Uma decisão judicial determinou que eventos privados no autódromo do Estoril, no concelho de Cascais, vão ter de respeitar os limites legais do ruído, aceitando parcialmente uma providência cautelar interposta por uma associação de moradores.

O Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste decretou, em 8 de setembro, que todas as provas no Autódromo Fernanda Pires da Silva deverão respeitar os limites de ruído estipulados na lei, com exceção das competições desportivas oficiais organizadas pelas federações desportivas, nacionais e internacionais, respetivos treinos em pista e treinos autónomos deste tipo realizados por pilotos profissionais”.

A decisão, a que a Lusa teve acesso, julgou assim procedente a providência cautelar em relação aos demais eventos privados e corporativos, obrigando a empresa Circuito do Estoril e a Parpública — Participações Públicas “a adotarem os procedimentos necessários para assegurar que”, no âmbito desses eventos, na zona envolvente do autódromo do Estoril “seja respeitado o critério de incomodidade” definido no Regulamento Geral do Ruído (RGR).

As sociedades também estão impedidas de admitirem, nesses eventos privados, “a atividade em pista de veículos que produzam ruído que não permita observar tal critério de incomodidade, devendo tornar públicos os limites estabelecidos para esse efeito, o que deve ser inspecionado através de medições efetuadas ao 50 cm do escape” e das rotações máximas do motor, com divulgação dessa avaliação online.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Estas medidas e “monitorizações do ruído produzido através da instalação de câmaras de ruído em pontos especialmente sensíveis dos circuitos, em número não inferior a três, através das quais se fiscalize o cumprimento dos limites de ruído aplicáveis a esses eventos”, com os resultados divulgados online, devem ser concretizadas até ao final deste ano.

O tribunal determinou ainda que as sociedades paguem “solidariamente, a título de sanção pecuniária compulsória”, 20 mil euros por cada mês de incumprimento das medidas aplicadas contados de janeiro de 2024.

Na ação apresentada pela Associação Baixo Ruído (ABR), constituída em 2021 por um conjunto de moradores, solicitava-se que fosse “respeitado o critério de incomodidade” definido no RGR na envolvente do autódromo e que não se admitisse “em pista veículos que produzam ruído que não permita observar tal critério de incomodidade”.

Na petição justificava-se que o “crescente número de dias de atividade ruidosa registado nos últimos dois anos [63 dias, entre julho e dezembro de 2021, e 163 dias no ano de 2022], prejudica gravemente a saúde pública e a qualidade de vida de todos aqueles que habitam, estudam, trabalham ou visitam a zona circundante” do autódromo.

Estão nessa situação áreas habitacionais da Ribeira da Penha Longa, da Quinta da Penha Longa, do Bairro da Cruz Vermelha, do Bairro de São João, da Atrozela, de Alcoitão e, “de um modo geral, de Alcabideche, e ainda do Linhó e da Quinta da Beloura, bem como a área abrangida pelo Parque Natural Sintra-Cascais”, lê-se no documento.

Mediante avaliações acústicas por uma empresa certificada, em março de 2023, no exterior de um lote do Penha Longa Resort, no decurso de corridas no autódromo, a diferença entre o “valor médio do indicador L (índice Aeq) do ruído ambiente e o valor do indicador L médio do ruído residual ascendeu a 20 dB(A)“. No mesmo dia, em Alcabideche, a diferença “ascendeu a 30 dB(A)“.

Estes valores excedem, “pelo menos, o limite de 5 dB(A), em zonas habitacionais da freguesia de Alcabideche situadas dentro de um raio de aproximadamente de um quilómetro” do autódromo, “designadamente na Ribeira da Penha Longa, Quinta da Penha Longa, no Bairro da Cruz Vermelha, no Bairro da Atrozela e, também, no Linhó, designadamente junto do Estabelecimento Prisional, e na Quinta da Beloura”.

Nestas zonas habitacionais existem ainda jardins-de-infância, escolas e lares de terceira idade e, embora o autódromo se situe no concelho de Cascais, o ruído propaga-se ao concelho de Sintra, afetando a população e o ambiente de ambos os municípios, do distrito de Lisboa.

Na decisão judicial, refere-se que no plano de execução do Plano Diretor Municipal (PDM) de Cascais, a respeito do “ruído resultante da atividade do autódromo”, surge como designação de ação “a instalação de barreiras acústicas, o que nunca ocorreu”.

No documento avança-se que a empresa gestora impôs limites de horário nas corridas e competições entre as 9h00 e as 19h00, entre outras ações, e que as sociedades “estão a avaliar”, em articulação com a Câmara de Cascais, a melhor forma de concretizar as medidas preconizadas no Plano Municipal de Redução de Ruído, que incluem, além das barreiras acústicas, “uma rede de [três] sonómetros de precisão”, que transmitam “dados em tempo real ao sistema de monitorização do ruído ambiente do município de Cascais”.

“Da Fórmula 1 tenho saudades”, admitiu à Lusa a porta-voz da ABR, Leonor Machado, assegurando que “as provas oficiais não incomodam tanto” como outras de eventos privados, que “têm agravado o nível de ruído” na zona. “O ACP [Automóvel Clube de Portugal] tem feito provas aqui, que não provocam muito ruído, e são importantes para o comércio e o turismo”, afirmou a moradora, como exemplo, acrescentando que o problema reside em eventos com carros sem limitação de ruído “o dia inteiro”.