem ‘oferecer’ contratos aos seus parceiros quando sabem que o modelo de negócio proposto não é viável.
“O CECRA não se opõe, per se, ao uso de contratos de agência genuínos, que podem ter elementos positivos quer para os fabricantes, quer para os agentes, mas, qualquer que seja o modelo de distribuição escolhido, um aspeto fundamental é que tem de ser um modelo de negócio viável”, remata.