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Nasceu a 23 de dezembro de 1943, em berço alemão; aos 32 anos, tornou-se rainha, quando se casou com o rei sueco Carl XVI Gustaf; em 2011, ganhou o estatuto de (mulher) monarca há mais tempo no trono da Suécia. Silvia Renate Sommerlath faz este domingo 75 anos. Uma vida marcada pela dedicação a causas sociais, por empregos de civil e pela luta para que a sua filha mais velha, a princesa Victoria, pudesse um dia reinar. Reconhecida por ser uma mulher culta, fala seis idiomas — sueco, alemão, francês, espanhol, português e inglês — além de também saber comunicar em língua gestual. Teve três filhos: Victoria, a princesa herdeira, atualmente com 41 anos, Carl Philip, de 39, e Madeleine, de 36. Atualmente, os reis têm sete netos. A mais velha tem seis anos, a mais nova nascida em março deste ano.
O aniversário da rainha começou a ser assinalado na passada terça-feira, quando a família real sueca se reuniu no Oscar Theatre, em Estocolmo, para assistir a um espetáculo de tributo à monarca. Presente esteve também a filha mais nova dos reis da Suécia. Casada e com três filhos, Madeleine mudou-se recentemente com a família para a Florida, nos Estados Unidos. O momento contou com atuações de diversos artistas, com alguns presentes oferecidos por convidados, mas também com pequenos discursos da própria família real. “Para mim, és um grande exemplo e tenho muito orgulho em seres minha mãe. Adoro-te”, disse Victoria. Madeleine também dirigiu algumas palavras à mãe, sublinhando o trabalho feito junto de crianças e comunidades carenciadas. “Agora, tenho de parar de falar, antes que comece a chorar”, terminou.
A noite de quinta-feira ficou marcada por uma receção no palácio real. Em vez de presentes, a rainha pediu doações a instituições de solidariedade social e chegou mesmo a identificar três organizações que gostaria que fossem beneficiadas: World Childhood Foundation, Mentor Foundation e Silviahemmet.
1943-1976: a vida antes do casamento
Silvia nasceu na cidade alemã de Heidelberg, na Alemanha, filha de Walther Sommerlath, homem de negócios e presidente de uma empresa brasileira controlada pela metalúrgica sueca Uddeholm. A mãe, Alice Soares de Toledo (Alice Sommerlath, após o casamento, em 1925), era brasileira, pertencente a uma família aristocrata de São Paulo e filha de Artur Floriano de Toledo, alegadamente um descendente direto de Afonso III de Portugal e da sua amante, Maria Peres de Enxara. Walther e Alice casaram-se no Brasil, depois mudaram-se para a Alemanha, anos mais tarde regressaram ao Brasil e, já na década de 50, voltaram a viver em Heidelberg.
Silvia, a mais nova de quatro irmãos (Hans Jörg Sommerlath, dois anos mais velho do que a atual rainha, morreu em 2006; os outros dois irmãos continuam vivos), acabou por viver a sua infância entre dois continentes. Durante os dez anos que passou no Brasil, entre os quatro e os 14, estudou no Colégio Visconde de Porto Seguro, em São Paulo, uma instituição de ensino de tradição alemã. Após o regresso à Alemanha Ocidental, prosseguiu estudos em Düsseldorf e em Munique e acabou por se formar em tradução, com especialização em língua espanhola.
O idioma viria a ser determinante para o seu percurso profissional e também afetivo. Em 1972, colaborou com o consulado da Argentina em Munique, durante os Jogos Olímpicos de Verão, ocasião em que conheceu o então príncipe herdeiro da Suécia, Carl Gustaf. Quatro anos depois, trabalhou como diretora de protocolo dos Jogos de Inverno em Innsbruck, na Áustria. Pelo meio, chegou a ser também assistente de bordo. Namorou durante quatro anos com o futuro rei da Suécia. Em setembro de 1973, Carl Gustaf foi entronizado rei, após a morte do avô, Gustaf VI Adolf da Suécia. O noivado foi anunciado em março de 1976, com o casamento a realizar-se apenas três meses depois. Ele tinha 30 anos, ela 32. Carl Gustaf já era rei e, com o matrimónio, Silvia Sommerlath tornou-se, automaticamente, rainha consorte da Suécia.
