Uma imagem de desleixo e de descuido. Para Luis Marques Mendes, que falava no seu habitual comentário televisivo na SIC Notícias, é isto que os portugueses retêm dos últimos casos de incompatibilidades de ministros, o mais recente, de Pedro Nuno Santos, revelado pelo Observador. Embora considere que a incompatibilidade gerada pela sua sociedade (e pela quota que detém nela), não tenha uma importância maior, considera que se, ao entrar no Governo, o ministro tivesse deixado de ser sócio-gerente, o caso não tinha existido. “É descuido.”
Lembrando o parecer em que o Governo se escuda para dizer que não há incompatibilidade, Marques Mendes lembra — como é explicado na notícia do Observador — que a lei foi, desde então, alterada. “Para ser coerente, o Governo devia pedir novo parecer da PGR ou uma atualização do parecer anterior.”
Assim, considera que este caso, somado ao do ministro Manuel Pizarro e ao da ministra Ana Abrunhosa, “todos em conjunto, dão uma imagem pública muito negativa: negativa para o Governo e negativa para os políticos em geral”.
Acordo na concertação social: grande vitória de Costa
Sobre o acordo na concertação social anunciado no sábado e assinado este domingo, Marques Mendes considera que politicamente é bom para o país e para o Governo. “Em tempo de crise, de guerra, de grande ansiedade e incerteza, um acordo como este gera confiança na sociedade, até porque é um acordo plurianual.” Além disso, frisou, nos primeiros seis meses de mandato, “tudo tem corrido mal ao Governo” e “esta é a primeira grande vitória de António Costa”. Dá-lhe credibilidade, mostra abertura ao diálogo por parte da maioria absoluta e ajuda à paz social, defendeu o comentador.
Apesar disso, Marques Mendes considera que em termos económicos, no plano da competitividade, nada muda. “Falta-lhe ambição. Nada muda em termos estruturais. Quando crescermos, vamos continuar a crescer abaixo dos nossos concorrentes diretos, os Países do Leste. Mas é melhor ter acordo do que não ter.”
OE2023: arriscado e irrealista
Em tempo de guerra, diz Marques Mendes, este “é o Orçamento do Estado de maior incerteza de que temos memória”. Mais: “é prudente e positivo no défice e na dívida”; “arriscado na meta para o PIB”; “irrealista na previsão da inflação” e “arriscadíssimo no investimento, que o governo considera vir a ser o motor do crescimento em 2023”.
Como pontos positivos, destaca a redução do défice para 0,9% do PIB, a redução da dívida para 110,8% do PIB, a estabilização da taxa de desemprego, o aumento do salário mínimo nacional e a atualização dos escalões de IRS.
“Nas circunstâncias em que estamos a viver, tão importante quanto ter um OE prudente é falar verdade às pessoas, ao contrário do que sucedeu nas pensões. A verdade, mesmo desconfortável, é sempre melhor que a ilusão”, completou.
Apoios sociais: já vêm tarde, mas são indispensáveis
Marques Mendes lembra também que começam nesta semana a ser pagos os apoios aos pensionistas e às famílias por causa da inflação: “Já vêm tarde, mas são indispensáveis por uma razão social, por um imperativo de combate à pobreza e por uma razão política.”
O comentador lembra que proteger “os mais frágeis da sociedade” é fundamental, até porque “a vida das famílias mais pobres é um drama”, numa altura em que os preços do cabaz de compras se mantém em subida e se vive uma crise energética.
“Além destas razões sociais, há também uma razão política que justifica estes apoios: evitar radicalismos e populismos na sociedade. Só há uma forma de o conseguir: promovendo a coesão social. Em tempo de crise e de guerra mais se justifica um apelo à consciência social e à solidariedade coletiva”, defendeu.
Salários. Provavelmente não havia alternativa
Comentando os aumentos previstos para a função pública, e a nova perda de poder de compra, Marques Mendes disse que a isto se chama austeridade. “Provavelmente por razões orçamentais não havia alternativa. O Estado tem limitações financeiras, por causa do défice e da dívida. E duvido que outro governo atuasse de forma muito diferente.”
Ainda assim, os problemas existem e vai afetar sobretudo os quadros mais qualificados da função pública — médicos e professores — que poderão fugir para o setor privado. “Perde a Administração Pública e perde o país.”
O segundo problema está relacionado com António Costa: “Quando chegou ao poder, prometeu acabar com a austeridade. Chegou mesmo a dizer que essa foi uma opção do governo de Passos Coelho. Ora, como se vê, está a quebrar essa promessa. É o que sucede quando se fazem discursos demagógicos. A austeridade não é uma escolha dos governos. Ninguém aplica austeridade por prazer. Aplica-se austeridade por necessidade, não por opção.”