O Bloco de Esquerda vai reunir a sua direção alargada — a Mesa Nacional — neste sábado, incluindo um ponto na ordem de trabalhos que é menos habitual: a discussão e decisão sobre as “comissões de inquérito” internas do partido. Em causa, apurou o Observador, está a suspensão de um militante e a expulsão de outros cinco.
Os processos, que deram entrada na Comissão de Direitos do partido, responsável pela produção dos relatórios que serão agora analisados pela Mesa Nacional, têm origens — também temporais — e consequências diferentes. Um deles envolve José Soeiro, que terá sido, segundo a informação confirmada por várias fontes ao Observador, ameaçado fisicamente por António Soares da Luz, militante do Porto e membro destacado da maior corrente crítica da direção, a Convergência.
Segundo os relatos feitos ao Observador, o caso aconteceu durante uma reunião da distrital do Porto, de que ambos fazem parte, em 2020. Depois de Soeiro fazer uma intervenção sobre Trabalho e de ter feito um aparte dirigido a Soares da Luz, o militante irritou-se com o deputado, tendo mesmo chegado a insultar e ameaçar Soeiro com “um par de estalos”.
A distrital do Porto avançou com a queixa contra Soares da Luz na Comissão de Direitos, sendo que o militante terá assumido que as expressões que usou não eram “formas de debate político” corretas, mas a decisão será mesmo de suspender os seus direitos no partido por seis meses, conforme o relatório que vai chegar à Mesa Nacional.
Entre os outros casos em que a decisão deverá mesmo pender para a expulsão, encontram-se os de vários militantes que apoiaram, foram candidatos em listas de outros partidos nas eleições autárquicas ou até, segundo a versão da Comissão de Direitos, negociaram com outros partidos contra o Bloco.
Embora no lote de militantes sancionados apenas dois façam parte da Convergência, nessa corrente há quem associe os processos a um castigo contra quem tem opiniões diferentes — não necessariamente inserido na Convergência — da direção do partido. Mas a cúpula contrapõe: em todos os casos existiu violação dos estatutos — cuja aplicação por “motivos de diferenças de opinião política” é proibida — e até existe o caso de um militante que se mostrou favorável à moção apresentada pela linha maioritária na última convenção, no ano passado.
Os processos foram enviados para os visados por carta registada, assegura a direção, embora o resto dos membros da Mesa Nacional e da Comissão Política não tenha acesso a eles — serão disponibilizados num dossiê físico na reunião deste sábado.
Segundo os estatutos, aos militantes do Bloco podem ser aplicadas três sanções: uma advertência, uma suspensão de direitos no partido até ao período de um ano (que é automática e provisória quando um membro se candidata nas listas de outro partido) e, por fim, a “exclusão”. Os militantes podem ainda recorrer da decisão que sair da Mesa Nacional para a Comissão de Direitos.
Críticos voltam a tentar forçar convenção
Na ordem de trabalhos do encontro foi ainda, a posteriori, incluído mais um ponto: a proposta de convocação de uma nova convenção nacional, que corresponde ao esforço dos críticos — já gorado em duas votações anteriores, na Comissão Política e na Conferência Nacional do partido — de antecipar a convenção (equivalente a congresso) do partido, que só está prevista para 2023.
Na proposta apresentada por mais de 200 militantes bloquistas — um número de assinaturas suficiente para obrigar a que a discussão aconteça — insiste-se que é preciso “retirar lições de forma consequente” da derrota expressiva nas eleições legislativas de janeiro e definir “uma nova orientação política” para o Bloco. O único órgão capaz de o fazer, e com legitimidade para isso, insistem, é a Convenção Nacional, e deve fazê-lo no “mais curto espaço de tempo possível”.
Para a direção, uma forma de questionar a liderança de Catarina Martins, uma vez que só numa Convenção se pode eleger novos órgãos para o partido, e por isso foi marcada ao invés disso uma Conferência Nacional; para os críticos, essa Conferência não passou de uma maneira de evitar o problema e não discutir as falhas desta liderança. O assunto chegará, assim, à Mesa Nacional, mas dada a representação minoritária dos críticos não deverá ter mais sucesso do que nas tentativas anteriores.
A resolução bloquista, apurou o Observador, deverá ainda tratar de estabelecer a posição do partido em relação ao Orçamento do Estado que está em discussão no Parlamento, e contra o qual o Bloco se tem posicionado; e reafirmar o posicionamento relativo à guerra na Ucrânia.