“Dancing Queen”: o tributo dos Abba na véspera do casamento
Nessa altura, Silvia, que havia mantido uma vida relativamente normal até ao casamento, já tinha conquistado a admiração dos suecos. Casaram-se a 19 de junho de 1976, na Catedral de Estocolmo. O vestido, uma criação de alta-costura da casa Dior, havia sido desenhado pelo francês Marc Bohan. O país não assistia a um casamento de um monarca desde 1797, ano em que Gustav IV Adolf da Suécia, que havia assumido o trono apenas com 14 anos, se casou com Frederica de Baden. Na noite que antecedeu a cerimónia, a The Swedish Opera House recebeu um espetáculo de celebração conhecido como Royal Variety Performance. Nessa noite, os Abba subiram ao palco vestidos com trajes oitocentistas, tal como os membros da orquestra e do coro. Em homenagem à futura rainha, cantaram ao vivo, pela primeira vez, o tema “Dancing Queen”, como pode ver neste vídeo:
Após a atuação, a transmissão mostrou o casal real, no seu camarote, acompanhado pelos pais da noiva. Embora a música não tenha sido composta para a futura rainha, voltou a ser recuperada para uma homenagem a Silvia em 1993, a propósito do seu 50º aniversário. Aí, já depois da separação do grupo musical sueco, Anni-Frid Lyngstad, um dos membros, voltou para entoar a canção, primeiro a solo, depois acompanhada por um coro.
No livro The Royal Year 2016, lançado no final desse mesmo ano, Silvia recordou a sua chegada à Suécia. “Para mim, a Suécia não era estrangeiro. No Brasil, o meu pai trabalhou para a empresa sueca Uddeholm. Muitos suecos, a partir daí, iam ao Brasil e à nossa casa. Levavam arenque, livros e música. (…) Podia ter sido solitário. A mãe do rei, a princesa Sibylla já não era viva. Nem estava lá a rainha Louise para me dizer quais as tarefas de uma rainha. Mas a princesa Christina estava lá. A irmã do rei apoiou-me muito”.
A relação do pai com o partido nazi
Entre 1939 e 1943, o pai, Walther Sommerlath, tomou conta de uma empresa de fabrico de armas, a Wechsler & Hennig, em Berlim. Antes disso, ainda no Brasil, tinha trabalhado para uma metalúrgica alemã. Décadas mais tarde, já em 2002, o jornal sueco Arbetaren, com base em registos oficiais da época, afirmou que Sommerlath se teria juntado ao NSDAP/AO, braço internacional do partido nazi, enquanto residia na América da Sul. Em 2010, 20 anos após a morte de Walther, os rumores em torno das ligações do pai da rainha a Hitler reacenderam-se, desta vez com um documentário exibido pela estação televisiva sueca TV4.
“A verdade sobre o pai da rainha Silvia, a qual prefere não admitir para si própria nem para a sua família, é que se juntou ao partido nazi de Hitler, a 1 de dezembro de 1934”, afirmou o jornalista de investigação sueco Bosse Schon. “Além disso, durante o período que esteve no Brasil, o pai da rainha Silvia trabalhou para a empresa alemã Acos-Burderus-do Brasil-Ltda, a qual usou prisioneiros de guerra como mão-de-obra escrava na Alemanha Nazi”, acrescentou o jornalista.
