Acreditar em qualquer coisa pode assustar. Faz pensar que não existe hipótese de as coisas serem de outra maneira. Não há porém razão para medos. Posso acreditar que há manteiga no frigorífico, e, ao verificar que me enganei, admitir que me enganei. Claro que, dirão alguns, acreditar que há manteiga no frigorífico é uma coisa, e acreditar em coisas que se escrevem com maiúscula parece ser outra. As maiúsculas parecem requerer convicções mais intensas; acreditar que há Manteiga parece precisar de maior esforço.
Por precaução essas pessoas recorrem a um procedimento que lhes parece razoável; imaginam que têm na cabeça uma espécie de regulador de crenças que permite que, a respeito seja do que for (manteigas ou Manteigas), se possa acreditar mais ou menos. Quando rodam o regulador todo para a direita passam a acreditar sem margem para dúvidas que têm manteiga no frigorífico; e quando põem o regulador mais ou menos a meio acreditam mais ou menos que a Manteiga existe. Esta última atitude é prontamente identificada como uma forma de agnosticismo; mas, como todas as formas de cepticismo, depende da crença em reguladores de crenças.
A crença em reguladores de crenças tenta-nos a arrumar as nossas crenças por ordem: aquilo em que acredito completamente, aquilo em que acredito bastante, aquilo em que não acredito lá muito, e por aí abaixo. Dá assim origem a uma ideia comum, que consiste em tratar as várias coisas em que acredito de modos diferentes. No entanto o único efeito que produz é a ilusão moral de que certas crenças que tenho são menos minhas que outras crenças que também tenho.
O cepticismo deriva do medo de eu poder estar enganado nas minhas crenças actuais; e encoraja modos de superstição, como a relutância em dizer que não acredito naquilo em que realmente não acredito. Só é um problema teológico para aqueles que acham que semi-acreditam na Manteiga; mas revela em todas as suas formas limitações intelectuais sérias. O agnóstico, por exemplo, acha que há Manteiga, mas também acha que pode não haver, e por isso acha mais ou menos que pode haver; mas também acha que se não houver não fará grande diferença.
Estas subtilezas adiantam pouco na hora das torradas. Se não faz diferença, não acho; e se acho uma coisa, não acho menos do que acho qualquer outra coisa em que acredito; nem acho de outro modo, mas do único modo como sei achar. A única diferença está naquilo que teria de acontecer para deixar de achar: nuns casos basta abrir o frigorífico; noutros, não há nada que eu possa ver. Em matéria de crenças acreditamos naquilo em que nos faz diferença acreditar, e em que por isso temos razões para acreditar; e agimos normalmente em conformidade. Não é razoável imaginar que temos reguladores de crenças na cabeça; não conseguimos acreditar mais ou menos.