A Associação Sindical de Chefias do Corpo da Guarda Prisional (ASCCGP) manifestou esta terça-feira perplexidade pela “ausência de referência às falhas sistémicas” de segurança nas cadeias no relatório sobre a fuga de Vale de Judeus divulgado na segunda-feira.
Em comunicado, a ASCCGP critica ainda que o relatório elaborado pelo Serviço de Auditoria e Inspeção (SAI) da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP) e cujas conclusões sumárias foram divulgadas pelo Ministério da Justiça (MJ) não assinale “a irresponsabilidade governativa que permitiu de forma consciente e deliberada que as condições penitenciárias sejam as atuais nas diversas valências”.
Quanto à decisão de abertura de nove processos disciplinares, em resultado do relatório, a ASCCGP desvaloriza a questão, dizendo que “são procedimentos protocolares e inevitáveis numa situação desta natureza, pelo que de surpreendente nada tem”, preferindo destacar que a “primeira conclusão inequívoca” é a de que “está descartada qualquer cumplicidade, ou suspeita de tal, do corpo da guarda prisional na fuga” de cinco reclusos da cadeia de Vale de Judeus, em 7 de setembro.
Outra conclusão importante do relatório para a ASCCGP é a de que “é manifesto que o efetivo presente” na cadeia no momento da fuga “não era suficiente”, como é “apanágio a nível nacional”.
A ASCCGP questiona também a “imparcialidade e isenção na produção do relatório” em virtude da SAI depender em tudo do diretor-geral dos serviços prisionais e faz a defesa antecipada do chefe da guarda prisional visado alvo de procedimento disciplinar ao dizer que “não cabia ao chefe de serviço a determinação da escala de vigilância aos pátios interiores” da cadeia de Vale de Judeus.
“A escala de serviço é realizada e afixada no mínimo com 24 horas de antecedência. Em muitos estabelecimentos prisionais é realizada por elementos da carreira da guarda“, refere a ASCCGP, observando ainda que em muitas situações são os guardas que “determinam aos chefes de serviço onde ficam escalados os guardas disponíveis”.
“Ao chefe de serviço cabe é agilizar os poucos guardas disponíveis à dinâmica imprevisível do serviço no interesse do mesmo”, refere a ASCCGP, lembrando que, o que era prática comum, ao contrário do que estava regulamentado, era, em caso de necessidade, os primeiros guardas a utilizar serem os que se encontravam de serviço nos pátios.
Segundo a ASCCGP, neste momento, as indicações inverteram-se, pois desde o dia da fuga a “prioridade são os guardas nos pátios”.
“Ousamos colocar uma questão (…) se os reclusos se tivessem evadido pela cozinha, o chefe de serviço teria de determinar guardas à cozinha“, ironizou a ASCCGP.
A mesma associação, presidida por Hermínio Barradas, mostra-se ainda curiosa para perceber a conclusão do relatório de que “instruções escritas não foram cumpridas”.
A ASCCGP reitera que os EP “não têm efetivo suficiente para as tarefas básicas”, recorrendo permanentemente a guardas de folga e ao “abusivo trabalho suplementar”, lembrando que 48 chefes de EP, reunidos em 21 de fevereiro passado, já tinham alertado que “iriam ocorrer fenómenos graves” e que “não tinham solução para apresentar”.
O MJ decidiu abrir nove processos disciplinares na sequência da fuga de Vale de Judeus, visando o ex-diretor, o chefe da guarda e sete guardas prisionais, após recomendação do SAI da DGRSP.
Foram ainda abertos dois inquéritos autónomos: um relativamente ao comissário do estabelecimento prisional, pela “falta de concretização de uma medida de segurança e sobre uma situação de absentismo prolongado”; e outro à Direção dos Serviços de Segurança “para avaliar o seu funcionamento e a capacidade de resposta a situações desta natureza”.