Do Palácio da Alvorada para o Palácio do Planalto. Do Palácio do Planalto para o Palácio da Alvorada. Estas foram as únicas deslocações de Jair Bolsonaro das últimas horas, mantendo-se pelo sempre em silêncio sobre o resultado da segunda volta das eleições presidenciais, que perdeu para Lula da Silva, e sobre o seu futuro político. Reunido com ministros, assessores e aliados, o ainda Presidente brasileiro terá delineado uma estratégia para reagir à derrota deste domingo. Apesar de as sondagens dos últimos dias terem apontado para este cenário, ainda que com uma distância percentual maior, quase nenhum apoiante acreditava nessa possibilidade.
E, mais de 24 horas depois, não se sabe o que de facto pensa Bolsonaro. Neste silêncio ensurdecedor, em que as descrições que chegam falam de um homem quieto e abatido, que hesitará em conceder aos resultados nas urnas (1,8 pontos percentuais de diferença, 50,9% v s 49,1%), surgem muitas teorias, incluindo a possibilidade de poder sair do Brasil para evitar problemas com a Justiça ou ser ele a entregar a faixa a Lula. Mulher e filho já falaram, alguns aliados também, chegou a noticiar-se uma comunicação do ainda Presidente para o fim da tarde desta segunda-feira, mas nunca de forma oficial. Jair continua a gerir o seu tempo antes de conceder.
19h45
A oficialização
da derrota
para Lula
(22h45 em Lisboa)
A ficha terá caído a Jair Bolsonaro quando o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes, lhe ligou a comunicar que “ia oficialmente proclamar o resultado” que dava a vitória a Lula da Silva. “Dei os parabéns pela participação nas eleições”, sinalizou o responsável jurídico, acrescentando que o ainda chefe de Estado brasileiro atendeu a chamada “com extrema educação”, tendo até deixado uma palavra de agradecimento.
Os apoiantes de Bolsonaro, reunidos no Rio de Janeiro, choravam o falhanço da reeleição. Em Brasília, a mesma coisa. Do Palácio da Alvorada surgiam informações contraditórias sobre se o candidato derrotado ia discursar ou não ainda na noite domingo ou já de madrugada. No final, os assessores acabaram por confirmar que o ainda Presidente não ia reagir aos resultados eleitorais naquela noite, pedindo aos simpatizantes para abandonarem os locais nos quais tinham ‘torcido’ e rezado pela vitória do atual chefe de Estado.
Desde aí, toda a campanha tentou manter o silêncio. Do quartel-general, os jornalistas apenas conseguiram visualizar que um dos cinco filhos de Jair Bolsonaro, Eduardo Bolsonaro, o foi visitar após os resultados serem conhecidos. De resto, o Presidente recusou falar com todos os seus ministros no domingo à noite, mesmo alguns dos que se deslocaram inclusive ao Palácio da Alvorada.
22h06 O desligar
de luzes
no Palácio da Alvorada
(01h06 em Lisboa)
Jair Bolsonaro mandou desligar as luzes do Palácio da Alvorada e terá ido dormir. Entretanto, o seu vice-presidente, Braga Netto, multiplicava-se em contactos. Embora a principal cara do bolsonarismo tivesse sido derrotada, alguns candidatos apoiados pelo Presidente venceram eleições.
Por exemplo, Tarcísio de Freitas foi eleito governador de São Paulo (o maior colégio eleitoral do país, onde Bolsonaro venceu com 55,24% dos votos) derrotando o antigo adversário de Bolsonaro, Fernando Haddad. Com 55,27% dos votos, Tarcísio — contrariando as indicações de algumas fações da campanha — tinha dito logo domingo, contudo, que irá colaborar com Lula da Silva.
07h40 O filho Flávio,
a primeira visita
a Bolsonaro
(10h40 em Lisboa)
Não se sabe a que horas é que Jair Bolsonaro acordou, mas é público que o seu dia começou cedo. Às 07h40, o seu filho Flávio Bolsonaro visitou-o no Palácio da Alvorada. Soube-se que coronel Mauro Cid, o seu ajudante, também se reuniu com o ainda Presidente.
09h30As reuniões
já noutro palácio,
o do Planalto
(12h30 em Lisboa)
Por volta das 9h30, o ainda (cessa funções a 1 de janeiro) Presidente brasileiro sai do Palácio da Alvorada e desloca-se para o do Planalto, onde se se reuniu com vários ministros. Permaneceu contudo publicamente em silêncio: “O Presidente do Partido Liberal vai manifestar-se quando considerar oportuno”, informou a assessoria de Jair Bolsonaro.
Embora tentando manter o silêncio, começam a surgir a público informações que davam conta do estado de ânimo de Jair Bolsonaro. De acordo com a Globo, o Bolsonaro estava abatido e dececionado com a derrota eleitoral, não escondendo a indignação aos seus aliados. “Está triste”, “a falar pouco” e passa longos períodos de tempo “calado”.
Com um Presidente desorientado e em baixo, os aliados tentavam chamá-lo a razão. A CNN Brasil foi a primeira avançar que alguns ministros tentavam convencer Jair Bolsonaro a reconhecer a derrota e sugeriam que o vice-presidente candidato Braga Netto devia assumir o cargo de coordenador de transição, pela sua experiência governativa e por conhecer bem os meandros do governo bolsonarista.
Os meios de comunicação brasileiros avançavam então que um discurso durante esta segunda-feira era uma hipótese cada vez mais provável, muito por conta desta pressão dos aliados. Para persuadir Jair Bolsonaro, os seus apoiantes argumentavam, segundo a G1, que o Presidente tinha de agir o mais cedo possível — e “em duas frentes”.
