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PATRICIA AMARAL / OBSERVADOR

PATRICIA AMARAL / OBSERVADOR

Quer fazer um percurso iniciático pela Lisboa maçónica? Venha daí

Uma Igreja construída com uma orientação especial, templos maçónicos em que todos (sim, mesmo todos) podem entrar, um aperto de mão "especial": símbolos escondidos, bem à vista de todos, em Lisboa.

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O que têm Roma, Jerusalém e Lisboa em comum? Para além das sete colinas, partilham outra característica: o facto de serem consideradas cidades “sagradas”. E não apenas pelo lado religioso, mas sobretudo pelo seu lado esotérico e simbólico. Maçónico. Nas três podemos encontrar símbolos a cada esquina, “escondidos bem à vista de todos”. Em Lisboa, há quem garanta que a orientação e as proporções da reconstrução da Baixa Pombalina têm uma simbologia própria, ou seja, não são assim por “acaso”. Há locais considerados templos maçónicos e edifícios com detalhes decorativos que retratam objetos da maçonaria. Quer saber quais são? Venha daí.

Se costuma passar na rua do Carmo, talvez já tenha reparado num dos detalhes decorativos da Lisboa maçónica. É um dos símbolos mais visíveis e está em vários dos pilares dos atuais Armazéns do Chiado, antes Armazéns Grandella. Francisco de Almeida Grandella, o fundador, era maçon e pertencia à loja José Estevão, de Lisboa. No logotipo, a forma como o “A” está entrelaçado no “G” faz lembrar a disposição do compasso e do esquadro, dois dos instrumentos de trabalho dos mestres “maçons” (do francês, “pedreiro”) e que são porventura os símbolos mais conhecidos da maçonaria. O “G” ao centro tem, pelo menos, dois significados: de “guilda” (que significa sociedade de artesãos) e de “Grande Arquiteto do Universo”: os maçons acreditam que existe uma inteligência divina, responsável pela criação e que governa o funcionamento do Universo.

esquadro e compasso

Um dos detalhes decorativos do edifício dos Armazéns do Chiado, antes Armazéns Grandella. Créditos: Patrícia Amaral/Observador (à esquerda) e MesserWolan/Wikimedia Commons (à direita)

A simbologia espalhada por Lisboa, em especial pela zonas da Baixa e do Chiado, é tanta, que dá azo às mais variadas interpretações e teorias da conspiração baseadas nas lendas, alegorias e tradições da maçonaria e dos illuminati — cujas origens se perdem no tempo e, por vezes, também no significado.

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A empresa Escape Rossio organiza vários passeios e jogos interativos sobre a temática da história oculta dos Illuminati, da qual os fundadores são entusiastas. Apesar do nome do passeio, a maioria da simbologia abordada no percurso é mais associada à maçonaria do que propriamente aos Illuminati.

Curioso? Saiba que não é o único. Curiosos com vontade de saber o significado “oculto” da simbologia de Lisboa não faltam e são tantos que até já existem várias empresas a oferecer passeios que desvendam parte da simbologia da cidade e da sua história maçónica. O Observador fez o percurso turístico “Illuminati Tour em Lisboa – Segredos e Simbologia”, e no passeio descobrimos que existe uma igreja construída com uma orientação especial, templos maçónicos em que todos (sim, mesmo todos) podem entrar e um cumprimento “secreto” que parece um simples aperto de mão. Mas afinal porque é que existe tanta simbologia maçónica em Lisboa?

Os maçons e a reconstrução de Lisboa

Tal como Washington, palco do enredo do livro “O Símbolo Perdido”, do escritor norte-americano Dan Brown, também Lisboa tem vários símbolos, uns mais evidentes que outros, com significado maçónico. Muitos defendem que a maior “prova” de que Lisboa é uma cidade maçónica está no traçado da Baixa Pombalina.

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“O Símbolo Perdido” (The Lost Symbol, no original) é o quinto livro de ficção de Dan Brown. Nele, o autor aborda a maçonaria nos Estados Unidos, a sua simbologia oculta (em especial na capital, Washington D. C.) e os fundadores dos Estados Unidos envolvidos com a ordem iniciática, entre eles o próprio George Washington.

