Está no cargo há cerca de três semanas e ainda não conhece todos os cantos à casa. Para Katherine Maher, a nova CEO da Web Summit, o mais difícil tem sido “compreender totalmente todos os aspetos do evento”. Na primeira conferência de imprensa que deu desde que assumiu a função, a sucessora de Paddy Cosgrave jogou à defesa. Não quis alongar-se em comentários sobre o tema que resultou no afastamento do sucessor (a guerra entre Israel e o Hamas) nem sobre nenhuma outra questão. Chegou a mostrar-se “ofendida” com algumas perguntas.
Para a CEO, Paddy Cosgrave demitiu-se porque “estava a tornar-se uma distração para o sucesso do evento”. Neste momento, garantiu, o fundador da Web Summit não tem qualquer envolvimento com o evento que fundou em 2009 na Irlanda. Resignou ao conselho de administração “e não está envolvido nas operações”. Mas já deu a sua opinião sobre a edição deste ano. “A única coisa que ouvi sobre o Paddy foi que ele acha que eu estou a fazer um bom trabalho”, adiantou Katherine Maher.
A maior parte das questões colocadas à nova CEO foram mesmo sobre o seu antecessor. Uma das perguntas, de um jornal irlandês, sobre uma suposta proximidade entre Maher e Cosgrave que teria levado à sua rápida escolha para o cargo, levou mesmo a responsável a insurgir-se contra a “misoginia” da questão. “Estive com o Paddy duas vezes na vida, uma no placo principal como oradora e outra na receção aos oradores, é ofensivo e misógino pensar que tínhamos uma relação pessoal”. De acordo com o mesmo jornalista, a Web Summit terá enviado uma carta (quasi legal) a jornais irlandeses, questionando a insinuação contida nas perguntas, apesar de não ter avançado com um processo.
Não foi a única questão que desagradou à nova CEO. Confrontada com as desistências de oradores, na sequência da polémica, e de como a ausência de nomes sonantes pode afetar a relevância do evento, Katherine Maher afirmou que se fosse oradora ficaria “ofendida” com a pergunta. E rejeitou que a cimeira esteja a perder relevância. “A Web Summit começou como uma oportunidade para ligar startups e o ecossistema e celebrar o seu trabalho dos empreendedores. Tivemos um número recorde de startups este ano e o que temos ouvido da parte delas e dos participantes é que o foco deve ser esse, é essa a origem da Web Summit. Acho que o poder da Web Summit é ter muitas pessoas e ser uma parte importante do seu percurso”.
Sobre o tema que levou Paddy Cosgrave a apresentar a demissão, Maher referiu apenas que reconhece “a dor e sofrimento que existe em várias comunidades em todo o mundo”. E apesar de ter dito que houve empresas a reconsiderar a participação e a voltar atrás com a decisão de cancelar a presença no evento, não disse quais. “As conversas foram confidenciais”. Sobre as ausências de gigantes como a Google ou a Amazon, desvalorizou. “Dizem que tem sido ótimo ter mais espaço para as startups”, declarou apenas. Mas se os desistentes quiserem voltar em edições futuras “ficaremos encantados”.
Crise política e ausência do primeiro-ministro? “O Governo de Portugal são as pessoas”
Menos de uma hora após o fim da conferência de imprensa, Katherine Maher apresentou-se no palco Q&A para responder a algumas questões dos participantes. Durante cerca de 30 minutos, a CEO confidenciou que os momentos que antecederam a entrada no palco central, na cerimónia de abertura da Web Summit, foram de grande nervosismo. A ansiedade “parou” assim que entrou no palco.
Num cargo em que sente ter “grande responsabilidade” para com aqueles que se “preocupam muito” com a conferência e até para com os que estão com “sentimentos contraditórios por causa dos comentários” de Paddy Cosgrave sobre Israel, a norte-americana admitiu que há “muita pressão”.
Questionada por um participante do Uganda sobre a realização de uma Web Summit em África, algo que Paddy Cosgrave, antiga cara principal do evento, chegou a mencionar várias vezes, Katherine Maher disse que “atualmente não existem planos” para que tal aconteça. Ainda assim, o objetivo da organização é que exista “uma cimeira como esta [que se está a realizar em Lisboa] no mundo inteiro”. “Estou aqui há 13 dias, dá-me mais alguns”, pediu, em jeito de brincadeira.
Coube ao Observador fazer a última pergunta à nova líder da Web Summit. Questionada sobre se via a ausência do primeiro-ministro de Portugal como um problema (uma vez que o contrato firmado para manter o evento em Lisboa até 2028 obriga a sua presença) e se tem acompanhado a recente crise política portuguesa, a empresária norte-americana lembrou que “Portugal é uma nação democrática”. Por isso, continuou, antes de ser interrompida por uma salva de palmas, “o Governo de Portugal são as pessoas de Portugal”.