Mais de dois terços dos contribuintes poderão vir a pedir a revisão da liquidação do IRS de 2015, na sequência da cláusula de salvaguarda prometida pelo primeiro-ministro para travar qualquer penalização resultante da reforma deste imposto. Especialistas receiam o colapso do sistema informático do Fisco.

Pedro Passos Coelho assegurou que nenhum contribuinte ficará penalizado pela reforma do IRS que tem como principal finalidade o alívio fiscal das famílias com filhos. Para garantir que os restantes contribuintes, que são a larga maioria, não sai prejudicada na cobrança do IRS do próximo ano, o governo quer que o Fisco disponibilize a liquidação dos impostos pelo regime atual e pelo novo regime, de forma a permitir aos contribuintes a solução mais favorável.

A opção de acionar a cláusula só se coloca em 2016, quando for realizado o acerto final do imposto devido em 2015. O período para ativar a cláusula irá aliás coincidir com o recálculo do imposto previsto no Orçamento do Estado no quadro do crédito fiscal que será devolvido aos contribuintes, caso as receitas dos impostos ultrapassem a meta fixada para 2015.

Segundo os dados mais recentes da Autoridade Tributária, referentes a 2012, as famílias com dependentes a cargo (filhos) representavam menos de 30% do universo de sujeitos passivos de IRS. Os contribuintes sem dependentes, e que em tese podem ganhar com a cláusula de salvaguarda, eram mais de três milhões, sendo que nem todos têm rendimentos para pagar IRS. Mas há também famílias com um filho que segundo simulações já vindas a público, poderão também ficar a perder e ter interesse em conhecer os dois regimes.

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Aumento dos custos administrativos

Em declarações ao Observador, o presidente da comissão da Reforma Fiscal, Rui Duarte Morais , não tem dúvidas de que esta medida, tal como foi explicada nos jornais, irá implicar “aumentos brutais” dos custos administrativos. Para além da duplicação de esforços da máquina fiscal e do impacto que isso terá ao nível do sistema informático, Rui Duarte Morais defende que irá comprometer a simplificação do imposto, que era uma das grandes bandeiras da reforma.

Horas antes, numa conferência sobre a reforma do IRS e o Orçamento do Estado para 2015, Rui Duarte Morais descreveu os planos do governo para assegurar neutralidade fiscal como uma “balbúrdia”. Questionando o recuo perante uma opção sobre o favorecimento da família e da natalidade em detrimento dos restantes contribuintes, o fiscalista, citado pelo Jornal Público, concluiu: “Vamos entrar nesta balbúrdia total que se anuncia como uma das cláusulas de salvaguarda”, de forma a garantir que ninguém irá pagar mais do que este ano.

Colapso informático

Também o presidente do Sindicato dos Impostos tem “sérias reticências sobre a exequibilidade” desta cláusula. Paulo Ralha lembra que a idade média do parque informático do Fisco é de 12 anos e que a medida prometida pelo governo irá exigir maiores necessidades de processamento do sistema informático. E se o sistema já agora sofre quebras dificilmente terá capacidade de responder perante as necessárias alterações de programação que o tornarão ainda mais pesado. Paulo Ralha admite mesmo um cenário similar ao bloqueio que afetou recentemente o sistema Citius do Ministério da Justiça.

O fantasma do colapso informático foi também levantado por José Tribolet, conselheiro do governo na área informática. Em declarações à TSF, o professor universitário revela que já avisou para o risco de colapso e exaustão do sistema informático do Fisco. Mas que estes alertas não foram até agora acolhidos. “Falar com a autoridade tributária é como falar com uma parede”.