O grande ideólogo da reconstrução da cidade após o terramoto de 1775 foi o Marquês de Pombal, que segundo algumas teorias, terá sido iniciado na maçonaria em Londres. António José Vilela, autor do livro “Os Segredos da Maçonaria em Portugal”, disse ao Observador que “não existem provas cabais de que Sebastião José de Carvalho e Mello tenha sido maçon”. No romance “O Maçon de Viena”, José Braga Gonçalves defende que o secretário de Estado do Reino de D. José I foi o fundador de uma loja maçónica em Portugal com o nome de Fénix e teria sido iniciado na maçonaria em Viena (onde foi embaixador, depois de Londres). O que se sabe é que alguns dos arquitetos da reconstrução de Lisboa após o terramoto eram maçons. Entre eles, o engenheiro e arquiteto húngaro Carlos Mardel, que terá pertencido à loja maçónica Casa Real dos Pedreiros Livres da Lusitânia.

Planta da Baixa Pombalina de Eugénio dos Santos e Carlos Mardel

Planta da Baixa Pombalina de Eugénio dos Santos (1711-1760) e Carlos Mardel (1696-1763). Créditos: Wikimedia Commons

Um dos princípios da maçonaria defende que os maçons devem usar a sua posição na sociedade, seja ela qual for, para difundir os seus ideais — o aperfeiçoamento individual e a busca da perfeição, aliados aos princípios da liberdade, igualdade, fraternidade — pelo mundo profano, ou seja, entre os não-maçons. Na prática isto quer dizer que os maçons devem agir individualmente, mas propagar os ideais maçónicos na sociedade. Através de ações, mas também através do recurso a símbolos. Não é difícil de acreditar que os maçons envolvidos na reconstrução da capital tenham incluído no projeto alguma simbologia maçónica. Segundo a tese de Braga Gonçalves, o próprio traçado arquitetónico da baixa pombalina foi projetado com base na simbologia maçónica e as ruas da baixa terão sido desenhadas segundo a proporção áurea (com base no número de ouro — 1,61803398) de Euclides — a geometria euclidiana é uma das grandes inspirações da maçonaria.

A maçonaria e os illuminati

A maçonaria é considerada a maior e mais antiga organização fraternal do mundo, mas as suas origens históricas não são claras. Para alguns, a maçonaria começou com os mestres maçons (pedreiros), que ajudaram a erguer as igrejas e catedrais da Europa na Idade Média. Outros consideram que a maçonaria é bem mais antiga e terá começado no Antigo Egito. Há quem considere o Templo de Salomão como o berço da maçonaria e os primeiros maçons como descendentes dos Templários, a ordem militar e religiosa que se destacou na época das Cruzadas, também conhecida por “Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão”. Segundo esta teoria — não comprovada — os cavaleiros Templários teriam escolhido a Escócia como refúgio, onde foram acolhidos em fuga de França, após a Ordem ter sido proibida pela Igreja Católica.

A primeira grande loja da maçonaria moderna — a Grande Loja de Londres e Westminster — foi fundada em 1717, em Inglaterra. Em Portugal, a mais antiga obediência maçónica portuguesa — Grande Oriente Lusitano — foi fundada em 1802 e é a que tem mais membros ativos. Em 1991, surgiu a Grande Loja Regular de Portugal, que terá resultado de uma cisão no Grande Oriente Lusitano. Depois de vários movimentos de junção e agrupamento entre lojas, surgiu em 1996 a Grande Loja Legal de Portugal, a segunda obediência com mais membros no nosso país.