Em primeiro lugar, Jair Bolsonaro precisava de ter em consideração os processos judiciais em que ele próprio e os filhos estão envolvidos, tais como o da gestão da pandemia ou os relacionados com fake news. O Presidente “precisa de cuidar pessoalmente” destes assuntos, destacavam os seus aliados, assinalando que a “partir do ano que vem Bolsonaro não terá mais imunidade”.
Para além disso, os aliados terão vincado junto do ainda atual Presidente que não se podia esquecer que “o seu grupo político, mesmo derrotado, saiu com força das eleições deste ano, conquistando o principal estado do país, São Paulo”. A diferença face a Lula da Silva — de cerca de dois milhões de votos e de 1,8 pontos percentuais — fazem com que Jair Bolsonaro “saia em grande”, apesar da derrota.
Os seus apoiantes esperam que o atual Presidente agradeça também aos mais de 58 milhões de eleitores que votaram nele. O objetivo é não perder o capital político ganho nestas eleições e evitar que isso crie divisões dentro do partido. Além disso, os aliados não descartam que Jair Bolsonaro se candidate em 2026, mas para isso precisa de reconhecer a derrota o mais cedo possível, de modo a minimizar os danos políticos.
Há ainda um cenário que terá sido discutido pelos aliados de Bolsonaro. De acordo com os meios de comunicação social brasileiros, o próprio Presidente terá proposto um plano para sair do país perto do final do ano. Deste modo, evitaria (além de possíveis problemas com a Justiça) ser ele a entregar a faixa presidencial a Lula da Silva, passando essa responsabilidade para o atual vice-presidente, o general Hamilton Mourão. É, no entanto, apenas uma possibilidade, de que nem sequer alguns membros da cúpula do governo foram informados.
14h00 O não das Forças Armadas
e a publicação da mulher
no Instagram
(17h00 em Lisboa)
Com as horas a avançar, os planos para um eventual contestação dos resultados pareciam começar a esvaziar-se. Não só pelas declarações dos aliados, mas também pelas Forças Armadas brasileiras, que recusaram participar num qualquer eventual golpe de Estado. Segundo a Globo, as altas patentes garantiram que iam cumprir a Constituição, apesar de manifestarem algumas preocupações com o mandato de Lula da Silva. “O clima é de absoluta normalidade. Vida que segue.”
Ao longo da tarde, começavam a surgir as primeiras reações à derrota no núcleo duro de Bolsonaro. A mulher, Michelle, publicou duas stories, por volta das 14h30, na sua conta pessoal do Instagram, em que parecia reconhecer os resultados eleitorais. Inicialmente, revelou um salmo. “Louvai ao senhor todas as nações, louvai todos os povos. Porque a sua benignidade é grande para connosco e a verdade do Senhor dura para sempre. Louvai ao Senhor”, lia-se.
Depois, em reação também ao facto de ter deixado de seguir o marido no Instagram, Michelle Bolsonaro garantiu que “ela e o esposo” seguem “firmes, unidos, crendo em Deus e crendo no melhor para o Brasil”. “Estaremos sempre juntos, amando-nos na alegria e na tristeza”, afirmou, acrescentando: “Que Deus abençoe a nossa amada nação”.
15h49 O anúncio do filho:
Flávio Bolsonaro pede
para se “erguer a cabeça”
(18h49 em Lisboa)
Mais tarde, foi a vez de Flávio Bolsonaro pronunciar-se sobre os resultados. No Twitter, o filho do atual Presidente agradeceu “a cada um que ajudou a resgatar o patriotismo, que orou, rezou, foi para as ruas, deu o seu suor pelo país que está dando certo e deu a Bolsonaro a maior votação de sua vida”. Apelando para que se “erga a cabeça”, o também senador destacou que não vai “desistir do nosso Brasil”. Escreveu: “Deus no comando.”
Obrigado a cada um que nos ajudou a resgatar o patriotismo, que orou, rezou, foi para as ruas, deu seu suor pelo país que está dando certo e deu a Bolsonaro a maior votação de sua vida! Vamos erguer a cabeça e não vamos desistir do nosso Brasil! Deus no comando!
— Flavio Bolsonaro (@FlavioBolsonaro) October 31, 2022
15h55De volta
para casa,
o Palácio da Alvorada
(18h55 em Lisboa)
Depois de várias reuniões, Jair Bolsonaro voltou ao Palácio da Alvorada. Entretanto, várias vozes iam dando conta de que o chefe de Estado falaria de facto ao país ainda esta segunda-feira. Uma delas foi Cláudio Cajado, o presidente dos Progressistas (PP) — um dos parceiros de coligação de Bolsonaro —, que garantiu que haveria um discurso durante o dia.
Os meios de comunicação social brasileiros noticiavam que, no discurso, Jair Bolsonaro não iria contestar os resultados eleitorais, mas deixaria, no entanto, várias críticas à condução do processo eleitoral pelas instituições eleitorais. Fora de questão estaria também a felicitação pela vitória de Lula da Silva (a quem ainda não terá telefonado).
20h00 Quando será o discurso
e com que tom
falará Bolsonaro?
(23h00 em Lisboa)
Mais de 24h depois de ser oficializada a derrota eleitoral, o ainda Presidente continuava sem se pronunciar, nem se sabe quando o fará. A CNN Brasil apontou a comunicação ao país para terça, dia 1, mas mais uma vez sem confirmação oficial. O silêncio, cada vez mais pesado, continua a imperar, apesar de o muro imposto começar a cair com as declarações do filho e da mulher. Agora, só falta saber com que tom Jair Bolsonaro quebrará o seu silêncio ensurdecedor.