O Conselho das Finanças Públicas (CFP) considera que o Governo deve ponderar “alterar de forma permanente” a regra da atualização extraordinária das pensões, que tem aplicado desde 2017, embora não seja a isso obrigado pela lei. É que, para a entidade liderada por Nazaré Costa Cabral, é “sempre preferível” para a gestão e sustentabilidade da Segurança Social ter um “quadro legislativo estável” do que depender da vontade do Executivo a cada ano. Além de que a subida extra pode “afastar a fundamentação inerente” à regra dos aumento automáticos, já previstos na lei.

Desde 2017 que o Governo tem aplicado um aumento extraordinário das pensões mais baixas (inicialmente, apenas para aquelas pensões que não tinham sido atualizadas durante a troika, mas a partir de 2021 aplicando-se a todas as de menor valor). Só que a lei não obriga o Governo a esta subida extra (apenas ao aumento automático, com base na inflação e no crescimento económico), o que deixa a decisão de subir ou não extraordinariamente as pensões mais baixas à mercê da vontade do Executivo.

Essa falta de previsibilidade, com “intervenções discricionárias e casuísticas do decisor político” é, para o CFP, prejudicial para a gestão financeira do sistema da Segurança Social. Por isso, sugere que o Governo pondere “até que ponto não faria sentido alterar de forma permanente a regra da atualização destas pensões de montante mais baixo (até 1,5 IAS)”.

“Em 2021, o valor da parcela de atualização extraordinária de pensões do Sistema Previdencial de Repartição ascendeu a 504,6 M€ incidindo sobre as pensões de montantes mais baixos (até 1,5 IAS ou seja 658,20€)”, aponta o CFP, num relatório sobre a Evolução Orçamental da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações em 2021, que acrescenta: “Esta atualização extraordinária tem vindo a ser aplicada de forma recorrente desde 2017, o que não pode deixar de suscitar a questão de saber até que ponto não faria sentido alterar de forma permanente a regra de atualização destas pensões de montante mais baixo (até 1,5 IAS)”.

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“Na verdade, por razões de previsibilidade na gestão financeira do sistema de Segurança Social, até como salvaguarda da sua sustentabilidade, será sempre preferível contar com um quadro legislativo estável, com regras de aplicação objetiva e automática, do que com intervenções discricionárias e casuísticas do decisor político que, no limite, podem pôr em causa a filosofia e os objetivos últimos do quadro legal existente“, indica.

É que, numa nota de rodapé, o CFP diz mesmo que a atualização extraordinária pode deixar de justificar uma atualização automática, com base na inflação e no crescimento económico. “Esta atualização extraordinária ao ter um cariz social relevante por beneficiar as pensões mais baixas pode afastar a fundamentação inerente à criação da regra de atualização regular das pensões. Esta última tem como objetivo a ligação da evolução das pensões às contingências económicas (v.g. crescimento do PIB real e inflação), verificando-se uma diferenciação do valor da atualização em função do seu montante”, lê-se.

O CFP nota ainda que há uma discrepância entre o previsto e o efetivamente gasto com o aumento extra das pensões. “A atualização extraordinária das pensões e complemento tem vindo a aumentar o seu peso na despesa efetiva: em 2017, primeiro ano de implementação, ascendeu a 77 M€; em 2018 mais do que duplicou atingindo 207 M€; e em 2019 e 2020 situou-se nos 338 M€ e 449 M€, respetivamente”, começa por dizer. Em 2021, “registou-se o maior aumento, com um crescimento de 298 M€ (+66,4%), representando 747 M€“, no valor total acumulado. Mas no Orçamento da Segurança Social para 2021 “estava previsto o valor de 547 M€, o que se traduziria num incremento de 99 M€ (+21,9%) face a 2020″.

Além disso, indica o CFP, o Governo não transferiu para a Segurança Social tudo o que devia ter transferido pela perda de receita com a isenção da Taxa Social Única (TSU) aplicada em 2021 para fazer face à pandemia.

No relatório, escreve que, em 2021, tal como aconteceu em 2020, houve uma “perda de receita contributiva decorrente da isenção de pagamento da Taxa Social Única (TSU)”, que atingiu 226 milhões de euros no ano passado (tinha sido 549 milhões em 2020).

A lei define que esta perda de receita, assim como qualquer despesa adicional que resulte dos apoios atribuídos no âmbito da pandemia, deve ser financiada por uma transferência extraordinária do Orçamento do Estado, para não colocar em causa a sustentabilidade da Segurança Social. Mas, “apesar dessa perda ter sido de 226 M€, apenas foi efetuada uma transferência do OE para a Segurança Social no montante de 71 M€”, diz o CFP.