O despacho do primeiro-ministro sobre a Endesa apresentou-se com o objetivo de “condicionar o pagamento de faturas emitidas” pela elétrica espanhola pelos serviços da administração direta e indireta do Estado. No entanto, a intenção é apenas “preventiva”, salvaguarda fonte oficial de São Bento. Esta quarta-feira, numa resposta enviada ao Observador a propósito das dúvidas legais levantadas por especialistas, o gabinete do primeiro-ministro veio garantir que “não há alteração ao que está contratado”. O objetivo do despacho é sobretudo dar um sinal a empresas para que verifiquem as faturas da Endesa, tal como o Estado fará a partir de agora.

Ao Observador, o gabinete de Costa diz que “há uma mudança no que respeita ao procedimento interno de validação de pagamento, preventivo face a eventuais práticas especulativas”. Esta hipótese materializou-se, no entendimento do Governo, depois de o presidente da Endesa, Nuno Ribeiro da Silva, ter vindo estimar um aumento “na ordem dos 40%  ou mais” nas faturas de julho e agosto dos consumidores de eletricidade por conta da aplicação do Mecanismo Ibérico que colocou um travão ao preço do gás natural usado para a produção de eletricidade.

A entrevista de Ribeiro da Silva teve como primeiras reações um desmentido do Ministério do Ambiente, a garantia da ERSE, a reguladora da energia, de estar atenta ao comportamento dos comercializadores de eletricidade e um aparente recuo do próprio presidente da Endesa. Através de comunicado, a elétrica veio jurar o cumprimento dos contratos.

No entanto, o texto foi visto como insuficiente dentro do Governo já que a Endesa apenas dava garantias de “manter os preços contratuais com os seus clientes residenciais em Portugal até ao final do ano”. Os clientes empresariais e industriais não eram referidos. “A empresa apenas fez referência, no seu comunicado, ao setor residencial“, notou-se no Governo.

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É aqui que surge o despacho que especialistas contactados pelo Observador consideraram levantar algumas dúvidas legais. Não tanto pelo procedimento interno criado (o visto prévio dos pagamentos pelo secretário de Estado João Galamba), mas pelo efeito que produz, ao introduzir uma nova regra a meio de um contrato e ao pagamento de serviços já prestados. Um dos especialistas apontava mesmo a importância de não serem prejudicados “prazos contratuais.”

O primeiro-ministro não concorda com esta interpretação e garante agora que nada disto implica alterações ao que está contratado. A decisão vai sobretudo no sentido de prevenir comportamentos abusivos da Endesa em particular, sendo que a expectativa do Governo é que “o regulador e todos os clientes adotem mecanismos para verificar as suas faturas” de serviços prestados pela empresa, comenta ao Observador um membro do Executivo.

O Mecanismo Ibérico está longe de ser pacífico e o grupo parlamentar do PSD pediu esta quarta-feira que a ERSE analise este instrumento “explicando e fundamentando os respetivos pressupostos que quanto à evolução de preços e outros fatores devem basear-se nas melhores práticas e informação disponível e serem adequadas às condições e estrutura específicas do mercado português”.

Temem-se os impactos que a aplicação do Mecanismo possa ter na fatura da eletricidade, por via da compensação às centrais a gás pelo teto do preço imposto no mercado ibérico desde junho”. A ERSE já veio garantir que “serão sobretudo as empresas industriais que vão ser chamadas a pagar” essa mesma compensação.

Despacho de Costa sobre Endesa levanta dúvidas legais