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Um dos primeiros folhetos dos Illuminati da Baviera, que terá sido impresso por volta de 1788 e onde são visíveis a coruja, o livro e a coroa de louro, alguns dos símbolos dos Illuminati. Créditos: Okänt/Wikimedia Commons

Illuminati significa literalmente, “iluminados”, e muitos grupos têm reclamado para si essa designação. Em termos históricos, o grupo mais conhecido a usar este nome são os illuminati da Baviera (sul da Alemanha), uma fraternidade fundada em 1776. Os illuminati da Baviera eram um grupo de auto-intitulados livres-pensadores, do ramo mais radical do Iluminismo. Para além de Adam Weishaupt (o fundador), esta fraternidade integrava também nobres alemães iniciados na maçonaria, que terão ajudado a “nova ordem” a desenvolver um rito semelhante ao maçónico.

Segundo algumas correntes, Adam Weishaupt terá também aderido à maçonaria e, num dado momento, os illuminati terão começado a recrutar novos membros dentro desta ordem iniciática. Algumas teorias referem que os illuminati seriam “escolhidos” de entre os maçons dos graus mais elevados para passarem a um estádio superior de aperfeiçoamento, no entanto, a dúvida sobre a existência de tal prática ou sequer de tal grupo perdurou no tempo. Um decreto de 1784 declarou os illuminati da Baviera como um grupo perigoso, o que terá significado o princípio fim da fraternidade bávara. No entanto, algumas teorias da conspiração referem que o grupo continuou a funcionar e especula-se que tal se deva a sua infiltração na maçonaria. Há mesmo quem defenda que os illuminati estiveram envolvidos em acontecimentos históricos como a Guerra da Independência dos Estados Unidos (1776), a Revolução Francesa (1789-1799) ou até a Revolução Russa de 1917.

Sobre o “recrutamento” de illuminati entre os membros da obediência de que faz parte, Henrique Monteiro, maçon do Grande Oriente Lusitano, disse ao Observador que desconhece tal prática e acredita mesmo que “não passa de uma fantasia”.

“Existem vários graus na maçonaria e muitos ritos, como o rito de York, o rito francês, o rito escocês antigo e aceite, entre outros. Os ritos têm graus, os principais são três, aprendiz, companheiro e mestre. E nesse percurso todo, não tenho conhecimento de illuminati nenhuns. Illuminati que dizer iluminados, e é uma forma banal de designar quem se inicia na maçonaria. Mas há muita gente que defende isso, é a teoria da conspiração. E que não se sabe se dentro dos illuminati não haveria uns ainda mais, mais, mais, os de Bilderberg. Mas acho que isso tudo é fantasia, não tenho a menor indicação ou mesmo suspeita de que isso exista”, explicou o ex-diretor do jornal Expresso.

Nos inúmeros documentos internos da maçonaria que consultou no âmbito da investigação para o livro que escreveu sobre a ordem iniciática, António José Vilela, confirmou ao Observador que o termo Illuminati não surge em nenhum deles. O que leva a crer que o termo não será utilizado na maçonaria portuguesa.

Simbolismo e teorias da conspiração

As inúmeras teorias da conspiração sobre estas fraternidades têm também a ver com um simbolismo que mistura as suas múltiplas influências e que atravessa várias épocas históricas. Muitas das teorias da conspiração acerca destas ordens iniciáticas têm muito a ver com o secretismo que as rodeia, desde os rituais dos diferentes ritos que regem a admissão aos três graus (aprendiz, companheiro e mestre) aos membros que fazem ou não parte da fraternidade. A maçonaria tem um caráter elitista (ao contrário da igreja que é proselitista, ou seja, tenta chamar a si o maior número possível de fiéis), os pretendentes a maçons devem pedir o acesso à fraternidade e só são aceites depois de serem avaliados.

Na prática, isto significa que o acesso à ordem iniciática não é para todos, algo que parece entrar em contradição com o ideal maçónico que visa o aperfeiçoamento do indivíduo e, através do desenvolvimento de cada um, o aperfeiçoamento da humanidade. Catarina Guerreiro, autora de “O Fim dos Segredos” sobre as sociedades secretas da maçonaria e Opus Dei, escreve que o segredo é crucial e os seus membros prometem não revelar o que se passa nas suas irmandades. O segredo que muitos obreiros (maçons) fazem da sua condição e das relações entre si, em especial no que toca a personalidades que ocupam lugares destaque na sociedade, é também terreno fértil para muitas teorias da conspiração.

