Era uma dúvida que não gerava dúvidas a ninguém, era uma certeza que todos tinham a certeza. Na Cimeira de Presidentes desta quarta-feira, a 13.ª que terá o condão de inaugurar neste tipo de encontros a Arena Liga Portugal, Pedro Proença deverá receber o apoio de quase todos os clubes profissionais para o próximo desafio e irá anunciar oficialmente a candidatura à presidência da Federação Portuguesa de Futebol. Mais: quase em ato contínuo, irá entregar toda a documentação da lista até quinta-feira (último para todos os candidatos), numa parte logística que agora já não obriga a “corridas” por ser tratado de forma digital e não física.

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Desta forma, e depois de um cenário que há um ano apontava para quatro possíveis nomes, o sucessor de Fernando Gomes será votado por 84 delegados entre duas listas: a de Proença e a de Nuno Lobo, presidente da Associação de Futebol de Lisboa que cumpre o último mandato no cargo e cessa funções este mês. Pelo caminho ficaram dois potenciais candidatos que foram sendo falados mas que, por razões distintas, não foram a jogo neste sufrágio: Luís Figo, que foi abordado por um grupo que queria promover um movimento que colocasse o antigo capitão da Seleção na liderança da Federação, e José Couceiro, que neste caso seria uma espécie de garante de continuidade do atual trabalho feito por Fernando Gomes. Ambos “caíram”.

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Assim, e a partir de agora, todas as cartas passam a estar em cima da mesa para uma eleição que irá decorrer no dia 14 de fevereiro. Para já, nenhum dos lados parece duvidar do ascendente de Proença na corrida mas nem por isso Nuno Lobo e a sua equipa fecham o escrutínio. Por um lado, todos recordam a eleição em que António Laranjo era apontado como favorito no sufrágio intercalar de 2012 mas Mário Figueiredo conseguiu virar nas duas últimas noites as contas. Por outro, apontam os caminhos diferentes que as duas candidaturas adotaram neste processo – Lobo anunciou que é candidato e vai agora apresentando o seu projeto para tentar garantir o máximo de votos, Proença foi reunindo com todas as partes envolvidas para chegar a um projeto mais completo e consolidado antes de assumir a candidatura. Um deles será o sucessor de Gomes.

De acordo com o que o Observador apurou, Pedro Proença irá entregar a candidatura com mais de 60 subscritores, naquele que será mais um passo de um “plano” consolidado que tem também todos os nomes principais definidos. Toni, Domingos Paciência e Daniel Carriço, antigos internacionais e capitães de Benfica, FC Porto e Sporting em gerações diferentes, serão três das figuras que irão acompanhar o agora presidente da Liga na corrida às eleições. José Fontelas Gomes e Joaquim Evangelista também estão com Proença, sendo que Luciano Gonçalves deverá deixar a APAF e integrar um lugar na estrutura da Federação ligado à arbitragem. Do lado de Nuno Lobo, João Benedito será o número 2 da lista do líder da Associação de Futebol de Lisboa, num convite que teve luz verde há cerca de duas semanas após um período de reflexão do antigo capitão do Sporting e da Seleção de futsal que perdeu as eleições do clube de Alvalade em 2018.

A esse propósito, esta antecâmara das eleições à Federação acabou por geral um “choque” entre o Sporting e Nuno Lobo, ainda para mais tendo Benedito como braço direito. Frederico Varandas, líder dos leões, conhece há muito o presidente da Associação de Lisboa até fora das questões de futebol mas considerou que não havia condições sequer para pensar num apoio ao rival de Proença tendo em conta o que se passou nos bastidores da famosa Assembleia Geral da Federação que sufragou o pedido do clube verde e branco para reconhecer o Campeonato de Portugal como Campeonato Nacional, algo que foi votado contra pela Associação de Lisboa e com Nuno Lobo a fazer força junto de outros delegados para que recusassem também uma proposta que iria atribuir esse “valorização” a outros clubes lisboetas como Belenenses ou Atlético. Os leões também não gostaram da forma como foi feito o processo de eleição do representante da Associação de Lisboa para delegado para a AG da Federação, avançando com recurso para o Conselho de Justiça.

