O Plano Geral de Drenagem de Lisboa (PGDL) tem sido apontado, desde há duas décadas, como uma obra importante para enfrentar cheias e inundações na capital, mas as grandes intervenções, nomeadamente a construção de túneis, só arrancaram este ano.

“Nós não evitamos cheias. Temos é de estar preparados para elas“, disse, em outubro de 2002, o então vice-presidente da Câmara de Lisboa, António Carmona Rodrigues (independente, apoiado pelo PSD), referindo que o município estava a preparar um plano para minimizar os efeitos das cheias na capital.

Entre 2002 e este ano, precisamente duas décadas, o município Lisboa contou com seis presidentes de câmara — Pedro Santana Lopes (PSD), António Carmona Rodrigues (independente, apoiado pelo PSD), Marina Ferreira (PSD), António Costa (PS), Fernando Medina (PS) e Carlos Moedas (PSD) –, sempre alternando entre PSD e PS, mas com os socialistas a governarem durante 14 destes últimos 20 anos.

Em fevereiro de 2006, enquanto presidente da Câmara de Lisboa, Carmona Rodrigues anunciou a elaboração de um plano de drenagem, para melhorar a gestão das redes de esgotos e minimizar problemas como as inundações e a poluição, e que seria o primeiro plano geral de saneamento da capital dos então últimos 40 anos, depois dos estudos de Arantes e Oliveira, em 1941, e Pedro Celestino da Costa, em 1955.

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Em 2008, sob a presidência de António Costa (PS), a Câmara de Lisboa começou a discutir um plano de drenagem, com um estudo que apontava para a construção de quatro grandes reservatórios e de um túnel entre a Almirante Reis e Santa Apolónia, classificando como “prioritárias” as intervenções na zona de Alcântara, uma área da cidade particularmente afetada pelas cheias.

Em outubro de 2010, depois da ocorrência de inundações na cidade, o PSD acusou o socialista António Costa de “não considerar as obras no saneamento de Lisboa uma prioridade” e exigiu a implementação “urgente” do Plano Geral de Drenagem, recordando que o mesmo foi pedido em 2006, quando a autarquia era liderada pelo PSD, e a elaboração ficou concluída em 2008.

Nessa altura, António Costa justificou o atraso na implementação do plano de drenagem com a falta de condições da câmara para assegurar o investimento de 160 milhões de euros.

Três anos depois, em 2013, na altura da campanha para as eleições autárquicas desse ano, o socialista disse que é “preciso executar” o Plano Geral de Drenagem, “não tanto por causa das cheias” — que o autarca considerou não terem causado “problemas graves” nos últimos anos — mas pela “gestão mais ecológica e eficiente” da água.

Depois de reeleito no cargo de presidente da câmara, em 2014, António Costa admitiu recorrer ao Fundo de Coesão para financiar o plano de drenagem, que envolveria um investimento de 160 milhões de euros. Nesse mesmo ano, em outubro, houve inundações na cidade e, em resposta às críticas da oposição, o socialista afirmou: “O plano de drenagem não faz desaparecer estas situações. A solução não existe“.

Em julho de 2015, com Fernando Medina (PS) na presidência da câmara, foi apresentado o Plano Geral de Drenagem de Lisboa 2016-2030, com o objetivo de construir, até 2019, dois túneis, um entre Santa Apolónia e Monsanto e outro entre Chelas e o Beato, para combater as inundações na cidade, num investimento de 170 milhões de euros.

Depois da discussão de como financiar a obra sem fundos da União Europeia, a alteração do investimento e o lançamento de concursos públicos para a implementação do plano de drenagem, a câmara aprovou, em 2017, a contratação de um empréstimo de 100 milhões de euros junto do Banco Europeu de Investimento (BEI), o primeiro de um total de 250 milhões de euros.

O engenheiro José Silva Ferreira, coordenador do projeto para o plano de drenagem de Lisboa, disse, em fevereiro de 2019, que as obras deveriam começar no primeiro semestre de 2020, e, em setembro de 2019, estimou que os túneis entre Monsanto e Santa Apolónia e entre Chelas e o Beato deveriam estar concluídos em 2024.

Em dezembro de 2020, a Câmara de Lisboa aprovou a adjudicação da empreitada de construção dos dois túneis, no valor de cerca de 133 milhões de euros.

Depois das eleições autárquicas de 2021, em que Carlos Moedas (PS) venceu a presidência da Câmara de Lisboa, o executivo municipal começou a requerer ao Governo a declaração de utilidade pública, “com caráter de urgência“, da expropriação de imóveis e da constituição de servidões administrativas, para a implementação do Plano Geral de Drenagem 2016-2030.

