“Brevemente” foi a resposta da EGEAC quando questionada esta semana pelo Observador sobre a data do concurso para cedência a privados da gestão artística do Teatro Maria Matos. Já a vereação da Cultura da Câmara de Lisboa remeteu todas as dúvidas precisamente para a EGEAC (Empresa de Gestão de Equipamentos e Animação Cultural), o que deixa por esclarecer quais os motivos da indefinição.
No capítulo da anunciada reorganização dos teatros municipais da capital, o futuro do Maria Matos é a incógnita principal e o tema que tem levantado mais críticas. A Câmara não alterou o prazo anunciado para o início da cedência a privados — setembro deste ano —, mas o tempo é cada vez mais escasso para que os próximos responsáveis pela sala consigam programar com antecedência. Esta preocupação já tinha sido evidenciada pela vereadora da Cultura, Catarina Vaz Pinto, em entrevista ao Observador há quase três meses.
Uma certeza, para já: está prestes a ser revelado o nome de quem irá dirigir o Teatro do Bairro Alto (casa do Teatro da Cornucópia durante quatro décadas, até à extinção da companhia, em 2016). O concurso de recrutamento foi lançado pela EGEAC a 28 de fevereiro e terminou na sexta-feira, 6 de abril. Foram recebidas 26 candidaturas, adiantou a empresa municipal, que prevê ter um nome escolhido até ao fim de maio.
O júri do concurso para o Teatro do Bairro Alto é composto por cinco elementos: Joana Gomes Cardoso (presidente da EGEAC), Sofia Campos (administradora do Teatro Nacional D. Maria II), Rui Horta (coreógrafo e diretor de O Espaço do Tempo, em Montemor-o-Novo), Maria João Guardão (jornalista) e Pedro Costa (professor no ISCTE).
De acordo com o anúncio do concurso, o futuro diretor artístico, ou diretora, deverá desenvolver um projeto de “serviço público” que seja “particularmente flexível” e abranja teatro, dança e música, tirando partido da “black box” (tipo de palco para artes performativas consideradas experimentais).
Polémica começou em dezembro
A cedência a privados da gestão artística do Maria Matos foi anunciada a 17 de dezembro pela vereadora da Cultura, Catarina Vaz Pinto, em entrevista ao jornal Público, o que gerou várias reações negativas. Um grupo de cidadãos entregou na Assembleia Municipal de Lisboa a petição “Por Uma Gestão Pública do Maria Matos”, com mais de 2.500 subscritores.
As críticas surgiram de quase todos os partidos políticos, até mesmo do Bloco de Esquerda, que tem um acordo com o PS para a governação camarária. Uma das poucas vozes favoráveis foi a de Teresa Leal Coelho, vereadora do PSD. O PCP convocou um debate de urgência na Assembleia Municipal, a 16 de janeiro, e dele se concluiu que o presidente da Câmara, Fernando Medina, e a vereadora Catarina Vaz Pinto não iriam recuar na decisão.
A mesma responsável explicou que a mudança na sala da Avenida de Roma é para acontecer até setembro deste ano e “não pode ser vista de forma isolada, mas como parte de um conjunto de alterações nos teatros municipais” da capital. Isto porque, em simultâneo, a Câmara vai reabrir o Teatro Luís de Camões, em Belém, com a intenção de transferir para ali a programação infantojuvenil do Maria Matos. Não haverá concurso público para a direção artística deste equipamento porque ela será entregue à mesma equipa que hoje desenvolve a componente infantojuvenil na Avenida de Roma.
A vereadora decidiu também que a Câmara tomaria posse, através de arrendamento ao Centro de Amadores de Ballet, do Teatro do Bairro Alto, na Rua Tenente Raul Cascais. O valor da renda será inferior aos seis mil euros mensais que a Cornucópia pagava com apoio do Ministério da Cultura.
O orçamento anual de cerca de 700 mil euros do Maria Matos é também transferido para aqueles dois equipamentos, de acordo com a Câmara. A vereadora previa ter lançado em simultâneo os concursos para o Teatro do Bairro Alto e para o Maria Matos, o que entretanto não se verificou.
Vereadora foi “surpreendida”
Na base deste polémico reordenamento terá estado a saída, em outubro do ano passado, de Mark Deputter, diretor artístico do Maria Matos durante oito anos e o principal responsável pelo protagonismo que a sala entretanto assumiu na capital. Deputter é agora administrador e diretor artístico da Culturgest.
“Tudo isto foi em cima do acontecimento”, disse Catarina Vaz Pinto ao Observador, em janeiro. “Na verdade, também fiquei surpreendida com a necessidade de ter de alterar a direção artística do Maria Matos. Mas a política é responder ao contexto.” Estas explicações não convencem os críticos, que temem pela qualidade da programação do Maria Matos e não aceitam uma gestão que não seja pública.
O mais recente desenvolvimento veio da Assembleia Municipal, que aprovou por maioria, a 20 de março, uma recomendação à Câmara sobre o Maria Matos (com votos contra de PCP, Bloco, Os Verdes, PAN, PPM e dois deputados independentes; votos a favor de PS, PSD, CDS, MPT e quatro deputados independentes).
O texto da recomendação pode ser interpretado como indicador do caderno de encargos a cumprir pelas entidades que se candidatem à gestão da sala. Entre outros, são estabelecidos dois objetivos: programação “de cariz generalista” e “condições especiais de acesso à comunidade residente afeta ao local do teatro, bem como à terceira idade, infância, juventude e cidadãos portadores de deficiência”.