A nível internacional, uma das mais conhecidas e também a mais difundida através da internet, tem a ver com a eventual existência de uma “Nova Ordem Mundial” (New World Order) que teria por objetivo a criação de um governo mundial totalitário. Segundo esta teoria, uma elite secreta — os illuminati — iria substituir os Estados-nação no governo do mundo. Alguns pastores evangélicos norte-americanos têm sido responsáveis pela disseminação desta ideia, com o argumento de que os illuminatti estão infiltrados não só na maçonaria, mas também em outras associações civis dos Estados Unidos e seriam uma sociedade secreta que vem atuando ao longo da história. O símbolo dessa ordem seria o “olho que tudo vê” e controla. Esse símbolo está presente nas notas de dólar e é conhecido por “olho da providência”, com a expressão latina annuit coeptis por cima, que significa “favorável ao nosso empreendimento”.

O mesmo símbolo também é utilizado pela maçonaria e significa que o “Grande Arquiteto do Universo” vê tudo o que é feito pelos maçons. Nos Estados Unidos da América, a maçonaria está envolta em menor secretismo do que noutros países (como Portugal) e o próprio George Washington, o primeiro presidente dos EUA, cujo busto figura na nota de dólar, foi assumidamente maçon.

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A simbologia do percurso iniciático pela baixa

Um dos locais de onde melhor podemos admirar o planeamento geométrico das ruas da baixa é do terraço no topo do Arco da Rua Augusta. Lá em cima temos vista privilegiada para a Praça do Comércio ou para o Terreiro do Paço. Há quem considere que a praça foi construída à semelhança de um templo maçónico, mas se para uns a entrada do “grande templo” é o cais das colunas, para outros, essa entrada é simbolizada pelos dois torreões dos ministérios. O simbolismo seria o de “entrar de barco no templo do conhecimento”.

Quem acredita que a maçonaria teve origem no Egito encontra muitos símbolos e influências do “Livro de Thoth”, nome dado a muitos textos do Antigo Egito que supostamente foram escritos por Thoth, o deus egípcio do conhecimento. Ninguém sabe se tal livro realmente existiu, mas acredita-se que os principais segredos da “ciência” da civilização egípcia constam do texto e que as 78 cartas do Tarô sejam um breve resumo do mesmo, em forma de cartões. É precisamente do simbolismo do Tarô que vem a explicação do número total de arcos do Terreiro do Paço: 78. Nos edifícios laterais contam-se 28 arcos de cada lado, num total de 56 arcos, que correspondem no simbolismo das cartas aos Arcanos Menores. À direita e à esquerda do Arco da Rua Augusta contam-se 22 arcos, que simbolizam os Arcanos Maiores.

Os 56 arcos representariam o mundo profano (não iniciado na maçonaria) e os 22 arcos frontais, entre as ruas do Ouro e da Prata, o mundo iniciático, para lá do conhecimento. Atravessar o arco da Rua Augusta, também chamado de Arco Triunfal, significaria a passagem das trevas (mundo profano) para a luz (mundo espiritual), que é concedida pela sabedoria. Em relação às proporções, diz-se que um templo maçónico “vai de Oriente a Ocidente, de Norte a Sul e do Nádir ao Zénith”, uma descrição simbólica que abrange “todo o Universo”. Voltando à ideia da praça como um templo a céu aberto, para o maçon Henrique Monteiro, “isso é impossível”. Porque que não existem requisitos “especiais” concretos (como os arquitetónicos) que definam um templo maçónico e qualquer lugar se pode tornar maçónico.

“Illuminati Tour em Lisboa – Segredos e Simbologia”

O encontro com os dois guias da Escape Rossio identificados pelas t-shirts foi marcado exatamente para debaixo da cúpula do Arco da Rua Augusta. A primeira etapa do passeio é subir até ao terraço e é a caminho do topo do arco que podemos tropeçar (mas não convém) no primeiro símbolo: do patamar do relógio para cima contam-se 78 degraus, tantos quantos os arcos que sustentam os edifícios do Terreiro do Paço.

