O tribunal de Viana do Castelo absolveu o ex-presidente da Câmara de Caminha Miguel Alves e a empresária Manuela Sousa do crime de prevaricação na contratação pública de serviços de assessoria de comunicação para o município. Em declarações aos jornalistas à saída do Tribunal de Viana do Castelo, Miguel Alves afirmou estar “muito contente” com a decisão, reafirmando que não cometeu “nenhum ato ilegal” e que “Tribunal veio confirmar” a sua inocência. “Hoje fez-se justiça”, frisou, não descartando um regresso à política.
A juíza, que presidiu ao coletivo que julgou este caso, sublinhou que o tribunal deu “como não provada a acusação do MP” e que não foi sustentado “por quaisquer meios de prova” o crime em coautoria, de prevaricação de titular de cargo político, de que vinham acusados o ex-autarca do PS e a empresária.
Miguel Alves referiu que as acusações que lhe foram imputadas podem ter “intuitos mais maldosos”, mas que os políticos devem estar preparados para serem sujeitos a escrutínio público e para que quando há denúncias anónimas elas têm de ser esclarecidas”.
Mas, para o socialista, mais importante do que o processo judicial que agora termina, “é o momento particularmente relevante” que se vive, aludindo às eleições legislativas de 10 março, salientando a necessidade de se fazerem escolhas
“É preciso que nessas opções olhemos para os que fazem sentenças de tabacaria, que tomam como definitivo qualquer tipo de suspeição porque esses, em última análise, vão acabar por deteriorar, estão a deteriorar o nosso Estado de Direito, a nossa democracia”, observou.
Sobre a sua demissão do cargo de secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro aquando das acusações, o ex-autarca disse que o fez porque sabia que “precisava de estar acima de qualquer suspeita” e já era acusado. Pelo que não requisitou a “abertura de instrução”, apenas quis que “o julgamento decorresse o mais rápido possível”.
Miguel Alves sublinha que as acusações de que foi alvo tiveram “danos pessoais, profissionais, familiares” e “não vão trazer de volta o trabalho que poderia ter feito no Governo” ou a “alegria” da sua família.
E, questionado pelos jornalistas sobre o seu futuro, Miguel Alves não excluiu a possibilidade de voltar à política:
Já estou há tempo suficiente na atividade pública, política. Já tenho idade e experiência suficientes para nunca dizer nunca a nenhum desafio. Por hora, é consolidar o meu percurso profissional, abraçar a minha família e, de algum modo, festejar porque foi um ano e meio muito difícil para mim e para as pessoas que gostam de mim”, adiantou.
Em janeiro, nas alegações finais, o MP pediu a condenação dos dois arguidos, acusados, em coautoria, de prevaricação de titular de cargo político. A procuradora do MP defendeu que a prova documental e as regras da experiência validaram os factos que constam na acusação. “Condenando, este Tribunal fará justiça“, afirmou.
O MP acusou Miguel Alves — que se demitiu do cargo de secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro após saber da acusação — de ter violado as normas de contratação pública quando acordou com a empresária serviços de assessoria de comunicação para o município (no distrito de Viana do Castelo) “sem qualquer procedimento de contratação pública”.
O despacho de acusação do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) Regional do Porto, a que a Lusa teve acesso, refere que o processo teve origem numa “denúncia anónima efetuada no Portal do DCIAP [Departamento Central de Investigação e Ação Penal]”, em 3 de julho de 2019.
Segundo a acusação, em 2014, Miguel Alves e Manuela Sousa, que à data dos factos usava o apelido Couto, “mantiveram contactos com vista à prestação de serviços de comunicação, gestão de imagem e assessoria de comunicação à autarquia pelas sociedades MIT e Mediana”, detidas e controladas pela arguida.
Para o advogado do ex-autarca Miguel Alves, a matéria de facto produzida em sede de julgamento “não suporta a acusação” e apontou que casos como este “descredibilizam as instituições, abalam o sistema democrático e são inimigos do Estado de Direito”. José João Torrinha disse que o coletivo de juízes não só faria “justiça”, absolvendo o ex-autarca, como contribuiria “ativamente para o prestígio da justiça e para a defesa do Estado de Direito”.
Miguel Alves nega qualquer irregularidade em contratação de empresa de comunicação
O advogado da empresária assentou a sua estratégia de defesa no facto de para haver prevaricação teria de existir um contrato para os trabalhos realizados antes de abril de 2015, data do primeiro procedimento contratual entre a autarquia e a empresa de Manuela Sousa. “Não há prevaricação do ponto de vista criminal, porque não há processo contratual”, reforçou Nuno Brandão, pedindo a absolvição da empresária.
No início do julgamento, tanto Miguel Alves como Manuela Sousa negaram qualquer irregularidade na contratação da empresa de assessoria de comunicação. “Se cometi alguma irregularidade foi com a empresa [de Manuela Sousa]”, referiu Miguel Alves durante o julgamento, admitindo em tribunal que se aproveitou da empresa porque, sabendo da sua expectativa em conseguir um contrato com a câmara de Caminha, fazia o “jogo do gato e do rato”.