O Tribunal da Relação de Lisboa deu razão a Duarte Lima e decidiu afastar do processo a juíza que o ia julgar pelo crime de homicídio de Rosalina Ribeiro, antiga secretária e companheira do milionário Tomé Feteira. O arranque do julgamento chegou a estar marcado, mas acabou adiado três vezes. Agora o Tribunal de Sintra terá que atribuir o processo a outro juiz e só depois será marcada nova data.

A decisão foi tomada esta terça-feira e confirmada ao Observador por fonte do processo. O advogado de Duarte Lima, João Barroso Neto, tinha alegado no seu pedido de recusa a parcialidade da juíza Catarina Pires, que, do seu ponto de vista, já tinha emitido juízos de valor “pré-condenatórios” quando aplicou as medidas de coação ao antigo deputado. E terá mesmo analisado, lido e valorado “depoimentos à margem do que é permitido num juiz de julgamento”.

O acórdão da Relação, a que o Observador teve acesso, sublinha que, antes, os motivos para afastar um juiz baseavam-se nas relações de parentesco ou de inimizade entre magistrado e parente do assistente, ofendido ou arguido. Mas que perante a atual lei, uma das causas de desconfiança da imparcialidade de um juiz pode assentar mesmo nas “atitudes dos magistrados reveladoras de prejuízos sobre a culpabilidade do arguido”, que possam ser manifestadas ao longo do processo.

Olhando para o caso em concreto, os juízes desembargadores não encontraram qualquer problema na intervenção da juíza na aplicação de medidas de coação, uma vez que o processo já lhe tinha sido atribuído para julgamento, — e  Catarina Pires não tinha tido qualquer intervenção antes. O problema está no que disse quando o fez.

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“A senhora juíza, a propósito da aplicação de uma medida coativa, num tempo muito próximo do julgamento agendado, acaba por operar uma leitura crítica da indiciação dos factos a apreciar, por referência a uma prova” que ainda teria que ser produzida e apreciada em julgamento, considerou a Relação. Afirmações que poderão gerar dúvidas “sobre a sua imparcialidade externa”.

“No fundo, a sua leitura sobre o mérito de uma parte relevante da matéria da causa está já adiantada, bem como a sua eventual posição sobre a mesma”, concluiu-se.

Decisão não foi unânime

A decisão do Tribunal da Relação foi assinada a 10 de fevereiro pelos juízes desembargadores Luís Almeida Gominho, Jorge Gonçalves e Maria José Machado. Mas Jorge Gonçalves acrescentou-lhe uma declaração de voto.

O desembargador concorda com a decisão tomada, por não deverem ser emitidos juízos de valor sobre os indícios, no entanto discorda de parte da análise feita. É que, sustenta, a intervenção de Catarina Pires no processo para avaliação de medidas de coação não foi feita nas normais condições de avaliação de uma medida. Foi feita, sim, já na fase de julgamento, mas no âmbito da cooperação internacional: o processo foi investigado no Brasil e Duarte Lima foi ali acusado e foi depois entregue a Portugal. O que implica uma análise diferente.

Ainda assim, o magistrado não deixa de concordar com a recusa.

Juíza já tinha pedido para não julgar o caso

A intervenção da magistrada no processo já tinha sido, aliás, um argumento da própria juíza para pedir escusa e não julgar o caso. O Tribunal da Relação, que agora deu razão a Duarte Lima, considerou no entanto que a magistrada devia continuar no caso até porque a sua intervenção tinha sido já em fase de julgamento, num processo que já lhe tinha sido atribuído. Diferente podia ser se tivesse tido uma intervenção em fase anterior.

No requerimento feito ao tribunal superior, tal como então o Observador noticiou, a defesa recordou algumas expressões usadas pela juíza como: “explicações falsas”, “a certeza, aliás a forte indiciação”, “eu prevejo que a decisão seja uma condenação”, que mostravam que a sua convicção era que a de Duarte Lima acabaria condenado pelo crime que lhe era imputado.

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Julgamento foi adiado três vezes e agora terá que ser remarcado

O julgamento chegou a estar marcado mas foi adiado três vezes, a última há cerca de um mês por causa do pedido de afastamento da juíza por parte de Duarte Lima. Os outros dois adiamentos prenderam-se com o argumento de que o tribunal não conseguia notificar as testemunhas no estrangeiro, até que recentemente o comissário da polícia, que seria ouvido esta quarta-feira, disponibilizou-se perante o tribunal português para ajudar a notificar as testemunhas e forneceu a própria morada e a do colega de trabalho.

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Sem julgamento marcado, a juíza decidiu porém marcar duas audições para memória futura antes de agendar as sessões. A ideia era que o comissário da polícia brasileira, Aurílio Nascimento, que investigou o crime no Brasil e apontou o dedo a Duarte Lima, prestasse declarações que depois servissem para o julgamento. Seria também ouvido o gestor de fortunas Michel Canals, a partir da Suíça, por causa dos movimentos financeiros na conta do antigo político e advogado de Rosalina, Duarte Lima. Estas diligências foram marcadas depois de informações de que algumas testemunhas arroladas no processo, começado já em 2009, tinham morrido. Uma delas a filha do milionário Lúcio Tomé Feteira, com quem a vítima Rosalina travou uma disputa pela herança do empresário e por causa da qual terá contratado os serviços de advocacia de Duarte Lima.

A acusação diz que o antigo deputado se apoderou de 5 milhões de euros de Rosalina, que recorreu aos seus serviços para resolver uma disputa na herança deixada pelo empresário milionário, Lúcio Tomé Feteira.

O crime aconteceu em dezembro de 2009.

(Artigo atualizado com informações do acórdão da Relação)