Do terraço do arco somos convidados a olhar com outros olhos para o Terreiro do Paço e para os torreões dos ministérios, para as colunas do Cais das Colunas e para a estátua equestre de D. José I. João, um dos guias, pergunta se alguém conhece a razão pela qual estão representadas serpentes aos pés do cavalo do rei. Alguém responde que o cavalo pisa as cobras, o que significaria a vitória do rei sobre os inimigos “rasteiros”. No contexto da simbologia maçónica, o significado é outro, bem diferente. A serpente — que voltaremos a encontrar mais adiante no passeio, mas noutro enquadramento — simboliza a sabedoria e a cura. As serpentes na base da estátua guiam o cavalo e o rei com a sua sabedoria e representam o conhecimento.

Olhando para o outro lado, observam-se as três ruas que desaguam no Terreiro do Paço: a rua do Ouro, a rua da Prata e a rua Augusta. Estes nomes, juntos, adquirem outro significado, ligado à alquimia, outra das influências da ordem iniciática. O objetivo da alquimia é a transformação da matéria. Através da busca da Pedra Filosofal, seria possível transformar em ouro (que simboliza o Sol) outro metal menos nobre como a Prata (que simboliza a Lua). Mas não são as únicas ruas com nomes com sentido. A maçonaria terá tido origem nas sociedades de artesãos (“guildas”) da Idade Média e as principais ruas da esquadria da baixa estão organizadas por ofícios: para além da rua do Ouro (ourives / usurários / prestamistas) e da rua da Prata, existem também a rua dos Fanqueiros, a dos Retroseiros (a atual rua da Conceição), a dos Douradores, a dos Sapateiros, entre outras.

Romãs, alcachofras e folhas de acácia

Após a descida, voltamos ao local do encontro: o objetivo é olhar para cima e tentar identificar entre os pormenores decorativos da abóbada do arco, símbolos da maçonaria. E se à primeira vista, parecem apenas motivos naturais como flores, frutos e ramagens, com o olhar guiado pela explicação começamos a procurar no friso romãs, alcachofras e folhas de acácia. As romãs são um símbolo da fecundidade e da fertilidade pela quantidade de sementes e representam a unidade (a romã) na multiplicidade (muitos grãos). Os grãos em pequenos grupos e separados por uma fina película branca representam as diferentes lojas, parte de um todo que não apodrece, mas seca. Porque a romã não é uma fruta, mas uma infrutescência, a parte da planta que esconde as sementes.

A alcachofra tem uma simbologia ligada ao ritual da purificação pelo fogo. Ao queimar uma cabeça de alcachofra (hábito em muitas celebrações pagãs, onde se atiravam às fogueiras) em vez de carbonizar e se tornar negra, fica branca. O que remete para a ideia do renascimento após a morte e para o alcançar da pureza espiritual. A acácia (ou “mimosa”) é um arbusto perene que simboliza a imortalidade da alma e é também o símbolo da iniciação de uma nova vida (como maçon). As folhas de acácia representam também a inocência, a pureza, a segurança e a certeza. Embora seja um dos motivos mais repetitivos, na opinião de António José Vilela, a folha de acácia “talvez seja o símbolo maçónico mais desconhecido de todos”.

O pelicano, o caduceu e a igreja

Henrique Monteiro tem uma opinião diferente acerca de qual será símbolo menos conhecido da maçonaria. Para o maçon, o pelicano é um dos menos conhecidos até pelo que representa. O pelicano é uma ave que segundo uma superstição medieval alimentava as crias com a sua própria carne e sangue. O pelicano simboliza o sacrifício pelo outro e representa um dos mais elevados símbolos da maçonaria, pois só alguém num patamar quase divino de aperfeiçoamento individual se tornaria capaz de abdicar de algo necessário à sua própria sobrevivência, em favor de outros. Mais adiante no passeio voltamos a reencontrar outro animal, a serpente (ver fotogaleria acima).