Também esta terça-feira, um grupo de 14 personalidades ligadas ao futebol nacional e não só fez um apelo público para que Pedro Proença avance com uma candidatura à liderança da FPF. “O percurso associativo e como árbitro e a experiência como dirigente, sobretudo na Liga e na Associação de Ligas Europeias, configuram a preparação, o prestígio nacional e internacional e a capacidade política necessária para as exigências do desempenho do cargo de presidente da Federação Portuguesa de Futebol. O novo ciclo deve ser encarado como uma oportunidade para alavancar o futebol português para os desafios que o aguardam no futuro e que exigem respostas afirmativas e eficazes, através de um plano de ação agregador, capaz de unir toda a comunidade do Futebol em torno de um objetivo comum”, defenderam numa nota enviada à agência Lusa os 14 subscritores, onde estão nomes como José Mourinho, Jorge Jesus, Paulo Sousa, Carlos Queiroz, António Oliveira, Miguel Poiares Maduro, Rui Moreira, Luís Filipe Menezes, António Simões, Américo Aguiar, Carlos Lopes, Luís Osório, Armindo Monteiro e António Saraiva.

Pedro Proença terá compromisso de 75% do caderno eleitoral, Nuno Lobo faz outras contas

Como o Observador revelou ainda em outubro, depois de ter acesso à ata de uma das reuniões que Pedro Proença foi mantendo com vários clubes, associações distritais e associações de classe, voltou a sair a ideia de que teria apoios suficientes para sair vencedor do sufrágio. Porquê? Num encontro onde salientou de novo a vontade de apresentar um “projeto integrador” que seja capaz de ouvir toda a comunidade do futebol e voltou a partilhar e discutir ideias do plano programático com a auscultação de todos os presentes, viu outra vez o apoio manifestado por uma lista de presentes de somava um total de 75% do caderno eleitoral.

Mais de 400 propostas, 18 desafios e os inputs para aproximar sócios: a ata da reunião que “vale” 75% de votos a Proença na corrida à FPF

Nessa reunião realizada numa unidade hoteleira em Gaia no feriado de 5 de outubro, e num cenário mais macro, o atual presidente da Liga explanou os três grandes pontos mais estratégicos do seu projeto: uma Nação do Futebol capaz de alimentar aquilo que é um talento que está na sua gene com uma comunidade unida inspirada na própria história; a missão de inspirar Portugal através do futebol como um motor de desenvolvimento social que possa preservar a essência do jogo através da sua governance; e pilares como “Um só futebol”, excelência desportiva, sustentabilidade e transparência, futebol ao serviço da sociedade e referência no conhecimento e na inovação. Foi aí também que saíram os 18 grandes desafios em termos governativos e desportivos que o projeto liderado por Proença pretender apresentar. Alguns exemplos:

  • modelo mais inclusivo para os sócios da Federação que permita uma aproximação de todos ao órgão;
  • novo modelo de financiamento de associações distritais e regionais;
  • capacidade de ajudar associações de classe a terem estruturas financeiras sustentáveis;
  • relacionamento diferente com a Liga de Clubes, tendo em vista aquilo que será um tema central a breve e médio prazo, a centralização dos direitos televisivos;
  • garantia da solidez financeira de todo o ecossistema em torno do futebol nacional
  • potenciação da marca FPF;
  • criação da Fundação FPF;
  • novo modelo para a arbitragem e disciplina;
  • aproveitamento da oportunidade que será a organização do Mundial-2030;
  • reformulação dos quadros competitivos;
  • estratégia comum entre a formação e o alto rendimento de topo;
  • novo programa para potenciar a afirmação no futebol feminino, num plano nacional e regional.

Apesar desse “conforto”, todos recusam dar a eleição como “fechada”. Aliás, segundo apurou o Observador, a candidatura de Nuno Lobo, que foi criticando esses valores saídos dos encontros de Proença com associações de classe e distritais, acredita que terá nesta altura um valor a rondar os 30 votos, o que significaria que algumas intenções tinham gravitado de um lado para outro. Entre os clubes profissionais, por exemplo, terá havido uma “viragem” com o V. Guimarães, com o seu presidente António Miguel Cardoso a reunir com o futuro antigo líder da Associação de Futebol de Lisboa e a manifestar a intenção de votar na sua candidatura.

