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Governo vai rever regime do trabalho doméstico

Ministério vai criar grupo de trabalho para "revisitar" um regime que existe desde 1992, incluindo as regras contributivas e prestacionais. Proposta legislativa deverá chegar na segunda metade do ano.

O Governo vai criar um grupo de trabalho para “revisitar” o regime de Segurança Social do serviço doméstico, reavaliando matérias como a proteção social dos trabalhadores, assim como o regime contributivo. O grupo já estava nos planos do Ministério do Trabalho, mas a sua criação foi acelerada com as notícias recentes de que a criminalização do trabalho não declarado vai também abranger os particulares que recorram ao serviço doméstico. O objetivo é melhorar a proteção destes trabalhadores, que muitas vezes estão na economia informal, levando-os para dentro do sistema, o que determina a contratualização do serviço, o pagamento à segurança social, a existência de seguros.

O trabalho doméstico é hoje enquadrado num regime autónomo, fora do Código do Trabalho, por um decreto-lei que data de 1992 e que desde então não teve alterações de fundo. A ideia do Governo será manter o trabalho doméstico num regime autónomo, até pelas suas “especificidades”, melhorando a proteção dos trabalhadores no presente e para efeitos de pensão de velhice. “É um sistema próprio que tem muitas especificidades, onde há situações de multiemprego, de alguma informalidade que é socialmente praticada por muita gente”, refere Miguel Fontes, secretário de Estado do Trabalho, em declarações ao Observador.

O que vai, ao certo, ser estudado e alvo de propostas legislativas pelo grupo de trabalho? “O objetivo é estudar o regime de Segurança Social do serviço doméstico“, começa por dizer Miguel Fontes. Isso inclui reavaliar a forma como as contribuições são feitas, assim como a proteção social incluindo no acesso ao subsídio de desemprego. “Um dos objetivos deste grupo de trabalho é reavaliar o enquadramento legal do serviço doméstico, no âmbito contributivo e prestacional“, afirma.

Grupo de trabalho vai funcionar no âmbito do Ministério do Trabalho liderado por Ana Mendes Godinho (à esq.), sob orientação do secretário de Estado do Trabalho (à dir.) e da Segurança

LUSA

A ideia será, mesmo, distinguir o que é trabalho por conta de outrem do que é trabalho independente: “Uma pessoa que faz duas horas por semana na casa de alguém que não declara não pode ter o mesmo enquadramento de alguém que trabalhe um horário de tempo completo numa casa de família”. Atualmente, se o trabalhador receber à hora, o empregador tem de declarar, no mínimo, 30 horas por mês, mesmo que o trabalhador faça menos horas do que isso, e tem de pagar Segurança Social sobre essas 30 horas. Além deste regime horário existem ainda mais dois regimes: o convencional mensal e o de contribuição pela remuneração real. De qualquer forma existe a obrigação de declarar o serviço doméstico à Segurança Social e proceder às contribuições para que o trabalhador tenha proteção na doença, parentalidade, invalidez, velhice e morte. Mas só as contribuições com base na remuneração real — que tem de ter um mínimo equivalente ao salário mínimo nacional, de 760 euros — é que dão acesso ao subsídio de desemprego.

Outro objetivo é “agilizar” o registo. Atualmente, um particular que queira comunicar a existência de um contrato de trabalho doméstico tem de o fazer ou presencialmente junto dos serviços da Segurança Social ou através de email, mas não é ainda possível através da página da Segurança Social. “É um momento em que vamos aproveitar para estudar, enquadrar e depois reavaliar o enquadramento legal deste serviço doméstico, no âmbito do regime contributivo e prestacional”, sintetiza o secretário de Estado.

Para esta avaliação serão tidas em conta boas práticas internacionais. “A ideia é sistematizar a informação disponível, o enquadramento legal e a caraterização do próprio regime de Segurança Social do serviço doméstico. É refletir, nomeadamente em função de boas práticas internacionais. Queremos ver como este problema é enquadrado e resolvido noutras latitudes”, explica Miguel Fontes.

O grupo de trabalho, criado por um despacho que será publicado em Diário da República nos próximos dias, terá um mandato até 30 de junho, que pode eventualmente, se necessário, vir a ser prolongado. Ao fim desse prazo, o grupo terá de apresentar um relatório final “com contributos e recomendações na matéria”, lê-se no despacho, assinado pelos secretários de Estado do Trabalho e da Segurança Social, a que o Observador teve acesso. Se o prazo previsto se mantiver, o objetivo é que, “ainda no decorrer deste ano, possa haver consequências” do trabalho do grupo, diz Miguel Fontes.

Governo não estava a pensar no serviço doméstico quando propôs criminalização do trabalho não declarado

Segundo noticiou o Negócios na semana passada, uma das alterações da chamada “agenda do trabalho digno” faz com que quem não declarar um trabalhador doméstico à Segurança Social no prazo de seis meses incorre numa pena de prisão de até três anos ou multa de até 360 dias. Isso obriga ao pagamento de contribuições, mesmo que o trabalho seja de apenas algumas horas. Na altura, o Observador questionou o Ministério do Trabalho sobre a forma como o cumprimento das regras será fiscalizada pela ACT (Autoridade para as Condições do Trabalho).

