“Esta equipa já fez algo único ao qualificar-se para esta fase mas agora estamos concentrados e vamos fazer de tudo para ir mais longe. Queremos muito ir a Munique. A Itália tem tido um grande Europeu e tem sido a equipa mais impressionante da competição mas também temos as nossas qualidades. Somos outsiders mas, mesmo que tenhamos apenas 10%, podemos passar. Pode parecer um desafio impossível, porque há muito tempo que a Itália não tem uma derrota, mas vai perder algum dia…”, dizia no lançamento Franco Foda, selecionador da Áustria.

Se existia um confronto teoricamente desequilibrado era aquele que envolvia a Itália e os austríacos, no Estádio de Wembley, mesmo considerando que o conjunto de Alaba e companhia conseguiu somar seis pontos na fase de grupos após triunfos com Macedónia do Norte e Ucrânia (perdeu apenas com os Países Baixos). No entanto, a imagem que ficou da squadra azzurra na primeira fase parecia demasiado forte para cair logo nos oitavos, até por ter sido a única formação de sempre a acabar os três jogos dos grupos só com vitórias e sem sofrer golos, algo que nem mesmo as muitas alterações para a última jornada mudou (1-0, País de Gales). Aliás, as dúvidas nos onzes estavam relacionadas com a Itália, entre Locatelli ou Verratti e a possibilidade de haver Chiesa de início.

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Afinal, houve apenas uma alteração em relação ao esperado, assumindo-se que Chiellini não iria mesmo estar apto e cederia o lugar a Acerbi: apesar da entrada verdadeiramente fantástica de Locatelli na equipa, Verratti chegou para ficar e assumiu uma posição ao lado de Jorginho e Barella. Era com esta estrutura que a Itália visava os quartos e não só: por um lado, podia conseguir ser a primeira geração de sempre a fazer 31 jogos sem perder, algo que aconteceu apenas uma vez entre os anos de 1935 e 1939 (só a França conseguiu algo semelhante nos anos 90); por outro, Donnarumma poderia bater a série de Dino Zoff na década de 70, quando esteve 1.143 minutos sem sofrer golos na seleção (atualmente o jovem mas experiente guardião ia com 1.056).

A primeira parte manteve ambos os registos em aberto: depois de dez minutos iniciais de algum equilíbrio, a Itália subiu as linhas sem bola, acampou no meio-campo contrário e foi somando remates perigosos entre uma maior posse dos austríacos. Barella viu Bachamann negar um golo com os pés, houve outras iniciativas quando Spinazzola subia pela esquerda ou quando Verratti tinha mais tempo para pensar o jogo e Immobile acertou mesmo no poste com um remate de meia distância mas o intervalo chegaria mesmo em Wembley sem golos.

As estatísticas apontavam bem esse domínio: 11-1 em remates, 16-2 em ações na área contrária, 91% de eficácia de passe, 56% de posse. Nessa fase, a Itália merecia marcar um golo; a partir daí, a Áustria não merecia sofrer um golo. Mais do que isso, podia ter marcado duas vezes, com Alaba a atirar de livre direto a rasar a trave e Arnautovic a marcar num golo anulado pelo VAR (que invalidou também uma jogada de possível penálti de Pessina de novo por fora de jogo). O jogo iria mesmo para prolongamento, com estatísticas bem mais divididas do que no primeiro tempo, mas o arranque do tempo extra acabou por ser fatal para os austríacos, com Chiesa a receber de cabeça um cruzamento de Spinazzola, a preparar de cabeça e a rematar cruzado para o 1-0 (96′). Pessina ainda aumentaria após trabalho de Acerbi (115′), a Áustria reduziu por Kalajdzic num canto mas os tais dois recordes foram mesmo batidos, a vitória chegou e Bélgica ou Portugal vão encontrar a squadra azzurra.

O jogo a três toques

Para recordar

Os golos apontados por Chiesa e Pessina representam bem uma das grandes forças que ainda não tinham sido vistas na seleção italiana: a qualidade que Roberto Mancini tem no banco. É preciso mais no meio-campo, mesmo que Verratti não estivesse propriamente a fazer um mau jogo, entram Pessina e Locatelli; Immobile tenta de todas as formas sem marcar, entra Berardi (e ainda há Raspadori); Berardi não está a render, vai para o jogo Chiesa – e ainda há Bernardeschi se a ideia passar por aumentar a largura e o jogo exterior. Se a Itália conseguiu aquele arranque a todo o gás na primeira parte do prolongamento com dois golos a dez minutos muito deve às subidas de Spinazzola mas só mesmo um grandes jogador como Chiesa, mesmo recebendo a bola com tamanhas dificuldades, conseguiria ter o discernimento para rematar cruzado, superar Bachamann e desbloquear o jogo.

Para esquecer

Aquele que foi um dos melhores meio-campos da primeira fase sofreu uma alteração com a entrada de Verratti mas caiu em relação ao que tinha apresentado (exceção feita a Jorginho, que parece não saber jogar mal). Aliás, em certas fases os movimentos de Verratti e Barella até pareciam literalmente cruzar-se, o que facilitava mais a organização defensiva sem bola da Áustria. Não foi por acaso que a dupla saiu a meio da segunda parte – com Verratti a “pagar” mais por esse problema do que o companheiro do Inter, que esteve mesmo fora dela – mas sem superar, na perspetiva negativa, a exibição de Berardi: o avançado do Sassuolo, que tem no banco duas sombras como Chiesa e Bernardeschi, não conseguiu desequilibrar no 1×1, não apareceu em zona de finalização, não combinou nas subidas de Di Lorenzo e acabou por ser facilmente anulado pela Áustria e por David Alaba. Aquele pontapé de moinho antes de ser substituído a acertar em rosca na bola mostrou bem a noite desastrada.

Para valorizar

O sucesso não foi o maior, longe disso, mas Arnautovic ainda passou pela Serie A e pelo Inter, por empréstimo do Twente, em 2009/10. Não vingou, condicionado também pela recuperação a uma intervenção cirúrgica ao pé direito, mas fez três jogos. Só mesmo em Itália o avançado não conseguiu estar num plano de destaque, entre outras paragens por Países Baixos (Twente), Alemanha (Werder Bremen), Inglaterra (Stoke City e West Ham) e China (Shanghai Port), onde ainda está, com números interessantes. Dar nas vistas, isso, nunca falha: ou são os conflitos raciais, ou foi o roubo de carro de Eto’o, ou foram as garrafas de vodka ou de gin (apenas um resumo das polémicas, feito pelo El Mundo). Com a Itália, foi mais do que isso: teve uma jogada interessante onde passou por três adversários antes de cruzar para Donnarumma, marcou no segundo tempo num lance que acabaria por ser anulado e deu mais uma mostra de tudo o que podia ter sido no futebol europeu num outro contexto.