Este artigo é da responsabilidade da Pal Consulting

Metaverso? “Mais um disparate de ficção científica, que vai desaparecer em breve”, “Vamos lá entrar nisto a fundo para sermos dos primeiros”, “não digo já que não, deixa lá ver até onde isto vai…” e ainda “metaquê?!!!”… estas são as quatro visões principais que podemos encontrar entre os profissionais, quando falamos de “metaverso”.

Estamos escaldados com centenas de (quase) “inovações disruptivas que vão mudar radicalmente a nossa forma de viver”. Enquanto gestores, temos de calibrar muito bem a balança onde se pesa o investimento em inovação versus o retorno expectável. A inovação é algo que, facilmente, cria a falsa noção de importância pela criação da perceção de urgência, não trazendo muitas vezes qualquer benefício, tangível ou intangível para a organização. Por vezes, não há problema nenhum em deixar os concorrentes irem à frente. Evitando, por exemplo, erros, custos de investigação e desenvolvimento e custos de promoção e de educação do mercado. É natural, por isso, que sempre que se “viraliza” um novo conceito, que parece pouco consensual e implica grande investimento, se levantem alguns ceticismos.

Fique claro desde já que esta tecnologia é ainda muito incipiente e que, de momento, apenas pode ser experimentada em ambiente fechado com poucos utilizadores, o que só por si lhe tira grande parte do interesse para o público em geral.

Não podemos, no entanto, esquecer que tantas vezes o “Pedro grita” que um dia o “lobo ataca”. E, nesses casos, temos de estar preparados. Se falarmos de uma concretização de 1 em 100 creio que o metaverso  pode muito bem ser o dia em que o “lobo ataca”, sendo neste caso o lobo uma coisa boa.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Ainda não encontrei uma definição consensual de “metaverso”, por isso criei a minha. Defino-o como: “Um espaço tecnológico que suporta um espaço imaginário, onde o ser humano interage de forma fluida e integrada, com a informação disponível nos sistemas digitais, esbatendo as fronteiras entre o mundo físico e o mundo digital”. Este “metaverso” será tão mais eficiente quanto o ser humano sinta que interage organicamente com ele, perceba os seus objetos como os do mundo real e menos perceba a distinção entre os dois mundos. É a loucura? Talvez. Vejamos.

Embora, por vezes, seja referido como “uma tecnologia”, é uma conjugação de tecnologias onde podemos incluir realidade virtual, realidade aumentada, inteligência artificial, a tecnologia de cloud e muitas outras. A sua conjugação cria uma nova forma de interagir no real (não concordo com a utilização da expressão “uma realidade ou dimensão alternativa” pois, para mim, o mundo e a realidade são o mesmo).  Em súmula, funciona como uma ferramenta onde se otimiza a interação entre 3 entidades: mundo digital, mundo físico e ser humano.

Quase sempre, quando converso sobre este tema, ouço “já tentaram isso com o Second Life e não deu em nada!”. O “Second life” é um ambiente virtual tridimensional, mais próximo de um jogo, uma ferramenta de entretenimento, uma rede social do que uma plataforma de integração universal. Não foi o fenómeno que se pensava, mas por acaso até continua a existir.

Se o tivermos de comparar com alguma coisa terá de ser com a internet em si. Poderá vir a ser uma nova forma de aceder, interagir e disponibilizar informação, de contactar e conviver com pessoas, de trabalhar e comercializar bens e serviços. Um espaço onde nos movimentaremos de forma normal e poderemos interagir em linguagem natural. O metaverso pode absorver toda a internet, passar a ser o sítio por excelência onde executamos todas as atividades do nosso quotidiano, integrando os dois mundos, pode fazer com que a internet seja algo a que acedemos a partir dele.

Negar a probabilidade de desenvolvimento do “metaverso” será muito parecido a negarmos a probabilidade de a internet vir a substituir as listas telefónicas de papel. Por mais incipiente que pareça ao início, vai acabar por se desenvolver. Tal com falamos de Web 2.0 e Web 3.0, fará sentido que esta solução venha a sofrer metamorfoses, Metaverso 1.0, Metaverso 2.0. Não deveremos poder usar a denominação Meta 2.0 porque Mark Zuckerberg já registou a marca.

Segundo a “The economist inteligence unit” prevê-se que os operadores de telecomunicações venham a ser fornecedores de Metaverso e deverão desenvolver as duas tecnologias a do Metaverso e a Web3 em paralelo. Pode parecer estranho mas estas empresas evoluíram de voz fixa para voz móvel, adicionaram, por sua vez, voz sobre IP, imagem, TV e hoje são, acima de tudo, fornecedores de soluções globais de telecomunicações que se baseiam na transmissão de dados a que os clientes acedem a partir de uma panóplia de terminais, sejam eles, smartphones, BOX, POS.

