É uma decisão judicial que pode mudar a forma como o mercado de transferências funciona. Esta sexta-feira, o Tribunal de Justiça da União Europeia decide sobre o caso que opõe a FIFA e Lassana Diarra, antigo internacional francês que passou por Chelsea, Arsenal, Real Madrid e PSG — e as consequências podem ser maiores e mais alargadas do que as do Caso Bosman. 

A história começa no verão de 2014. Na altura, aos 29 anos, Lassana Diarra jogava no Lokomotiv Moscovo. De acordo com o caso, o jogador desentendeu-se com o então treinador Leonid Kuchuk e o clube russo seguiu em frente com um substancial corte de salário, sendo que Diarra reagiu ao deixar de aparecer nos treinos. Em agosto de 2014, e tendo em conta que o vínculo do francês se prolongava até 2017, o Lokomotiv Moscovo despediu o francês com base na ausência das sessões de treinos e acusou-o de violação dos termos contratuais.

O diferendo chegou ao Tribunal Arbitral do Desporto, com o Lokomotiv Moscovo a procurar ser recompensado, e apesar do recurso da defesa de Lassana Diarra o jogador foi mesmo multado no valor de 10,5 milhões de euros. Praticamente ao mesmo tempo, recebeu uma proposta dos belgas do Charleroi, que tinham uma condição: garantir que Diarra podia transferir-se livremente e que o clube belga não seria responsável pela dívida ao Lokomovit Moscovo. A FIFA, porém, não deu essa garantia.

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De acordo com a resposta do organismo que regula o futebol mundial, uma transferência internacional implica que a liga que o jogador está a abandonar tem de certificar a saída. Ora, sem que Diarra tivesse saldado a dívida milionária ao Lokomotiv Moscovo, essa certificação era impossível de obter. A sequência foi simples: em dezembro de 2015, mais de um ano depois de deixar os russos, o jogador francês lançou uma ofensiva judicial contra a FIFA e a Liga belga (ao lado de Jean-Louis Dupont, advogado do Caso Bosman), iniciando um longo processo que tem um dos seus dias decisivos esta sexta-feira.

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O caso ainda está a decorrer nos tribunais da Bélgica, mas acabou por ser transferido para o Tribunal de Justiça da União Europeia por estar relacionado e dependente de duas leis europeias: o direito à liberdade de movimentos para indivíduos e a preservação da competitividade dentro de mercados internos. Já este ano, o Primeiro-Advogado-Geral do Tribunal de Justiça da União Europeia emitiu um parecer sobre o caso — parecer esse que vai naturalmente guiar o pensamento do Tribunal e que é favorável a Lassana Diarra.

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Basicamente, Maciej Szpunar separou o diferendo em três questões: 1) a FIFA, enquanto autoridade, atuou contra o direito de liberdade de movimentos de Diarra quando negou a autorização de transferência para o Charleroi?; 2) a obrigação imposta a um clube comprador de cobrir os custos da saída de um jogador do clube anterior afeta a sua possibilidade de realizar negócio?; e 3) as regras do mercado de transferências da FIFA atingem estas consequências pela forma como estão formuladas?. A todas estas perguntas, respondeu que sim. Se o Tribunal de Justiça da União Europeia entender o mesmo, o mercado de transferências tem questões estruturais que terão de ser adaptadas.

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A decisão desta sexta-feira — que não será decisiva, já que o caso ainda vai mesmo voltar aos tribunais da Bélgica — pode cair para o lado da FIFA e permanece tudo na mesma, pode cair para o lado de Lassana Diarra, considerando que um jogador pode sair de um contrato sem colocar em risco a ida para um novo clube ou implicar custos a esse mesmo novo clube, ou pode ter um desfecho no meio das duas opções. Por exemplo, serem exigidas provas de que um clube comprador impulsionou a rescisão unilateral de um jogador sem justa causa.

Uma decisão contra a FIFA, porém, pode retirar o poder nas negociações de transferências e contratos dos clubes e colocá-lo por inteiro do lado dos jogadores (e dos seus agentes). De forma natural, aumentariam as rescisões de contratos e existiria maior incerteza sobre o verdadeiro valor de uma transferência, para além de que os clubes mais ricos e mais poderosos teriam ainda mais formas de persuadir um jogador de uma equipa mais pequena a abandonar um contrato.

O caso decorre há praticamente uma década e Lassana Diarra, que tem agora 39 anos, acabou mesmo por não ir para o Charleroi, assinando pelo Marselha no verão de 2015. Esteve dois anos nos franceses antes de ir um ano para o Al Jazira dos Emirados Árabes Unidos, regressando à Europa para terminar a carreira em 2019 e depois de duas épocas no PSG. De forma mais destacada, conquistou duas Taças de Inglaterra, com Chelsea e Portsmouth, uma La Liga, uma Taça do Rei e uma Supertaça com o Real Madrid e ainda uma Ligue 1, uma Taça de França, uma Taça da Liga e uma Supertaça com o PSG. Somou 34 internacionalizações por França, sem marcar qualquer golo, e esteve no Euro 2008.