O ex-presidente da Octapharma Paulo Lalanda e Castro e a empresa Convida refutaram os crimes de fraude fiscal imputados pelo Ministério Público (MP) num processo extraído do caso O-Negativo, que terão lesado o Estado em 7,65 milhões de euros.

Segundo os requerimentos de abertura de instrução (RAI) dos arguidos, que já foram distribuídos no Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) e a que a Lusa teve acesso, a defesa de Lalanda e Castro alegou que o MP não apontou factos que indicassem um “conluio do arguido com qualquer entidade”, designadamente entre a ‘offshore’ Ruby Capital, controlada pelo arguido, e a Octapharma, que pagaria à primeira comissões pela atividade desenvolvida.

Em causa estão rendimentos não declarados em sede de IRS entre os anos 2007 e 2010 por Lalanda e Castro.

De acordo com a acusação, o arguido auferiu cerca de 17,4 milhões de euros na conta da Ruby (sediada nas Ilhas Virgens Britânicas), pagos pela Octapharma, pelos quais devia ter declarado 7.429.760,75 euros, com o MP a salientar que “atuou de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei”.

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Porém, o RAI assinado pelo advogado Ricardo Sá Fernandes sustentou que a Ruby não tinha só uma relação comercial com a Octapharma e que o MP considerou os proveitos da ‘offshore’ como se fossem diretamente do arguido, sublinhando também que a sociedade não era dirigida efetivamente a partir do território português e que não desenvolvia atividades dirigidas ao território nacional.

“O arguido agiu sempre no pressuposto de que a operação da Ruby era legítima, pelo que não agiu com dolo com vista à obtenção de vantagens fiscais indevidas, atuando na convicção que só teria de declarar fiscalmente em Portugal dividendos que lhe fossem atribuídos, o que não aconteceu”, lê-se no documento, que criticou ainda o englobamento dos quatro anos de declarações como um único crime, inviabilizando assim a prescrição de várias das infrações.

A defesa do empresário rejeitou igualmente que tenha cometido fraude fiscal enquanto representante da sociedade Convida num negócio no qual intermediou a cobrança de uma percentagem do passe do jogador brasileiro Walter Silva, então pertencente à SAD do FC Porto.

O MP entendeu que a Convida não podia ter deduzido na declaração de IRC relativa a 2016 o valor de 218.750,25 euros sem declarar os proveitos estimados em 875 mil euros.

“O arguido não agiu com a consciência de que estaria a ocultar ou a alterar quaisquer valores que devessem ser revelados à Autoridade Tributária, pelo que não praticou condutas ilegítimas”, referiu o RAI.

No mesmo sentido, a defesa da sociedade invocou ter sido apenas intermediária numa recuperação de um crédito, que não houve dolo e que a declaração de IRC foi sujeita a uma inspeção tributária sem que tivessem sido apontadas irregularidades.

“Não existiu qualquer ocultação que visasse a não liquidação de imposto ou a obtenção de qualquer benefício, não existiu diminuição de receita tributária e, ainda que assim não se considerasse, o Ministério Público calcula erroneamente o alegado prejuízo que entende ter existido”, lê-se no RAI assinado pela advogada Inês Rogeiro, que considerou “bastante improvável — senão mesmo impossível — que se venha a verificar uma condenação”.

Os RAI dos arguidos concluem que o juiz Nuno Dias Costa, do TCIC, não deve remeter o caso para julgamento (ou que siga apenas por fraude fiscal simples, no caso da empresa), mas a defesa de Lalanda e Castro garantiu estar disponível para a suspensão provisória do processo.

Este mecanismo permite que o arguido não seja julgado mediante o pagamento de uma verba (só para crimes com pena de prisão até cinco anos) e já lhe foi aplicado anteriormente no caso O-Negativo, estando a ser contestado num recurso do MP.

No processo O-Negativo, Lalanda e Castro chegou a ser acusado dos crimes de corrupção, branqueamento, recebimento indevido de vantagem e falsificação.