Começou com Estrasburgo, Lille e Reims, prosseguiu com Marselha, Bordéus e Nancy. Aos poucos e poucos, várias cidades francesas foram “boicotando” dentro do possível o Campeonato do Mundo no Qatar devido à violação dos direitos humanos no país, vetando no plano local a possibilidade de criação de uma Fan Zone com ecrãs gigantes para transmissão da prova como aconteceu noutros eventos. Uns dias depois, também Paris adotou a mesma medida mas, neste caso, com um outro tipo de reação por parte do organizador do Mundial, pelas ligações estreitas com o principal clube da cidade, o PSG. Ficava à vista outro episódio da guerra fria existente entre as duas partes. Uma guerra que agora aquece todo o espaço público francês.

O início da atual novela em torno do Parque dos Príncipes teve o primeiro grande sinal em duas entrevistas de Nasser Al-Khelaïfi, presidente do clube detido pela Qatar Sports Investment (QSI), à Marca e ao L’Équipe. “Estamos há cinco anos a tentar comprar o estádio. A Câmara sempre nos disse que ia negociar mas só depois da entrada de uma nova direção, depois de um novo presidente… São cinco anos perdidos! Podíamos ter construído um novo estádio. Vejam os outros clubes… Nós precisamos de não sei quantos acordos para poder ampliar o recinto, não avançamos nas negociações. Vou dizer-lhes que vamos embora se não aceitarem a nossa oferta porque nós não ameaçamos, apertamos-lhes a mão e diremos adeus. O Parque dos Príncipes não vai ter qualquer valor sem o PSG”, ameaçou o dirigente quase num tom de ultimato.

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Em paralelo, Al-Khelaïfi criticou de forma aberta um vice-presidente da Câmara liderada por Anne Hidalgo, Emmanuel Gregoire, a propósito de declarações em que dizia que a proposta do PSG tinha o mesmo valor do que a compra do passe do médio argentino Leandro Paredes (40 milhões de euros). “É alguém que fala demais, na cara diz-nos uma coisa e depois aos jornais diz outra. Isso não é aceitável, se há um problema discute-se frente a frente. Se comprarmos o Parque dos Príncipes, claro que vai pertencer ao clube e não ao Qatar, como dizem. Investimos no PSG e o clube é francês, não é qatari. Os jogadores jogam em França. O Chelsea é um clube americano? Aumentámos o valor do campeonato, da cidade, certo?”, defendeu.

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O último fim de semana trouxe mais desenvolvimentos, que mais não foram do que o adensar do braço de ferro entre ambas as partes em torno da propriedade do Parque dos Príncipes: a Câmara não quer vender, o PSG ameaça procurar outras soluções. E David Belliard, também vice-presidente da cidade de Paris, abordou aquilo que descreve como “uma partida de póquer entre mentirosos” em entrevista à RMC Sport.

“Veremos o que acontece nas negociações com a Qatar Sports Investment [QSI]. Não sou a favor de vender ativos importantes ao setor privado e em particular ao Qatar. O Parque dos Príncipes é um deles. Precisamos de ter um certo número de ativos de prestígio. O Parque dos Príncipes não pertence ao Qatar mas sim aos parisienses e, mais amplamente, aos franceses. Quero que continue a fazer parte deste nosso património”, comentou o responsável da Câmara, passando ao lado das ameaças que chegam do PSG.

Temos uma posição muito clara: o Parque dos Príncipes não está à venda e não será vendido. Esta é uma posição firme e definitiva. É uma herança excecional para os parisienses”, salientara este sábado Anne Hidalgo, presidente da Câmara de Paris, em declarações ao jornal Le Parisien.

“É surpreendente e dececionante saber que a presidente de Paris está a assumir uma posição que vai forçar o clube, os nossos adeptos e toda a comunidade a afastar-se do Parque dos Príncipes, acrescentando com isso dezenas de milhões de euros aos encargos dos contribuintes pela manutenção do estádio. É um recinto que tem 50 anos, que precisa ser reformado de forma completa e onde já investimos nos últimos anos cerca de 85 milhões”, referiu fonte oficial do clube à ESPN. A ideia dos proprietários do PSG passava por investir um montante total de mais de 500 milhões de euros para melhorar e aumentar a capacidade.

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Perante as acusações de que Anne Hidalgo está a forçar à mudança de casa do campeão francês (apesar do contrato do aluguer do espaço válido até 2043), os donos do PSG já estudam outras alternativas, a principal das quais o Stade de France que é património estatal e poderia ser negociado. Questão? É também este o recinto que vai receber o atletismo e a cerimónia de encerramento dos Jogos Olímpicos, atual grande foco da cidade de Paris (exemplo prático: as obras de recuperação de Notre Dame estão a acelerar para ser possível a reabertura da Catedral em agosto de 2024), além de ser a casa de todos os encontros da seleção francesa de futebol. Outra possibilidade que iria demorar muito mais é a construção de raiz de um novo estádio com capacidade para 60.000 ou mais espectadores, com Saint-Cloud e Poissy a surgirem como hipóteses.