A carga fiscal voltou a ser tema de aceso debate entre a direita e o Governo no Parlamento. A líder do CDS-PP usou os números dados a conhecer pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) para afirmar que a carga fiscal aumentou em 2017, tanto em valor absoluto como em percentagem do PIB. Primeiro, António Costa discordou dos números; depois deu a sua justificação para os resultados, antes de acabar com uma afirmação taxativa: a carga fiscal tem vindo a diminuir desde 2015. Tem razão?

O que está em causa

O indicador da carga fiscal tem sido usado como arma de arremesso político há vários anos. No início desta legislatura, o Governo usou este indicador para demonstrar que os impostos estavam a descer, mesmo quando aumentava de forma extraordinária (mas que perdura) o imposto sobre os produtos petrolíferos.

A oposição à direita tem aproveitado todas as oportunidades para usar estes números contra o Governo, mesmo com as descidas decretadas em impostos como o IVA para a restauração, a eliminação gradual da sobretaxa de IRS e, este ano, a descida mais profunda de IRS, com a criação de novos escalões.

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O indicador da carga fiscal tem sido usado de várias formas. No fundo, este consiste apenas na soma das receitas de impostos (diretos + indiretos) e das contribuições para a Segurança Social (que incluem as partes suportadas pelos trabalhadores e pelas empresas). O valor total é depois ponderado em função do PIB. No entanto, há critérios para todos os gostos e, dependendo do partido ou da altura do ano, também há quem tenha usado apenas a receita de impostos, sem contar com as contribuições para a Segurança Social, para construir argumentos.

No debate desta quinta-feira, a líder do CDS-PP usou os números do INE para afirmar que a carga fiscal aumentou em 2017, mesmo sem contar com as contribuições para Segurança Social. Um aumento registado tanto em valor nominal como em percentagem do PIB, defendeu Cristas.

“A carga fiscal sobe em valores absolutos e sobe em percentagem do PIB. Sobe através de impostos indiretos. Há uma austeridade escondida”, afirmou.

António Costa respondeu dizendo que a deputada estava a fazer confusão e que a carga fiscal tem diminuido desde 2015.

“A senhora deputada confunde as coisas. Se tiver aliás em conta o aumento das receitas sem contribuições para a SS verificará que a carga fiscal diminui continuadamente desde 2015 até agora. A diferença do aumento da receita explica-se essencialmente com algo positivo chamado criação de emprego”, afirmou.

Os factos

Os números do Instituto Nacional de Estatística (INE) dizem que a coleta de impostos e de contribuições para a Segurança Social aumentou de facto em 2017, e aumentou a um ritmo superior ao do Produto Interno Bruto, mesmo com o PIB a crescer mais que o esperado.

Segundo os números dados a conhecer na semana passada pelo INE, o fisco arrecadou mais 2,3 mil milhões de euros em impostos durante o ano de 2017, do que havia feito em 2016. Se considerássemos apenas a receita de impostos para o cálculo da carga fiscal, isto significaria que esta teria aumentado de 25% do PIB para 25,2% do PIB em 2017.

Se forem contabilizadas também as contribuições feitas para a Segurança Social, que aumentaram 3,4 mil milhões de euros de 2016 para 2017, então o total da carga fiscal registaria um aumento de 36,6% do PIB para 37% do PIB, mais três décimas.

Conclusão

Quando António Costa diz que a carga fiscal tem vindo a diminuir continuadamente desde 2015 está errado. O indicador revela uma subida, como os números do INE o demonstram e o próprio Governo já o admitia no relatório do Orçamento do Estado para 2018.

O primeiro-ministro tentou dar a mesma justificação que Mário Centeno havia dado aos deputados na terça-feira durante uma audição parlamentar: o valor da coleta de impostos e contribuições subiu no ano passado devido à criação de emprego e não devido a aumentos de impostos. Com mais emprego, como os números demonstram que aconteceu, há mais pessoas a pagar contribuições para a Segurança Social (e empresas), mais pessoas a pagar IRS e mais dinheiro no bolso das famílias para fazer gastos, o que resulta em mais impostos indiretos para o Estado, como é o caso do IVA ou do imposto aplicado sobre os combustíveis.

António Costa terá sido menos hábil que o seu ministro das Finanças — que não disse que a carga fiscal não aumentou, mas sim que o esforço fiscal exigido a cada português não aumentou — a defender que este aumento de receitas não deriva de aumentos de impostos, mas sim de uma coisa boa, o maior crescimento da economia.

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