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Foram os “guardas que falharam” garantiu esta sexta-feira o ex-diretor dos Serviços Prisionais, que se demitiu há três dias após a fuga de cinco reclusos da Prisão de Vale dos Judeus em Alcoentre.
“Não vou dizer que os [guardas] não cumpriram o serviço que deveriam ter cumprido, mas na prisão temos duas grande populações — os reclusos e os guardas — e os guardas estão lá sobretudo para exercer segurança e portanto é óbvio que houve falhas na segurança e é isso que está a ser apurado, assegurou na entrevista à RTP, a primeira após ter apresentado a demissão.
“Os criminosos avaliam as rotinas das vítimas e atacam em função disso. Estas pessoas avaliaram muito bem as rotinas do funcionamento da prisão, e não foi à toa que escolheram o sábado, já que esse dia tem um conjunto de rotinas que não são iguais às do resto da semana, e perceberam o que não estaria a funcionar, de maneira a que pudessem escapar sem serem vistos”, acrescentou.
“É preciso perceber se essas falhas foram de desleixo, propositadas, ou se pelo contrário foram uma circunstância fortuita”, assegura Abrunhosa Gonçalves.
Sobre a sua demissão, o antigo diretor revelou que “nestas circunstâncias têm quase sempre que rolar cabeças“. “Sendo eu o dirigente máximo, percebi que desde o primeiro momento em que ninguém diz nada e não se chega à frente para fazer qualquer tipo de declaração em defesa dos dirigentes, que provavelmente o meu futuro estava anunciado”, admitiu ainda, revelando que entendeu que a ministra da Justiça, Rita Júdice, lhe demonstrou que não tinha confiança para que se mantivesse em funções.
“Há 200 câmaras mas o guarda não olha para todas, nem nunca conseguiria”
“O facto de existirem 200 câmaras não faz com que o guarda tenha de estar a olhar para as 200 câmaras”, afirma o ex-diretor dos Serviços Prisionais. Explica que há um “videohall que está mais perto do guarda que é selecionado, onde estão as câmaras que nesse dia e nessa hora são importantes“. “Não havia câmaras ligadas [nesse dia] nas oficinas, nas escolas, nos próprios pavilhões, porque estavam fechados e porque era hora das visitas”, informa.
“Em função da rotina da cadeia, daquele dia, o guarda tem de estar atento às câmaras nos locais em que nessa altura estão os reclusos e não noutras”, garante Rui Abrunhosa Gonçalves, referindo que no sábado da fuga as câmaras que deveriam estar a ser monitorizadas seriam as da “zona das visitas, da zona dos pátios e no perímetro externo, onde estas são sempre ligadas”.
Como exemplo de uma eventual circunstância fortuita que possa ter ocorrido durante a fuga, o ex-diretor dos Serviços Prisionais nota que, na central de observação de videovigilância, “o guarda que lá está é rendido hora à hora” e levanta a hipótese de a fuga não ter sido detetada por ter ocorrido no momento em que os profissionais revezavam a posição de vigilância.
Diretor de Vale dos Judeus não tinha sido substituído em tempo útil, porque “não se sabia que diretor se ia aposentar”
Rui Abrunhosa Gonçalves justificou a não substituição atempada do diretor da prisão de Vale dos Judeus, porque até junho “não se sabia que o diretor se ia aposentar”.
“Ele podia ter idade para se aposentar, mas não anunciou logo que se ia aposentar. Temos muitos diretores de prisões que estão em idade próxima de se reformar e o doutor Ribeiro Pereira era um dos que se encontrava nessa situação”, garantiu. “Em junho começámos os contactos para ver quem poderia ir para ali, porque Vale dos Judeus não é uma prisão nada fácil em termos da sua dinâmica e sobretudo onde não é fácil termos pessoas de proximidade, porque é longe de tudo”, afirmou ainda, revelando que tinha na sua agenda a resolução da situação nas próximas semanas, antes de a fuga acontecer e de se ter demitido na sua sequência.
O ex-diretor dos Serviços Prisionais afirmou ainda que tinham sido pedidos reforços, há mais de um ano, para os lugares de guardas prisionais, a nível nacional. “Pedido transitou do antigo Governo para o atual”, notou, saudando o recente avanço do Governo no anúncio do recrutamento de 225 guardas prisionais.
Sobre as eventuais responsabilidades que lhe possam ser imputadas quando a investigação à fuga dos cinco reclusos estiver concluída, Rui Abrunhosa Gonçalves diz-se pronto para “assumir eventuais responsabilidades”.
“É lamentável ouvir o sacudir de água para cima dos guardas”. Sindicatos reagem às palavras de ex-diretor
“Não foi a nós que a ministra da Justiça retirou a confiança, foi ao ex-diretor”, afirmou Frederico Morais, presidente do Sindicato Nacional do Corpo da Guarda Prisional (SNCGP) em entrevista à RTP, notando que foi “lamentável ouvir o sacudir de água para cima dos guardas“, na primeira entrevista de Abrunhosa Gonçalves após a sua demissão. “Tinha consideração por ele até hoje”, referiu o presidente do sindicato.
Hermínio Barradas, a representar a Associação Sindical das Chefias da Guarda Prisional, criticou o ex-diretor por continuar a afirmar que 33 guardas, os que estavam presentes no estabelecimento no dia da fuga, seriam suficientes para garantir o normal funcionamento da prisão.
Acusou-o de omitir que entre o grupo de três dezenas de profissionais, “alguns estariam a trabalhar há 16 horas” e outros “não folgaram para estar lá nesse sábado para se garantir o número mínimo”. Lamentou ainda que fosse permitido que guardas prisionais que não estavam nesse grau hierárquico assumissem funções de chefia.