O espetáculo chama-se Forever Amy e é uma homenagem à artista que perdeu a vida com apenas 27 anos, em julho de 2011. Dale Davis – seu amigo mais próximo sobre quem Amy dizia ser a melhor companhia em qualquer lugar – diz que este se trata de um espetáculo único de celebração e honra das canções que marcaram a carreira da artista, que editou apenas dois discos durante a sua curta carreira, mas que ficaram para sempre na história da música.
Bronte Shand, a cantora que subirá aos palcos portugueses (esta terça-feira, no Casino do Estoril; 30 de março, no Teatro Municipal da Guarda; e 1 de abril no Teatro José Lúcio da Silva, Leiria) era uma adolescente que seguia e estudava a carreira de Amy Winehouse desde os 8 anos. “Ela é o mais próximo em termos de atitude, som e capacidade vocal que alguma vez pude escutar, depois da morte de Amy. É uma pessoa muito autêntica e estamos muito entusiasmados por ela ter se juntado ao espetáculo”, diz Dale Davis.
Como surgiu a ideia de reunir a banda e criar este espetáculo Forever Amy?
Nós sempre trabalhámos como banda. Mesmo depois da morte de Amy, costumávamos tocar num clube noturno, e isso aconteceu durante uns três meses após a terrível partida da Amy. Em 2016 fizemos algumas tours com a banda. Tocamos em diferentes clubes, com outras vocalistas, e nem sempre interpretamos as músicas da Amy.
A escolha da cantora Bronte Shand foi um processo difícil?
O processo foi difícil e levou tempo. O público precisa de tempo para considerar alguém que poderá querer imitar Amy. Não queríamos pessoas a tentar imitá-la e foi difícil e demorado até encontrar alguém capaz de cantar na sua própria forma. Conhecemos esta cantora e pensei que seria a pessoa ideal. A atual vocalista tem estudado a carreira da Amy desde os seus 8 anos. Não preciso de alguém parecido com a Amy, ou que interprete como ela, precisava apenas de alguém que pudesse honrar as suas canções.
Como é que acha que ela se sente neste papel?
No início julgo que foi um pouco estranho para ela. De uma certa forma, está a interpretar alguém que a influenciou muito desde criança, mas é uma grande cantora no seu estilo. Esta é apenas uma parte do nosso espetáculo ao vivo, vamos tocar outras coisas, com outras pessoas. Se tivesse de fazer este espetáculo para sempre não sei como ia funcionar, mas é sempre uma honra e um prazer tocar coisas da Amy. Bronte Shand também se divertiu imenso ao cantar estas músicas.
Como é para vocês como banda subir ao palco novamente?
Claro que houve um antes e depois da morte da Amy. Muitos de nós somos amigos há mais de vinte anos, desde o arranque da carreira da Amy, de quando começamos a trabalhar com ela. Com esta vocalista, quando vimos e ouvimos as palavras do público, há muita gente grata por talvez terem sido demasiado novos para ver a Amy ao vivo. E isto é o mais próximo que eles conseguem.
Quando a Amy começou o negócio da música estava dominado pela pop e rock. E de repente surge esta personagem totalmente fora do comum, artisticamente honesta, com um folk incrível.
Ela conseguia fazer tudo, conseguia cantar e escrever canções. Amy era simplesmente uma força da natureza, tinha um poder imenso, era abençoada. Conheci a Amy pouco antes dela começar a carreira. Eu tocava baixo num club de Londres onde ela apareceu. E foi engraçado, porque quando andávamos a fazer audições para uma vocalista, eu reconheci-a imediatamente. Ela era uma pessoa calorosa, generosa e divertida. Queria saber sempre de tudo o que a banda estava a fazer.
Tocaram juntos o primeiro disco e alguns dos temas de Back to Black. Como era trabalhar com ela em estúdio?
Era incrível porque fazia tudo em um ou dois takes de gravação. Era o tipo de pessoa que chegava ao estúdio e gravava uma canção em quinze minutos. Lembro-me de uma música em particular que ela gravou, uma das canções de Back to Black, em menos de meia hora .
Back To Black é um disco catártico, intenso, mas também de alguém de coração partido, emocionalmente perdida.
Nós fizemos algumas das canções desse segundo álbum e uma série de covers. Quando fomos com ela para o estúdio, ela conseguia fazer imensa coisa em 15 minutos. Ouvia a música, dizia que soava bem e começava a cantar. Pouco depois estava gravado.
Falavam sobre o estado emocional dela? No seu site diz que era a melhor pessoa para ir a qualquer lado.
Entre membros de uma banda ou de um projeto com reconhecimento internacional, os dias são muito diferentes do que as pessoas que não participam conseguem imaginar. Como éramos amigos falávamos um pouco de tudo. Emocionalmente ela era tão expressiva e passava todos os seus sentimentos para a música. No seu primeiro disco isso acontece. No segundo percebe-se que ela transformou toda a sua tristeza em criatividade para fazer um grande disco.
Num dos últimos concertos que deu em Portugal, no Rock in Rio, ela estava em muito mau estado. Mas a banda nunca cedeu, dançavam, mantinham o show. Como era lidar com essa mistura de sentimentos em palco?
Durante os primeiros quatro anos ela era incrível todas as noites. Mas acho que as pressões típicas da vida que envolve uma figura com a dimensão da Amy Winehouse levaram-na a performances mais sofríveis. Para mim era um pouco doloroso, mas eu queria apenas olhar por ela, saber que passava por um tempo mais negro. Mas ela era sempre generosa e dava o seu melhor à banda, e nós queríamos muito que ela sentisse que o nosso apoio estava lá. Foi um período difícil.
Estava à espera da morte de Amy?
Foi uma surpresa. Acho que algumas pessoas querem apenas viver depressa e morrer cedo. Mas enquanto ela estava viva deu tudo o que podia para ultrapassar os seus próprios limites. Quando se puxa os limites passas tanta energia para o mundo que te podes esvaziar. O burnout também existe na música.
A música é uma grande expressão da arte, mas também um negócio. Acha que a Amy não estava preparada para lidar com as pressões de toda a indústria?
Houve um tempo que sim, que ela era muito pressionada, e para uma mulher estar constantemente nas capas dos jornais é muito difícil, mais do que se for um homem, porque a imprensa trata homens e mulheres de forma diferente. Existe uma maior pressão sobre as mulheres em geral. Andar na rua, por mais incógnita que quisesse passar, tinha sempre gente a fotografar, a abordá-la. Não se tenham ilusões, isto era difícil para ela.
O que podemos esperar do concerto de Lisboa?
Vai ser o show original, mas com outra cantora. O espetáculo Forever Amy foi muito bem recebido pela crítica e pelo público. Eu posso dizer que a Amy continua a viver em nós. A nossa setlist será uma mistura do primeiro disco e de Back to Black, porque não tocamos nenhuma das músicas que estavam a ser gravadas, hoje a título póstumo.
Eras um grande amigo, tanto que ela escreveu que o “Dale era a melhor companhia em qualquer lugar”. Que significado tem para si?
Aquilo significa imenso para mim. Ficámos muito amigos e lembro-me que na véspera da morte dela, a Amy quis estar com a minha família, com o meu filho, e tinha assim tantas histórias sobre ela, sobre a grande pessoa que ela era. Nem sempre histórias felizes.