A polémica não ficou por aqui. Novos documentos revelaram que Sommerlath tinha, na realidade, comprado a Wechsler & Hennig a Efim Wechsler, um empresário judeu, uma transação que ficou bastante abaixo do real valor da fábrica. A prática, comum na época, foi apontada como uma das expropriações de que foram alvo as famílias e os empresários judeus. A rainha Silvia acabou mesmo por encomendar um relatório a Erik Norberg, especialista em assuntos da II Guerra Mundial, para esclarecer a desconfiança. Afinal, o pai só tinha ajudado o empresário judeu a reunir o dinheiro necessário para poder sair do país, conclusão desacreditada por muitos.
Rainha Silvia: solidariedade e feminismo
Victoria, a primeira filha do casal, nasceu a 14 de julho de 1977. Carl Philip nasceu dois anos depois e, em 1982, nasceu a terceira e última princesa, Madeleine. Com uma primogénita sem prioridade na linha de sucessão ao trono, já que a lei sueca dava prioridade aos descendentes homens, a rainha Silvia intercedeu junto do rei para que esse preceito fosse alterado, logo após o nascimento do segundo filho. A 1 de janeiro de 1980, a Suécia tornava-se na primeira monarquia europeia a optar por um sistema que dá igual direito ao trono a homens e mulheres. A partir desse dia, em vez de Carl Philip, Victoria passou a ser a princesa herdeira. A mesma alteração à lei foi feita pela monarquia britânica em 2013, ou seja, 33 anos depois. No Reino Unido, as monarcas reinantes são figuras históricas, incluindo a atual rainha Isabel II, no entanto, todas elas subiram ao trono por não terem irmãos homens.
Ao longo de 42 anos como rainha consorte, Silvia tem estado associada a causas sociais não só na Suécia, mas um pouco por todo o mundo: trabalha com a Organização Mundial de Saúde desde 1994, no papel de mentora de ações internacionais; em 1999, cofundou a World Childhood Foundation; e uma década depois, esteve envolvida na criação do Global Child Forum.
A demência na terceira idade acabou por ser a causa a que a rainha dedicou mais atenção. Em 1996, criou a Silviahemmet, organização sueca dedicada, até hoje, à formação de profissionais de saúde especializados no acompanhamento destes doentes, mas também à investigação nesta área da saúde mental. Na origem desta prioridade poderá ter estado o facto de Alice Sommerlath, mãe da rainha, ter sofrido de demência nos últimos anos da sua vida. Alice morreu em março de 1997, tinha 90 anos.
Em dezembro de 2016, a rainha foi notícia após uma hospitalização inesperada, na sequência de uma gripe que se arrastava há dias e de algumas tonturas. “A rainha está hospitalizada para observação e para realizar vários exames clínicos. Encontra-se bem, dadas as circunstâncias”, afirmou, na altura, a casa real em comunicado.
Os fantasmas de Drottningholm e o jantar com Marcelo
Em janeiro de 2017, Silvia protagonizou um momento insólito. Num documentário transmitido pela PSTV, a rainha disse acreditar que o Palácio de Drottningholm, onde vive, em Estocolmo, está assombrado por fantasmas. “Há pequenos amigos… fantasmas. Eles são muito simpáticos mas, às vezes, sentimos que não estamos completamente sozinhos”, citou a Agência France Presse, antes mesmo da estreia do documentário. “Há muita energia nesta casa. Era estranho se ela não ganhasse formas”, acrescentou a rainha, ao referir-se ao palácio construído em 1766 e classificado pela Unesco como património mundial da Humanidade.
Também no ano passado, em maio, a rainha da Suécia passou por Portugal. Em 2008, os reis já tinham visitado o país, mas desta vez, Silvia veio sozinha. A visita começou no Funchal, onde inaugurou um novo edifício do lar de terceira idade do Hospício Princesa D. Amélia, mandado construir no século XIX pela imperatriz do Brasil. Nessa ocasião, a rainha reiterou o apoio financeiro dado, há décadas, pela coroa sueca à instituição portuguesa. Da Madeira, Silvia voou para Lisboa e jantou com Marcelo Rebelo de Sousa no Palácio de Belém.