O crítico cultural e sociólogo Augusto M. Seabra morreu na madrugada desta quinta-feira, em Lisboa, aos 69 anos. A notícia foi avançada pelo Público, jornal que ajudou a fundar e onde assinou os últimos textos. Fonte próxima da família disse à agência Lusa que o estado de M. Seabra, vítima de várias complicações prolongadas de saúde, agravou-se nas últimas semanas.

Nascido a 9 de agosto de 1955, Augusto M. Seabra formou-se em Sociologia e foi autor de uma vasta obra enquanto cronista e comentador, em particular na área do cinema e da música, mas com intervenção em variadíssimas outras áreas. Crítico a partir de 1977, fez parte do júri de festivais de cinema como Cannes ou San Sebastian, foi consultor do Script Fund do programa media da EU, e programador de festivais como o DocLisboa.

Foi produtor executivo do Departamento de Programas Musicais da RTP e colaborador na conceção de espetáculos de teatro musical. Colaborou com alguns coreógrafos e foi consultor musical do filme E o tempo passa (2011) de Seixas Santos.

Reconhecido enquanto crítico, “Augusto M. Seabra foi para além do horizonte mais habitual desta prática”, lê-se na folha de sala da Cinemateca — a quem M. Seabra doou o seu acervo documental no que respeita ao cinema. “Com frequência, os seus textos ultrapassaram em muito o domínio estrito da análise de obras ou espetáculos, transformando-se em reflexões continuadas sobre o papel das instituições e da política cultural no nosso país”.

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A incursão de Augusto M. Seabra na imprensa acontece por via da música a partir de 1977 no jornal A Luta. Continuou a dar particular atenção a esta área (sobretudo à Música Contemporânea, ao Barroco e à Ópera) em todas as publicações por onde passou ao longo do último meio século, bem como ao cinema. Escreveu no Diário de Notícias, no semanário Expresso, com quem manteve uma longa relação, e, mais tarde, no Público, jornal que ajudou a fundar e onde colaborou até aos seus últimos tempos no ativo. A sua última crónica, Cannes 93, memórias de um jurado, foi publicada a 24 de maio de 2023.

Em 2004, a sua “voz lúcida e atenta” valeu-lhe um prémio Arco-íris, da Associação ILGA Portugal e atribuído a personalidades que se “distinguiram na luta contra a discriminação em função da orientação sexual, identidade/expressão de género e características sexuais”.

“Encarnou como poucos no Portugal contemporâneo a figura do crítico cultural”, escreveu o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, numa nota no site da Presidência em que homenageia “um dos últimos representantes de um tempo em que a crítica era determinante no espaço público”.

“Enquanto jornalista e crítico (nomeadamente no Expresso e no Público), mas também programador, consultor, produtor ou jurado, acompanhou com zelo, conhecimento, cosmopolitismo e opiniões fortes a música erudita (clássica e contemporânea), o teatro, o cinema, e, com grande intensidade, as políticas culturais”, continua.

Augusto M. Seabra foi ainda protagonista do episódio que levou à demissão de João Soares do governo socialista em 2016. O então ministro da Cultura não resistiu à polémica aberta por um post que escreveu no Facebook, a prometer “salutares bofetadas” aos cronistas do Público Augusto M. Seabra e Vasco Pulido Valente. 24 horas depois, João Soares demitiu-se.