Em declarações ao Observador, Miguel Fontes confirma agora que “a norma foi feita em termos gerais e, portanto, é universal”, aplicando-se ao serviço doméstico. Mas acrescenta que quando propôs a medida, no âmbito da agenda do trabalho digno, o Governo estava a pensar sobretudo em penalizar práticas recorrentes de exploração laboral, noutras atividades, “que se movem nas fronteiras entre a formalidade e a informalidade”, contra trabalhadores em situação de vulnerabilidade. Notícias recentes têm ilustrado situações desse género em atividades como a agricultura ou a construção civil, em muitos casos com recurso a trabalhadores imigrantes.

Das baixas médicas às compensações por despedimento e contratos temporários: as alterações ao Código do Trabalho a partir de abril

“Às vezes dizem-me que é muito forte falar da criminalização. Sim, é muito forte porque o que está em causa é muito grave. Temos de deixar claro que não é aceitável”, afirma Miguel Fontes.

A alteração legislativa, no entanto, acabou por ter efeitos também para o serviço doméstico e assim ficará. Ainda assim, perante o que diz ser um “alarme social” que se gerou à volta da questão, o mesmo responsável diz que o Governo decidiu “acelerar” a criação do grupo de trabalho, que já estava nos seus planos. Este grupo vai trabalhar sob orientação do próprio secretário de Estado do Trabalho, mas também do secretário de Estado da Segurança Social, Gabriel Bastos, e terá elementos da Direção-Geral da Segurança Social, que vai coordenador o grupo, do Instituto da Segurança Social, do Instituto de Informática, da ACT e da Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT).

O Negócios escreveu também que uma proposta do PCP aprovada no âmbito da “agenda” veio estabelecer que ao serviço doméstico aplicam-se as normas do Código do Trabalho em tudo o que não esteja previsto no regime doméstico: ou seja, passa a aplicar-se ao serviço doméstico o limite das 40 horas semanais, descanso noturno de pelo menos 11 horas ou o pagamento das compensações quando o contrato a termo cessa.

A agenda do trabalho digno foi aprovada no Parlamento, a 14 de fevereiro, com o voto favorável apenas do PS. PCP, Bloco e IL votaram contra e PSD, Chega, PAN e Livre abstiveram-se. Daí já saiu para a Presidência da República. Marcelo Rebelo de Sousa deve pronunciar-se, assim, proximamente sobre o dossiê, tendo 20 dias para promulgar ou vetar, podendo em oito dias, no entanto, suscitar ao Tribunal Constitucional a fiscalização preventiva. O Conselho Nacional das Confederações Patronais já escreveu ao Presidente alegando haver normas inconstitucionais no diploma que o Governo pretende que entre em vigor, na maior parte das normas, em abril.

Fiscalização limitada à denúncia

Atualmente, a fiscalização do trabalho doméstico faz-se, essencialmente, através de denúncias, do próprio trabalhador ou de terceiros, uma vez que a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) não pode entrar na casa das pessoas para fiscalizar. Miguel Fontes dá exemplos de casos que costumam chegar ao Ministério: quando uma entidade empregadora se compromete a pagar, todos os meses, a Segurança Social pela sua parte e pela do trabalhador mas, ao fim de alguns anos, o trabalhador se apercebe que isso não aconteceu. “É evidente que se estiver preto no branco nestes casos, em termos legais, essa pessoa tem muito melhores condições de se defender e de se proteger de uma situação destas de abuso”, declara.

Segundo o relatório de atividades da ACT de 2021, o mais recente, nesse ano houve 51 visitas inspetivas ligadas a “atividades das famílias empregadoras de pessoal doméstico e atividades de produção das famílias para uso próprio”, tendo sido apurados créditos de contribuições à Segurança Social na ordem dos 3.800 euros referentes a duas pessoas. Fiscalizações feitas em casos de trabalho declarado.

Há empregadores que, não declarando o serviço doméstico, contratam, no entanto, seguros de acidentes de trabalho não nominativos, ou seja, a pessoa segurada não é identificada. A ACT não fiscaliza estes seguros no sentido de perceber se os trabalhadores a quem se destinam estão ou não na economia informal.

Segundo o despacho do Governo, o grupo de trabalho poderá “promover a audição e participação de outras entidades ou personalidades cujo contributo seja considerado relevante para a prossecução dos trabalhos, designadamente especialistas, representantes de órgãos consultivos, de parceiros sociais e de associações da sociedade civil, bem como de outras entidades de revelo para o seu objeto e finalidades”. “O objetivo é aumentar a proteção social das pessoas e garantir que não estamos a criar uma geração que, no futuro, vai ficar com baixíssimos rendimentos apesar de ter tido uma vida de trabalho”, resume Miguel Fontes.

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