Enviado especial do Observador em Doha, no Qatar

Não é muito normal mas explica também a dimensão deste Mundial e também de Doha. Sim, nesta fase só sobram oito equipas na competição mas antes três quartos das 32 seleções estavam concentradas num raio de apenas dez quilómetros. Também por isso, a Universidade do Qatar, com vários relvados disponíveis, foi a escolha de algumas seleções para fazer a sua preparação. Foi o caso dos Países Baixos, que todos os dias fazem a viagem do The St. Regis Hotel (uma unidade com várias referências a seleções passadas do país com 335 quartos e uma piscina de tamanho olímpico) até ao Qatar University Training Site 6 para preparar uma caminhada que já vai nos quartos. Segue-se a Argentina. Seguiu-se uma visita ao reino de Louis van Gaal.

Com um circuito de entradas e saídas do complexo que faz com que algumas portas que antes iam estando abertas se encontrem agora fechadas a cadeado, é fácil perceber onde andam os neerlandeses pela placa logo na entrada que diz “Welcome” (a laranja, como não poderia deixar de ser). Dá quase aquela sensação de um conforto prévio antes de entrar nas instalações, com os habituais detetores de metais, a nuance de aqui ser necessário mostrar o computador ligado e um pequeno trajeto ziguezagueante até à sala que tem recebido as conferências de imprensa de jogadores e treinador sem ser em véspera de jogo. Desta vez, e na antecâmara de um duelo com Messi e companhia, Virgil van Dijk é um dos elementos enquanto jogador mais consagrado e Andries Noppert que veste a pele de guarda-redes sensação da equipa e da prova.

“Desculpem, terão de ter alguma paciência, mas vamos ter perguntas e respostas em neerlandês e depois há a possibilidade de perguntarem e ouvirem respostas em inglês”, explicou o descontraído assessor no início de uma conferência que durante uns três/quatro minutos mais parecia uma entrevista conjunta mas apenas com o jornalista da cadeia neerlandesa NOS a assumir o microfone da sala que agarra em conjunto com o da sua cadeia. Perguntas curtas, respostas curtas entre sorrisos, a perceção de que se está a falar de Argentina, de Messi e algures de Neymar entre o neerlandês que não é bem a nossa praia. Depois, questões em inglês e as opiniões de um dos protagonistas de um duelos com mais história nestes quartos.

“Não existe uma motivação extra pelo passado recente com eles, são os quartos do Mundial e só por isso não necessitamos disso. Sentimento de vingança não, apenas a vontade de mostrar a nossa qualidade, o ponto onde estamos e seguir para a próxima fase. Messi? É talvez um dos melhores de todos os tempos, ele e o Cristiano Ronaldo dominaram durante duas décadas. Mas não temos de estar apenas preparados para ele mas sim para toda a Argentina. Todos sabem a sua responsabilidade e o que têm de fazer. Pressão de pela primeira vez ganharmos? Não, há vontade, há sonhos, há essa perceção de que pode acontecer. Estamos a três jogos da glória”, refere Van Dijk, sempre naquela postura muito chill e descontraída.

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“Importância de Van Gaal e a dança na chegada ao hotel após o jogo dos EUA? O que se pode ver nas imagens é aquilo que ele é, alguém com uma paixão enorme, envolvido, preocupado com todos os detalhes e de quem gostamos. Grande parte do crédito de tudo isto é dele e esperamos que este espírito bom continue. Sobre a dança foi uma comunhão com uma série de pessoas que estão no nosso hotel e que também acabam por fazer parte do nosso sucesso. Que continue assim, todos contentes”, acrescentou o central.

Já Andries Noppert, grande surpresa da equipa ao ser lançado ainda sem internacionalizações no arranque do Campeonato do Mundo numa história típica de grande prova pelo facto de jogar na 2.ª Divisão apenas há dois anos (durante a carreira jogou em Heerenveen, NAC Breda, Foggia, Dordrecht onde estava em 2020,  Go Ahead Eagles antes do regresso esta temporada ao Heerenveen), elogiou também um dos segredos de Van Gaal. “Defesa mais forte? Para mim todos os jogos são iguais, tenho a melhor defesa à minha frente e só quero jogar fogos. O nosso treinador tem uma parte importante, que é colocar os jogadores que não jogam preparados para entrar e a treinar para isso. Mais pressão por nunca termos ganho? Nada, nenhuma. Vim para cá com um objetivo que é ser campeão e é isso que quero”, salientou o gigante guardião. “Ser titular agora? Quando és pequeno sonhas tudo, eu também sonhava. Cheguei a achar que não iria ser possível mas continuei e estou muito orgulho por isso. Defender um penálti de Messi? Tudo depende do momento e de estarmos bem preparados mas ele é humano como todos nós”, destacou ainda o gigante guardião.

Enquanto a conferência decorria, o assessor ia colocando umas achegas à mistura. Por exemplo, quando fez uma questão a um jornalista inglês perguntando como estava o material de vídeo e câmara que uns dias antes estava partido ou como quando pediu desculpa porque o microfone demorava bastante em algumas alturas a chegar a outra pessoa.  O treino era à porta fechada, a saída estava para a acontecer, uma história diferente ia chegar. E de bem longe, da Índia, onde o futebol é curto ainda mas a paixão dos adeptos pelas principais referências a nível Mundial é bem visível e numa viagem de Uber tornar-se ainda maior.

Kothamangalam, um município de Kerala, organiza falanges de apoio às suas principais referências e Ronaldo tem a maior figura. Jayesh mostra-nos o vídeo o making off da grande figura que têm do capitão de Portugal, com uma imagem gigante com pelo menos dez metros tirada no dia em que ganhou o Campeonato da Europa de 2016. “As pessoas ficaram tristes por não ter jogado de início mas perceberam e depois só ficam à espera que ele entre. Os adeptos indianos são fanáticos por futebol, mesmo não tendo uma seleção no Mundial, e Ronaldo é aquele que as pessoas mais gostam a par do Messi e do Neymar. São muitas comunidades de adeptos mas a maior é a de Portugal, depois Argentina e Brasil”, conta. Do nada, num dia de conferência dos Países Baixos, houve Ronaldo antes, durante e depois. Assim vai o Mundial.