A diretora da Unidade de Internamento ASFE Saúde, em Mafra, considerou esta quarta-feira que os doentes são referenciados para paliativos muito tarde e disse que a unidade raramente consegue atingir os 95% de taxa de ocupação.

Em declarações à Lusa a propósito do relatório da Entidade Reguladora da Saúde esta quarta-feira divulgado, que conclui que quase metade (48%) dos doentes referenciados no ano passado para unidades de cuidados paliativos contratualizadas com o setor privado ou social morreram antes de ter vaga, Cristina Mendonça considerou este número dramático e disse ter ficado surpreendida.

Quase metade dos doentes indicados para paliativos no privado ou social morreram sem vaga

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“Esse dado tem que nos fazer pensar muito. Mas não há vagas e depois há uma unidade como a nossa que raramente consegue atingir os 95%. Então onde é que estão os doentes”, questiona.

A responsável disse que, em junho e julho, a unidade que dirige, que tem 20 camas de cuidados paliativos, não conseguiu sequer atingir a taxa de 85%.

“Se a taxa estiver abaixo dos 85%, para qualquer tipologia da Rede Nacional de Cuidados Continuados, o pagamento que nós recebemos é pela taxa que estiver. Mas nós continuamos a ter cá os profissionais e a ter de pagar salários completos”, explicou.

Referiu que o facto de não atingir a taxa de 85% “põe automaticamente em défice as unidades”, o que as leva a questionar a sua sustentabilidade.

“O que é um contrassenso, porque sabemos das necessidades”, disse a responsável, admitindo que ficou surpreendida com o relatório da ERS divulgado nesta quarta-feira.

Cristina Mendonça lamentou ainda o facto de “a referenciação dos utentes para os cuidados paliativos ser feita tardiamente” e pediu mais celeridade nestes processos, considerando excessivo os 21 dias de espera para uma vaga em paliativos nos convencionados do setor social e privado apontados pela ERS.

“Principalmente neste tipo de utentes, 21 dias desde que o utente é referenciado tem entrar dentro de uma unidade é muito tempo”, considerou, lembrando que, nos últimos dois meses, 34% dos utentes tiveram um internamento até três dias.

“Isto quase que não dá para fazer aquilo que são efetivamente os cuidados paliativos, pois há toda uma preparação”, considerou, lembrando que, em julho, a unidade registou 37 óbitos.

Admitiu que possa haver “falhas processuais” nalguns casos e pede mais sensibilização dos profissionais nos hospitais — “para que o mais cedo possível identifiquem as necessidades de cuidados paliativas dos utentes” — e mais celeridade no processo, desde a referenciação do utente até à entrada na unidade de cuidados paliativos.

A ASFE Saúde tem 222 lugares em diversas tipologias: 20 em cuidados paliativos, 20 em convalescença, 98 em média duração e 84 em longa duração.

A Rede Nacional de Cuidados Paliativos (RNCP) contempla duas tipologias de Unidades de Internamento de Cuidados Paliativos (UCP): as UCP hospitalares, que prestam cuidados paliativos a doentes com doenças graves e/ou avançadas e progressivas, que necessitam de internamento, e as UCP-RNCCI [Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados], que são contratualizadas com entidades do setor social ou privado e prestam cuidados em situações de complexidade baixa a moderada.

Foi sobre estas últimas que a ERS se debruçou no relatório que divulgou nesta quarta-feira.

Dos utentes referenciados para UCP-RNCCI em 2023, mais de um em cada três (37%) foram admitidos em unidades do SNS. Cerca de 48% dos utentes referenciados durante esse período “não foram admitidos por óbito anterior à admissão”, conclui.

O relatório da ERS indica ainda que o tempo médio de espera para admissão dos utentes referenciados em 2022 e 2023 foi inferior a um mês: os que foram referenciados e admitidos em 2022 aguardaram, em média, 20 dias e, em 2023, esse valor subiu para 21 dias.