Um estudo conduzido pela Federação Académica do Porto (FAP) dá conta de que metade dos inquiridos pondera emigrar após a conclusão do Ensino Superior, contra 33% que preferiu não responder, e apenas 17% que considera ficar. A análise aponta que quanto maior a expectativa salarial, maior é a tendência para emigrar. O objetivo do inquérito foi identificar as principais preocupações dos estudantes e, nas reações, há críticas para o pouco destaque dado ao tema do ensino superior pelos partidos durante a campanha eleitoral. Francisco Porto Fernandes, presidente da FAP, diz mesmo ao Observador que a ausência do tema dos debates “deve envergonhar-nos enquanto país”.
Numa semana em que também ficou a saber-se que na Universidade de Coimbra um inquérito da Associação Académica revelou recentemente que 70% dos estudantes desta associação pensa em emigrar, o Observador falou com estudantes das faculdades de Ciências, Arquitetura e Letras da Universidade do Porto sobre a qualidade do ensino superior em Portugal, expectativas salariais, a crise na habitação, e o que acham da medida da devolução das propinas. Apesar do que há de bom, como a qualidade do ensino, todos entendem as conclusões destes inquéritos.
Dentro da Europa “são raras as opções piores” que Portugal
João Ribeiro é estudante do último ano de arquitetura. Ao Observador, o jovem reconhece a qualidade do ensino no seu curso, mas assume que as expectativas salariais deixam muito a desejar. “Sendo ou não, somos considerados ainda a melhor faculdade de arquitetura do país, e saímos daqui para trabalhar, muitas vezes, com um salário pouco superior ao salário mínimo”. João Ribeiro afirma que são estas fracas ofertas salariais que o levam a considerar emigrar, acrescentando que mantém várias opções em aberto dentro da Europa. “São raras as opções que são piores que em Portugal”, explica.
O estudante reivindica melhores condições de trabalho. “Não querendo menosprezar as profissões que não precisam de curso, no nosso caso o salário com o qual começamos é aquele com que continuamos por muitos anos”.
No meio da falta de apoios, a devolução das propinas é “apenas atirar areia para os olhos”
“Deve envergonhar-nos enquanto país que um setor estrutural para o crescimento económico, para o desenvolvimento de uma sociedade, como é o Ensino Superior, tenha zero minutos em qualquer debate eleitoral.” As palavras são de Francisco Porto Fernandes, presidente da FAP. O jovem estudante de economia considera que as medidas do governo e as que são propostas pelos candidatos em campanha eleitoral são insuficientes. E recorda: “Sem jovens não há futuro”.
Sobre a medida da devolução das propinas, Francisco Porto Fernandes diz mesmo ser uma “péssima política pública”. “Ninguém deixa de emigrar por causa de 697€ por ano, porque esse valor é pago num país como a Alemanha em 15 dias. 15 dias na Alemanha é o prémio salarial que o governo português nos está a dar para ficarmos aqui um ano“, critica o representante da federação, afirmando que o dinheiro das propinas era mais bem gasto “na construção de camas públicas”.
E não é o único a criticar a medida do atual governo. António Soares, estudante de mestrado em ensino de Geografia, diz que a medida foi “atirar areia para os olhos”. “Isso não nos ajudar a fixar cá. Nem sequer dá para uma entrada de uma casa, ou para a entrada daquilo que é necessário para uma renda. É apenas atirar areia para os olhos dos estudante e dos recentes graduados”, defende.
Os jovens com quem o Observador falou apontam os baixos salários e a crise na habitação como os fatores que levam os jovens a emigrar. Beatriz Vaz Pinto, estudante de Ciências e Tecnologia do Ambiente, foi uma delas. “Vamos tirar o curso e muito provavelmente não é aqui que vamos ficar, as ofertas aqui em Portugal são muito escassas”, desabafa.
Maria Dubini vem de Lisboa. É colega de curso de Beatriz Vaz Pinto, e conta que encontrar quarto no Porto não foi fácil. “Já encontrei quartos a 320€ sem janela, sótãos por 400€ sem casa de banho”, diz, esclarecendo que quem estava a arrendar estes sótãos eram famílias que disponibilizavam o espaço aos estudantes, mas não queriam partilhar a casa de banho da casa.
“Muitas vezes um estudante de Braga fica de setembro até dezembro à procura de um quarto”, acrescenta Francisco Porto Fernandes. O representante da FAP diz que cada vez mais estudantes optam por uma universidade privada na cidade onde vivem, por a propina ser mais barata do que a renda de um quarto. “Nós vivemos num país de salários baixos, mas vivemos num país em que um quarto para estudante, aqui no Porto, atinge facilmente os 400€. Uma família que tenha um crédito habitação de 500€ está numa taxa de esforço brutal”.
Ao inquérito da FAP responderam 1002 estudantes das instituições de Ensino Superior dos Porto. 45% são do Ensino Universitário Público, 32% do Ensino Politécnico Público e 23% do Ensino Particular e Cooperativo. Dos inquiridos, 58% são do sexo feminino, 41% do sexo masculino, 27% são beneficiários de bolsa de estudo e 35% são estudantes deslocados. 77% estão ainda na licenciatura.