O caduceu é um símbolo antigo e representa o bastão de Hermés (deus grego da sabedoria, mas também das ciências ocultas e esotéricas) que é muitas vezes confundido com o bastão de Esculápio ou Asclépio (símbolo da medicina e que só tem uma serpente enrolada e não duas). Na maçonaria o caduceu simboliza o equilíbrio entre as forças antagónicas do bem e do mal (as duas serpentes), mas também o número oito e a dualidade infinita penetrada pelo saber (o bastão).

Da Baixa é agora altura de começar a subir para o Chiado, mais precisamente para a Calçada do Sacramento. É aqui que vamos encontrar a igreja do Santíssimo Sacramento com uma orientação única na capital: o pórtico está voltado para oriente. Na maçonaria, este ponto cardeal simboliza a luz. Num templo maçónico, o Venerável Mestre tem assento a oriente e os candidatos aos três graus percorrem o caminho do ocidente em direção ao oriente e à luz. Embora alguns vejam na igreja simbologia templária e maçónica, reza a história da sua reedificação após o terramoto que foi a Irmandade do Sacramento que quis que mantivesse a orientação original, o que contrariava o plano de reconstrução da cidade de Eugénio dos Santos (um dos arquitetos de reconstrução da cidade e também reconhecido como maçon).

A fachada maçónica e o templo onde todos podem entrar

Subindo um pouco mais, chegamos ao Largo Rafael Bordalo Pinheiro e a uma das fachadas mais icónicas de Lisboa, repleta de simbologia. O edifício, também conhecido por “Casa do Ferreira das Tabuletas” (alcunha do pintor Luís Ferreira, autor das imagens) foi mandado construir pelo maçon Manuel Moreira Garcia, dono da Cervejaria Trindade. Nos azulejos da fachada estão as figuras da Terra, Água, Comércio, Indústria, Ciência e Agricultura, figuras alegóricas ligadas aos ideais maçónicos (ver fotogaleria acima).

Para além da fachada do seu palacete, Manuel Moreira Garcia também mandou revestir de azulejos com simbologia maçónica, a cervejaria de que era dono. A Cervejaria Trindade, pela forma como os azulejos estão posicionados e pela simbologia dos seus motivos, é considerada por muitos um “verdadeiro templo maçónico”, onde atualmente, “todos aqueles que querem comer um bife podem entrar”.

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Detalhes dos painéis de azulejos da Cervejaria Trindade com o sol e o “olho que tudo vê”. Créditos: Patrícia Amaral/Observador

Entre os muitos símbolos maçónicos destacam-se o sol que representa luz (na alquimia representada pelo ouro) e o triângulo com o “olho que tudo vê”, uma lembrança constante aos obreiros (maçons) que o Grande Arquiteto do Universo está sempre a observar as suas “obras” (ações). Há também quem acredite que alguns dos rituais da maçonaria têm origem no culto pagão à estrela Sol, elemento também representado nos aventais de alguns ritos. O sol significa também a luz da iniciação e o símbolo do Oriente.

Um aperto de mão especial

O passeio segue o caminho passando pelo Largo do Carmo e desce em direção à Praça do Rossio. Estamos perto do fim do percurso iniciático por Lisboa e preparados para conhecer o cumprimento maçónico, que não é tão desconhecido assim. Afinal, está bem à vista, na esquina da rua do Amparo com a rua Dom Antão de Almada (como quem vai do Rossio para a Praça da Figueira). Olha-se para cima e o que se vê parece um banal aperto de mão, mas não é (ver fotogaleria acima).

As mãos entrelaçadas deixam os polegares soltos, que no cumprimento entre maçons dá três toques nas costas da mão de quem se cumprimenta. Este aperto de mão é conhecido como “Boaz” ou “aperto do aprendiz” e só pode ser usado depois de o iniciado ter sido cumprimentado desta forma, ou seja, depois de determinado conhecimento ter sido transmitido. Este é um dos vários “sinais secretos” da maçonaria e é desta forma que somos cumprimentados pelos guias, um a um. O roteiro da Lisboa maçónica terminou. A despedida? Foi feita com o aperto de mão do aprendiz, com o qual tínhamos acabado se ser considerados “iniciados”.

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