Desta vez, António Costa Silva, o ministro da Economia e do Mar, não falou sobre os feitos portugueses de outros tempos, preferindo usar referências mais adequadas a um público de uma cimeira tecnológica como a Web Summit: a ficção científica. “Têm à vossa frente a opção de ir por um mundo Star Trek ou por um mundo como Matrix”, disse o governante, em referência a dois clássicos do género cinematográfico.
Numa intervenção feita para uma plateia já a meio gás, depois da saída de uma enchente de participantes quando a sessão de Jimmy Wales, o fundador da Wikipédia, chegou ao fim, Costa Silva destacou o Portugal “muito amigável” e um “dos países mais seguros mundo”, para deixar conselhos.
“Aproveitem a cidade, gastronomia e o vinho”, disse a uma plateia já pouco composta. Mas pediu algum “equilíbrio” na apreciação desses pontos fortes. “Não passem mais tempo na Wine Summit do que na Web Summit, tentem encontrar o equilíbrio”, transmitiu, referindo-se à área dedicada a vinhos que desde há uns anos marca presença na cimeira.
Depois dos conselhos, chegaram os apelos e um dos temas centrais da intervenção — a ameaça climática. “Precisamos desesperadamente de ideias para resolver questões. Uma das mais importantes é a ameaça climática“, disse Costa Silva, descrevendo a “velocidade incrível” a que o mundo está a perder partes dos glaciares.
Para Costa Silva, a “questão mais crítica está ligada ao hemisfério norte”, onde é necessário que haja mais países “a fazer o que estamos a fazer em Portugal, a mudar o mix energético”.
Para começar a trabalhar no tal mundo Star Trek, há que começar a trabalhar e a reconhecer que “a responsabilidade do futuro nos cabe a todos”. “Vamos resolver este problema que recai sobre a nossa existência”, pediu Costa Silva, regressando às alterações climáticas. No fim, depois de ter citado autores estrangeiros, decidiu recorrer à prata da casa para rematar a intervenção. “Temos escritores brilhantes” em português, disse o governante, antes de citar Mia Couto. “A vida é demasiado preciosa para ser esbanjada num mundo desencantado.”
A intervenção do ministro no palco da Web Summit foi feita ao fim do dia, depois da demissão de João Galamba, ministro das Infraestruturas, e da saída de Pedro Cilínio, secretário de Estado da Economia.
À semelhança do ano passado, coube a António Costa Silva representar o Governo na abertura da Web Summit. Na edição de 2023, não houve lapsos, ao contrário do que aconteceu no ano passado, quando Costa Silva subiu ao palco apresentado simplesmente como “António Costa”. Afinal, era o primeiro-ministro que constava no programa. A troca de “Costas” (que também terá acontecido na transcrição de escutas por parte do Ministério Público na Operação Influencer) não deverá repetir-se na Web Summit. O ainda primeiro-ministro chegou a constar no programa da cimeira de tecnologia, mas desapareceu após ter apresentado a demissão, na passada terça-feira.
Não foi o único membro do Governo a sair da lista. Fernando Medina, ministro das Finanças, Ana Mendes Godinho, da Segurança Social, e Duarte Cordeiro, do Ambiente, deveriam ser oradores no evento, mas os acontecimentos dos últimos dias levaram a que também os membros do Governo mudassem de planos, ainda que não por razões de boicote, como outros participantes. Também a secretária de Estado da Energia, Ana Fontoura, mencionada nas escutas da Operação Influencer, cancelou a participação no evento.
Secretária de Estado da Energia cancela participação na Web Summit
Moedas tem mais um sonho: depois dos unicórnios, quer Lisboa como um “porto seguro”
Carlos Moedas, o presidente da Câmara de Lisboa, tem uma agenda repleta na Web Summit. Na primeira intervenção na edição deste ano foi apresentado pela nova CEO não como “Mo-e-dash” dos tempos de Paddy Cosgrave, mas com uma pronúncia praticamente à portuguesa.
Se Costa Silva falou sobre ameaças climáticas, Moedas preferiu um tema que lhe é mais familiar: sonhos. “Há dois anos estive aqui para falar dos meus sonhos de fazer de Lisboa capital da inovação”, recordou. “Ninguém acreditou na altura”, recordou o presidente lisboeta, mas a fábrica foi ganhando forma. “Dois anos depois, aconteceu. Temos mais de 54 empresas tecnológicas, de 23 países diferentes. Entre elas estão 12 unicórnios, que também vieram para criar empregos.” Em palco, disse que a vinda destas empresas já “gerou mais de 10 mil empregos em Portugal”.
“Hoje venho com mais um novo sonho”, explicou. Moedas precisou de recuar ao tempo dos fenícios, quando Lisboa tinha outro nome, usado para descrever um “porto seguro”. “Durante séculos as pessoas estavam juntas, judeus, muçulmanos, juntos na diversidade.”
Depois dos unicórnios, Moedas quer que Lisboa se torne um “porto seguro de inovação”. “Ninguém quer mudar ninguém, toda a gente é bem vinda e toda a gente pode ser quem é”, descreveu. “Se querem democracia, a vossa geração, tem de focar a democracia na humanidade.” Entre os sonhos, ficou o apelo a que as empresas de quem estava na plateia resolvam “os problemas de hoje”.
“Casas para quem não pode pagar”, responder às “alterações climáticas, à pobreza”, enumerou. “Venham resolver esses problemas para Lisboa. Venham para o porto seguro de Lisboa, instalem aqui a vossa empresa”, pediu Carlos Moedas.