Há 55 anos que o metropolitano de Lisboa serpenteia no subsolo de Lisboa. Com 43,2 quilómetros de comprimento e 55 estações, esta rede de transportes evoluiu muito desde o simples Y que começou por desenhar nos mapas da cidade. Entrelaçou-se e chega a cada vez mais pessoas. É essencial para o funcionamento da cidade. Mas como era Lisboa antes de existir o metro?

Artur Machado tinha 13 anos e morava na Rua Augusta, em 1959. A sua memória é de confiança. Lembra-se de ver o funeral do general Carmona a passar na  sua rua, em 1951, e de quando a Rainha Isabel II veio de visita a Portugal e desembarcou no Cais das Colunas, em 1957. Lisboa nos anos 1950: os padeiros que levavam o pão à porta de casa. Em cada esquina da Rua Augusta, existia um polícia sinaleiro. E Artur conhecia-os a todos. Os “autocarros eram verdes e de dois andares, iguais aos que existem lá em Inglaterra”, lembra. Naquela que é uma das ruas mais turísticas de Lisboa hoje, há 55 anos, moravam lá “pessoas normais, que viviam do seu trabalho”.

Nos passeios de domingo, com os amigos, Artur subia a Avenida da Liberdade a pé para ir até ao Pavilhão Carlos Lopes, na época chamado Pavilhão das Exposições, assistir a sessões de filmes de desenhos animados, no parque Eduardo VII.

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Construção da estação de metro do Marquês de Pombal – Arquivo do Metropolitano de Lisboa

 

O trânsito da capital portuguesa, naquela altura, “não tinha nada a ver”. “Nessa época ainda existiam muitas carroças na cidade, que traziam hortaliças”, conta. E ter um carro era um luxo. “Quem tinha dinheiro comprava um carro, um daqueles Citroën antigos, que andavam muito devagar”, diz. Tão devagar, que “não havia o problema de ser atropelado”, lembra, a rir-se.

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Num vídeo publicitário à inauguração do metropolitano de Lisboa, o cenário apresentado é muito mais caótico do que as palavras de Artur Machado descrevem. Estratégia de promoção do Estado Novo?

Quando foi inaugurado, o metropolitano de Lisboa nascia na estação dos Restauradores e ia até Sete Rios ou Entrecampos, o que fazia a rede de transportes ganhar a forma de um Y no mapa. Existiam cabines telefónicas em todas estações, porque ainda faltavam quase quatro décadas para os telemóveis chegarem.

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Cardeal Cerejeira inaugura o Metropolitano de Lisboa, na estação dos Restauradores – Arquivo do Metropolitano de Lisboa

Do dia da inauguração do metropolitano em si, 29 de dezembro de 1959, Artur Machado não se lembra. Mas das escavações que anteciparam essa construção, sim. “Estávamos mais habituados a andar de elétrico e de autocarro”. Por exemplo, na época existia o que chamava de “bilhete operário” para o elétrico. Quem apanhasse o elétrico antes das oito da manhã, tinha a viagem de regresso gratuita.

Andar de metro, de certa forma, tornou-se uma “curiosidade” para Artur, apesar de confessar que a primeira vez que andou ficou “um pouco apreensivo”. Um pouco de medo, uma estranheza inicial. “Depois da primeira vez, foi sempre a andar”, conta ao Observador. “A viagem custava um escudo e cinquenta centavos. No final da linha, podíamos apanhar um elétrico sem gastar mais, para o Lumiar”, lembra, explicando que era um preço acessível para os anos 1950. Na altura, só “o elétrico custava oito tostões (80 centavos)”. Logo no primeiro ano, o metropolitano de Lisboa transportou 15,3 milhões de passageiros. Ou seja, foi um sucesso.

E para que é que Artur passou a utilizar o Metropolitano de Lisboa? “Para ir ao estádio do Sporting ver os jogos. Ia de metro até Entrecampos e depois apanhava o elétrico de ligação até lá.”

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 Da ideia à concretização:

  • O primeiro projeto de um sistema de transporte subterrâneo em Lisboa surgiu em 1888, pela mente do engenheiro militar Henrique de Lima e Cunha. Publicado na revista “Obras Públicas e Minas”, previa já um sistema completo de linhas, formando uma rede.
  • Foram precisos mais 50 anos para a ideia ganhar espaço na discussão pública. Só depois da Segunda Guerra Mundial com a retoma da economia e no seguimento das políticas de eletrificação e aproveitamento dos fundos do Plano Marshall, é que a ideia de construir um metropolitano de Lisboa ganha força.
  • A 26 de janeiro de 1948 é constituída uma sociedade que tinha como objetivo o estudo técnico e económico, em regime de exclusividade, de um sistema de transportes coletivos fundado no aproveitamento do subsolo da cidade. No ano seguinte, a 1 de julho de 1949, a concessão foi autorizada.
  • Os trabalhos de construção iniciaram-se em 7 de agosto de 1955 e, quatro anos depois, em 29 de dezembro de 1959, o novo sistema de transporte foi inaugurado.