Em julho deste ano, a autarquia viabilizou a contratação, junto do BEI, de um empréstimo de até 90 milhões de euros, que será a última parcela de um empréstimo-quadro de 250 milhões de euros.

Posteriormente, a câmara informou que as obras para a construção dos dois túneis deveriam começar em setembro, na zona de Campolide, sem indicar datas concretas, mas antecipando condicionamentos no trânsito.

As inundações registadas na noite desta quarta-feira na cidade de Lisboa, em particular na zona de Alcântara, Baixa, Campo Grande, Campo Pequeno e Benfica, voltaram a trazer ao de cima a importância da concretização do plano de drenagem, com o presidente da câmara, Carlos Moedas, a prometer a construção dos dois túneis até 2025, considerando que, se a empreitada já tivesse feita, as situações de cheias registadas não teriam acontecido.

Com o período de execução 2016-2030 e um investimento total de cerca de 250 milhões de euros, o Plano Geral de Drenagem de Lisboa (PGDL) é “a obra invisível” que vai proteger a cidade para os impactos das alterações climáticas, nomeadamente para evitar cheias e inundações; permitir a reutilização de águas para alimentar e reforçar a rede de rega de espaços verdes, a lavagem de ruas e as redes de combate a incêndios; e diminuir a fatura da água potável.

Considerada a obra municipal de maior envergadura alguma vez levada a cabo pela Câmara de Lisboa, o PGDL prevê a construção de dois grandes túneis de drenagem para transvase de bacias, numa empreitada que custará “cerca de 133 milhões de euros” e que se prevê concluída no início de 2025.

Um dos túneis começa em Campolide (na Quinta José Pinto) e sai em Santa Apolónia, com uma extensão de cerca de cinco quilómetros, e o outro será construído a partir do Beato, na Avenida Infante D. Henrique (perto da Rua do Açúcar), até Chelas (perto do Convento de Chelas), com uma extensão de um quilómetro.

Esta obra terá sete estaleiros – Campolide, Avenida da Liberdade, Rua de Santa Marta/Barata Salgueiro, Avenida Almirante Reis/Rua Antero de Quental, Santa Apolónia, Chelas e Beato – e “apresentará condicionamentos à superfície“, avisou a autarquia, afirmando que estão a ser analisadas várias formas de mitigar os impactos.

“Dada a complexidade, extensão e natureza da obra, foram garantidas as condições possíveis em termos de condicionamentos, mantendo circuitos pedonais, acessibilidades, mobilidade suave, assim como foram atenuados os impactes no trânsito da cidade, em particular garantindo condições de operação aos transportes públicos (em estreita ligação com a Carris), corredores de emergência e de socorro (em estreita articulação com a Polícia Municipal)”, assegurou.

Relativamente aos constrangimentos para os moradores, a câmara tentou reduzir “ao mínimo possível” a retirada de lugares de estacionamento, procurando assegurar os acessos a garagens e a manutenção de lugares na via pública, mas está ainda a estudar outros locais para estacionamento, em articulação com a empresa municipal EMEL.

Quanto aos comerciantes e lojistas das zonas afetadas, estão a ser estudados mecanismos de compensação que poderão passar pela “isenção de taxas de ocupação de via pública, isenções de outras taxas municipais e mecanismos indemnizatórios por comprovada perda de receitas diretamente associada à presença do estaleiro”.

Esse trabalho está a ser feito ligação com a União de Associações do Comércio e Serviços (UACS) e a Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP).

Questionada sobre os impactes da perfuração nos edifícios à superfície, inclusive prédios de habitação, a Câmara de Lisboa, presidida por Carlos Moedas (PSD), explicou que a tuneladora opera a uma profundidade média de 30 a 40 metros e “não se prevê a existência de qualquer dano em qualquer imóvel“. Os estes trabalhos são acompanhados pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC).

Além disso, a equipa do projeto do PGDL, liderada pelo engenheiro Silva Ferreira (que foi também o coordenador municipal da obra do Túnel do Marquês), promoveu vistorias “a cerca de 3.900 frações habitacionais”, numa extensão de 30 metros para cada lado a partir do eixo de cada túnel.

A construção dos dois túneis será feita com a tuneladora H2OLisboa, fabricada na China, que tem 130 metros de comprimento e “avança cerca de 10 metros por dia”, de acordo com informação disponibilizada no “site” https://planodrenagem.lisboa.pt/.