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“Não estou há dois anos a fazer campanha encapotada com recursos dos clubes, nem peço ao aparelho da instituição da Associação de Futebol de Lisboa para trabalhar para mim como outros descaradamente fazem. Não peço, nem vou pedir, a nenhum clube ou dirigente para me elogiar. A Federação serve para abrir caminhos, encontrar soluções, apontar novos rumos para o futebol português e não pode servir a quem a preside. A presidência da Federação não é um ponto de partida, uma escala ou um entreposto para ambições desmedidas e utópicas. Não deixaremos que a Federação seja um trampolim para organizações internacionais ou instrumental para o ego de quem não pensa o futebol português, mas apenas no seu umbigo”, referiu Nuno Lobo no discurso de apresentação de candidatura, no final de outubro.

“Não posso ficar em silêncio, esconder-me ou resignar-me perante alguém que representa uma ameaça de regressão a tudo o que o futebol português conseguiu nestes últimos 12 anos. Esta candidatura parte da base para o topo e não ao contrário! Esta candidatura não se esconde nem se enreda em calculismos e oportunismos, não se alimenta de favores e promessas, nem de prémios ou viagens indevidas. Esta candidatura rege-se por parâmetros éticos de que nunca abdicarei”, acrescentou então o candidato, que esta terça-feira apresentou algumas das medidas que terá no seu programa às eleições da Federação.

Candidato à Federação Portuguesa de Futebol Nuno Lobo quer rever distribuição de apostas e VAR

  • revisão da distribuição das verbas das apostas desportivas destinadas ao futebol profissional, com “uma alteração imediata sobre a distribuição da percentagem das verbas das apostas desportivas destinada ao futebol profissional que passará de 25% para 50%, duplicando, assim, o montante atual”;
  • novo modelo de financiamento do custo do VAR, com “um modo de financiamento do custo integral garantindo um futebol mais justo e transparente sem uma carga adicional para as Sociedades”;
  • criação de um fundo de emergência de apoio ao futebol profissional, num montante global de 15 milhões de euros com 500 mil euros para cada SAD da Primeira Liga e 350 mil euros para as da Segunda Liga;
  • criação, em colaboração com o setor bancário, de “uma linha de crédito especial para a aquisição e construção de campos de treino com um prazo de pagamento de dez anos e garantias da Federação, o que possibilitará às Sociedades Desportivas investirem na qualidade das suas infraestruturas”;
  • distribuição de mais recursos para infraestruturas: “Devido à excelente gestão financeira operada na Federação nos últimos anos, é possível canalizar parte dos lucros acumulados para as Sociedades Desportivas. Proponho a alocação de 35 milhões de euros para melhorar infraestruturas desportivas e centros de treino, promovendo a competitividade e fortalecendo o nosso futebol”.

O caso da alegada espionagem, entre duas queixas feitas ao Ministério Público

Ainda antes do anúncio oficial de candidatura de Pedro Proença, a corrida às eleições da Federação começou a conhecer alguns episódios, nomeadamente um em específico que marcou os últimos dias: a alegada guerra de espionagem feita pela Liga de Clubes, não só a Nuno Lobo mas também dentro do próprio organismo.

De acordo com a CMTV, Nuno Lobo terá apresentado uma queixa ao Ministério Púbico contra desconhecidos alegando ter sido algo de espionagem e escutas ilegais. Nessa denúncia apresentada, o candidato refere que as suas comunicações telefónicas foram intercetadas e que algumas informações de índole privado chegaram ao espaço público, nomeadamente imagens de refeições com pessoas do futebol em restaurantes de Lisboa e do Porto que seriam depois partilhadas por Rui Caeiro, diretor executivo da Liga. A par disso, o canal citou também o depoimento de um antigo funcionário da Liga de Clubes que terá falado na existência de câmaras durante as eleições de 2019 para o organismo, por forma a saber os sentidos de voto.

“Isso não me merece qualquer tipo de comentário, é inenarrável. Portanto, penso que a partir da próxima semana todos iremos perceber o porquê de estes desenvolvimentos estarem agora a acontecer. Não me merece qualquer tipo de comentário, falar de coisas positivas é aquilo que eu quero”, comentou Pedro Proença na primeira visita guiada à Arena Liga Portugal, feita na antecâmara da inauguração oficial. Mais: o órgão já tinha avançado que iria iniciar todos os mecanismos legais no sentido de fazer a sua defesa daquilo que entende ser uma estratégia para tentar denegrir a imagem do órgão e dos seus atuais dirigentes.

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