Embora possamos utilizar os atuais gadgets, como o smartphone, vão ter de ser desenvolvidas novos e velhas tecnologias de apoio à imersão, como os óculos VR e toda uma panóplia de sensores, que sejam mais leves económicos e práticos de usar, mais naturais. Penso que a palavra chave para  o sucesso desta tecnologia,  por estranho que pareça é a expressão “natural”: Linguagem natural, movimentação natural, imagem natural, ferramentas que tornem toda a interação mais natural.

Toda a evolução tecnológica nasce de uma necessidade humana e este é mais um dos casos em que somos nós que estamos a “pedir” a sua existência. Os seres humanos têm procurado formas sempre mais naturais de interagir com a tecnologia de forma a aceder à informação que necessitam seja para trabalho, lazer ou convívio. A lei do menor esforço tem aqui um papel crucial. Não é à toa que “natural” é muitas vezes sinónimo de fácil ou “sem esforço”.  E isso leva-nos à conclusão de que o metaverso, surge da necessidade dos indivíduos quererem algo “mais real” para interagir com a informação que existe.

Esta emulação do real vai ser o menu mais disponível nos primórdios do metaverso (no Metaverso 0.0) , geração após geração, o nosso imaginário passará a considerar natural todas as dimensões possíveis nesta nova camada do mundo. Como se existisse núcleo, manto, crosta e metaverso.

Arrisco-me a chamar de “Metageneration”, (metageração) ou “Geração Meta” a primeira geração que nascer numa era em que o metaverso se encontra já generalizado e as principais interações sociais e profissionais se desenrolam aí. Esta geração, possivelmente sem o enviesamento das limitações físicas da gravidade, vai aceitar mais facilmente a interação com objetos virtuais que não respeitem a naturalidade. Não será preciso simular montras de lojas, aceitarão facilmente a abertura de um menu com as opções de compras a pairar no ar ou outra coisa qualquer. Ao mesmo se poderá assistir no sentido inverso.

Durante uma ação de On Boarding, percebi que um estagiário se encontrava a participar na formação a partir do seu quarto em casa dos pais, os dois últimos anos da licenciatura tinha-os feito online e há 6 meses que trabalhava sem nunca ter ido ao escritório. Licenciou-se e entrou no mercado de trabalho sem sair do quarto de infância. Na altura pensei “este já vive no metaverso”, mas isto não é bem verdade.

Ao contrário do que parece à primeira vista, o metaverso não terá de vir forçosamente, cimentar o conceito de “humanidade enclausurada” em que permaneceremos no sofá toda a nossa existência,  sem necessidade de movimentação nem interação física com os outros, entorpecendo enquanto o nosso corpo se deforma com a gordura até ficar parecido com uma pera gigante.

É expectável que com o desenvolvimento da tecnologia e o processamento dos  interfaces 3D na cloud e não nos dispositivos,  possamos passar a deslocar-nos no mundo físico e interagir com informação sobre a forma de realidade aumentada de modo não só fidedigno como fiável. As aplicações são imensas, facilmente a visitaremos, com real perceção de espaço, um apartamento que ainda não está terminado, bastando para isso entrar dentro de um prédio em construção.

Um mecânico poderá ensaiar opções de reparação de um motor, num “digital twin” enquanto o cliente observa, os alunos poderão visitar o coliseu de Roma como era quando acabado de estrear ou conversar daqui a muitos séculos com sobreviventes dos campos de concentração Auschwitz (estes clones digitais já existem, podem visitar https://www.ilholocaustmuseum.org/).

Então e como devemos agir?

É altura de fazer ensaios. As empresas de tecnologia devem desenvolvê-la, as organizações que tenham capacidade financeira devem apoiar e investir em experiências que possam servir pequenos objetivos organizacionais, extraindo dividendos financeiros ou de imagem de marca. Os restantes apenas devem ficar atentos, estudar acompanhar a evolução.  Garantir que as suas equipas estão informadas sobre o que se passa para que, assim que se torne pertinente, entrem em ação no sentido de aproveitar a oportunidade.

Um dica prática:

Uma sugestão fácil de implementar passa por  solicitar a cada responsável de área ou departamento, um estudo simples, algo não muito longo nem demorado. Imaginem desenhar um “mind map”, no centro o palavrão “Metaverso” e em seu redor várias linhas e setas, destinos, interações, implicações, fruto de um olhar critico desse profissional ou conjunto de profissionais. Até que ponto o grau de evolução se encontra no que diz respeito à  minha especialidade (imaginem: logística, financeira, RH)? Que implicações poderão surgir? Existe algo que possa fazer já? Custo beneficio? Dimensões Positivas e negativas? Depois construam um mapa de consolidação, fruto do trabalho de todos. Desta forma irão garantir que todas as pessoas na organização se encontram na mesma página face a esse tema. De vez em quando alguém vai lembrar-se de o atualizar.  Tudo indica que irão surgir muitas oportunidades, novos negócios e novas profissões à medida que o metaverso for progredindo.

Quando estiver desenvolvido quer será o momento de trabalhar melhor, brincar melhor e comunicar mais livremente.

Sobre o Autor:

Rui Coelho da Silva, Diretor Pahl_Consulting,

Consultoria de Gestão